Afeto, criatividade, flexibilidade, gentileza, irreverência, senso de comunhão e simplicidade são valores típicos da identidade cultural brasileira. Ou seja, parte do nosso jeitão de ser e, por isso mesmo, também presentes em boa parte das empresas daqui. O problema é que nem sempre de forma positiva.



A afetividade, por exemplo, ajuda a fortalecer os laços interpessoais nos escritórios e fábricas, criando um clima colaborativo e acolhedor. No entanto, também pode prejudicar a imparcialidade na hora de tomar decisões e estimular o favoritismo se não houver limites claros entre o pessoal e o profissional.



A criatividade impulsiona a inovação e o pensamento disruptivo, fomentando ideias originais e soluções “fora da caixa” para os desafios que a empresa enfrenta. Em contrapartida, a falta de um mínimo de estrutura e planejamento pode resultar em uma execução caótica e desconectada da estratégia.



Se a flexibilidade facilita a rápida adaptação a diferentes contextos de mercado e a pronta resposta a mudanças repentinas, também é verdade que a ausência de processos maduros costuma prejudicar a eficiência operacional e a consistência nos resultados.



Gentileza e hospitalidade promovem um ambiente de trabalho caloroso e amigável sim. Contudo, esses mesmos valores podem manter na penumbra conflitos que impedem a abordagem direta de questões delicadas, prejudicando a resolução dos problemas e a construção de relacionamentos saudáveis.



A irreverência e o senso de comunhão, tão marcantes em nossa cultura, contribuem para um clima de trabalho descontraído e colaborativo. Só que o excesso de informalidade geralmente prejudica a produtividade e a qualidade da tomada de decisão.



A simplicidade do brasileiro facilita uma abordagem descomplicada para resolver problemas cotidianos que dificilmente encontramos em outro país. O outro lado da história é que a ênfase na “simplificação” quase sempre subestima a importância do planejamento estratégico e da análise em profundidade.



Em síntese, compreender e gerir os traços culturais no ambiente corporativo é essencial para garantir um equilíbrio entre a preservação do nosso jeito típico de ser e a implementação de práticas de gestão que contornam as limitações apresentadas pelo seu "lado sombra".



Como uma dança complexa, é preciso harmonizar a calorosa gentileza com a clareza nas decisões e transformar a irreverência em inovação sem perder a eficiência. Abraçar a simplicidade sem subestimar a importância da análise estratégica. Lidar com os desafios que surgem quando a informalidade e a espontaneidade confrontam com a busca por uma gestão empresarial sólida.



* Wellington Moreira, palestrante e consultor empresarial