Imagem ilustrativa da imagem FOLHA CONFERE| Mensagem sobre hidroxicloroquina volta a circular por redes sociais
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Uma mensagem antiga falando sobre a hidroxicloroquina e a cloroquina, que chegou a circular em março e abril deste ano, voltou a circular nas redes sociais de londrinenses. A mensagem diz: “Notícia saída agora do forno. Jornalista Elisa Robson escreveu: O FDA, a agência americana de regulamentação de remédios, aprovou o uso de hidroxicloroquina em todos os pacientes com a Covid-19. O CEO da Novartis anunciou que já tem em mãos os resultados de pesquisas que comprovam que a hidroxicloroquina mata o vírus. Tanto que a empresa vai doar 130 milhões de doses. O custo médio do medicamento no mundo é de US$ 4,65 por mês. Ou seja, tudo indica que a solução vai chegar bem antes do que muita gente gostaria. Talvez seja, inclusive, decisiva para reverter o cenário apocalíptico previsto para as próximas semanas e mudar o curso deste rio. Pois por trás disso, para os que querem continuar lucrando, e enfatizo o politicamente, com o pânico e o desespero, o pensamento que predomina é: ‘A cura não pode chegar tão rapidamente assim!’ Mas, se Deus quiser, já chegou. DIVULGUE AGORA.”

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Para dar mais credibilidade à mensagem, ela é acompanhada por dois links, ambos do laboratório Novartis, falando sobre a doação do medicamento e também sobre a possibilidade do medicamento ter o poder de matar o vírus.

O Gerente Técnico-Científico do CRF-PR (Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná), Jackson Rapkiewicz, afirmou que o risco do compartilhamento dessa mensagem agora é que ela dá a impressão de que há novas evidências de que a eficácia que foi comprovada e que não há dúvidas sobre a utilização dele, mas isso não é real. “A mensagem é antiga, de março e começo de abril. É de quando a FDA, dos EUA, autorizou o uso desses medicamentos de forma emergencial para certos pacientes que estavam internados. Essa aprovação emergencial não é a mesma coisa que a aprovação no rito normal”, destacou.

“Isso ocorreu porque em vez de começar os estudos de uma substância do zero optou-se por testar medicamentos que já existiam, já que um novo medicamento exigiria um tempo mais longo até chegar ao mercado. Foram feitos testes in vitro, em laboratório, e tinha expectativa de ser solução para o problema, mas foram feitos estudos e a animação e a boa expectativa que havia no começo se dissipou com uma investigação mais profunda. Depois desse estudo, constatou-se que a medicação não é efetiva contra a Covid-19.”

Rapkiewicz explicou que o NIH (Instituto Nacional de Saúde Norte-Americano), que havia indicado o uso da cloroquina e hidroxicloroquina nos EUA, revisou sua decisão e agora é contra o uso. “Ele não recomenda mais. A SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) concorda e também é contra o uso”, destacou.

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EFEITOS COLATERAIS RELATADOS

Segundo comunicado da SBI, “Até o momento, os principais estudos clínicos, que são os randomizados com grupo controle, não demonstraram benefício do uso da cloroquina, nem da hidroxicloroquina no tratamento de pacientes hospitalizados com Covid-19 grave. Efeitos colaterais foram relatados. Seu uso em profilaxia pós-exposição, até o momento, também não demonstrou benefício.”

O comunicado da SBI diz também que “Seu uso no tratamento da Covid-19 nos primeiros dias de doença, em casos de Covid-19 leve e moderada, está sendo avaliado e se aguardam os resultados.” Como o resultados dos testes na fase inicial da doença ainda não estão consolidados, o compartilhamento da mensagem do início da matéria pode dar a entender que o medicamento é a solução para o novo coronavírus e isso configura um risco para a saúde dos usuários do medicamento. “Isso pode levar as pessoas a se automedicarem ou pressionar profissionais de saúde a prescrever o medicamento, mas não existe essa evidência de eficiência do medicamento”, destacou Rapkiewicz. Segundo ele, a ingestão desse medicamento pode gerar riscos para a saúde, já que ele pode provocar reações adversas significativas. “Essas reações podem atingir principalmente o coração, pois a cloroquina e a hidroxicloroquina pode provocar arritmias cardíacas. Além disso pode gerar problemas na pele e ter reações no fígado. Trata-se de um medicamento que precisa de supervisão de uso”, orientou.

