O cenário é bucólico. A depender do ângulo que se olha, é possível observar o vinhedo e, por detrás, a colina repleta de vegetação. Nas vinhas, as uvas crescem naturalmente, sem qualquer tipo de defensivo. Assim, em meio à modernidade, ainda é possível sentir-se no passado. O casebre de pedra, sede da vinícola, data de 1706 e transporta o visitante imediatamente à História: um documento cartográfico do Arquivo do Estado de Veneza inclui o edifício no “Cadastro de Terras Napoleónicas” de Veneza com o título de “Árvore plantada com vinhas no morro”.

Em visita recente e rápida pela Itália, fiz questão de visitar ao menos uma vinícola: escolhemos a Meroni, uma propriedade familiar, que fica distante cerca de 18 km de Verona, localizada no município de Sant’Ambrogio di Valpolicella. Aliás, desde que fui iniciado no mundo do vinho ouço falar dessa região produtora de vinhos, cujo nome remonta ao Império Romano: a área era considerada o “reservatório” do império. Do latim “Vallis polis cellae”, cujo significado é o vale com muitas caves. A região é reduto do nascimento do Recioto del Valpolicella e do mais nobre Amarone, um vinho já conhecido em todo o mundo pela sua técnica de produção e longevidade.

Na fazenda Meroni, Davide nos conduziu numa visita quase que privada: estávamos apenas eu, minha tia e minha prima. Conhecemos os vinhedos e visitamos as cubas de inox, onde as uvas são levadas à fermentação natural e descansam até sua maturação. E, claro, fizemos uma degustação. Um detalhe que nos chamou a atenção é que, dos 15 hectares de propriedade, 11 são dedicados aos vinhedos, um hectare e meio à plantação de olivas e o restante é mantido com vegetação para que se mantenha um equilíbrio do clima. Além disso, a proximidade com o Lago de Garda também ajuda a manter as temperaturas atenuadas no verão ou no inverno. E tudo isso produz um solo calcário-argiloso produzindo uvas ricas e estruturadas.

As uvas, aliás, são todas autóctones: Corvina Veronese, Corvinone, Rondinella e Molinara, utilizadas na produção de duas linhas de vinhos, “Sengia” e “Il Velluto”, dentro da produção de Recioto e Amarone. Outro detalhe é que a vinícola utiliza uma técnica antiga chamada de apassimento, que consiste na desidratação parcial das uvas antes de serem levadas à prensagem. É um processo natural de secagem através do qual, após a colheita, os cachos são colocados em espécies de cama feitas de bambu, onde permanecem de 30 a 100 dias, dependendo do tipo do vinho. Nesse tempo, os líquidos evaporam a ponto de perderem até 40% da umidade.

O objetivo é concentrar os açúcares e produzir bebidas com aromas e sabores intensos e alto teor de álcool. E isso realmente é verdade. Entre os rótulos que degustamos, pudemos, de fato, sentir o grau alcoólico: Valpolicella Classico, Velutto Superiore, Velutto Amarone e Carlo Meroni, esse último em homenagem ao fundador da vinícola, avô dos atuais proprietários. Ao final, o consumidor pode experimentar vinhos com requinte, elegância e grande equilíbrio.

Infelizmente, esses rótulos não são comercializados no Brasil. Como muitos vinhos italianos, de vinícolas familiares que produzem quantidades limitadas e, muitas vezes, bastante exclusivas. Dali, passamos em frente a uma das mais famosas e conhecidas vinícolas da região, a Bolla, cujos vinhos podem ser facilmente encontrados nas prateleiras dos supermercados brasileiros. No entanto, ela estava fechada, apesar de ser um sábado. É que, no verão, muitas empresas dão férias aos seus funcionários para que aproveitem a estação europeia. Teremos que voltar, obviamente. Se um dia for à Itália, não deixe de visitar uma vinícola.

Na fazenda Meroni, Fábio Luporini fez degustação de vinho
Na fazenda Meroni, Fábio Luporini fez degustação de vinho | Foto: Divulgação