De acordo com a SBI, um dos trabalhos demonstrou que não houve redução na duração dos sintomas ou de hospitalização e mortalidade nem mesmo com os pacientes que receberam o medicamento no primeiro dia após o aparecimento dos sintomas. A entidade aponta também que 43% dos tratados com hidroxicloroquina apresentaram efeitos colaterais, principalmente gastrointestinais, como dor abdominal, diarreia e vômitos. A SBI decidiu acompanhar a orientação "que está sendo dada por todas sociedades médicas científicas dos países desenvolvidos e pela OMS (Organização Mundial de Saúde) de que a hidroxicloroquina deve ser abandonada em qualquer fase do tratamento da Covid-19."

Rapkiewicz ressaltou que o farmacêutico deve seguir o seu código de ética e tem que conversar com o paciente de que existem riscos de reações adversas. “O Conselho Federal de Farmácia aponta que o farmacêutico não é um mero entregador de caixinhas e exige dois documentos diferentes nesses casos. O primeiro é que o farmacêutico concorda em dispensar o medicamento para uso fora do recomendado pela bula e o paciente tem que assinar que concorda. O farmacêutico tem que manter uma cópia na farmácia. O outro documento é emitido se o farmacêutico verificar que existe risco e não existe concordância para a dispensação do medicamento, porque existe risco para a segurança do paciente. Ele pode se recusar a entregar a dispensação do medicamento e colocar os motivos no documento e na prescrição médica.”

PROTOCOLO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE

No dia 20 de maio o Ministério da Saúde divulgou um novo protocolo para o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina, associadas ao antibiótico azitromicina, no tratamento da infecção causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2). A orientação amplia o uso dos medicamentos também para os casos mais leves e até mesmo moderados da Covid-19 no SUS (Sistema Único de Saúde), sem necessidade de internação.

O presidente Bolsonaro tem citado recentemente o uso do medicamento off label (sem bula), ou seja, um medicamento já existente no mercado é usado de forma diferente da finalidade em que foi aprovado pela Anvisa ou outros órgãos regulatórios.

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A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), por meio da Gerência de Medicamentos Novos, Pesquisa e Ensaios Clínicos, explicou que o uso off label de um medicamento é feito por conta e risco do médico que o prescreve, e pode eventualmente vir a caracterizar um erro médico, mas em grande parte das vezes trata-se de uso essencialmente correto, apenas ainda não aprovado. A agência reforça que o uso off label é, por definição, não autorizado por uma agência reguladora, mas isso não implica que seja incorreto. A decisão é do médico com a anuência do paciente.

A AMB (Associação Médica Brasileira) publicou uma nota em que declara que, até o momento, não existem estudos seguros, robustos e definitivos sobre a questão. O texto diz que mesmo nos mais recentes estudos, especialmente os da última semana, há várias fragilidades que impedem que sejam considerados conclusivos. A entidade defende a preservação da autonomia do médico. “É importante lembrar que o uso off label de medicamentos é consagrado na medicina, desde que haja clara concordância do paciente. E que, sem a prática do off label, diversas doenças ainda estariam sem tratamento. Não se trata de apologia a este ou àquele fármaco. Trata-se de respeito aos padrões éticos e científicos construídos ao longo dos séculos.”

A reportagem da Folha recomenda que todas as vezes que alguém receber uma mensagem, que consulte se a informação já foi atualizada em sites confiáveis. No caso da mensagem sobre a cloroquina e hidroxicloroquina houve mudanças no entendimento em poucos meses.

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