Vou contar uma coisa pra vocês que são do ziriguidum, que estão aí sonhando com a Mangueira e sambando no Zerão: cumpro aqui na FOLHA a pauta de carnaval, acho que cumpro direitinho, foi uma semana de folias locais e de enredos, páginas caprichadas com aquela alegria barroca dos carnavais do Brasil.

Mas eu não sou de carnaval. No máximo, assisto aos desfiles das grandes escolas de casa mesmo, assim posso cochilar enquanto passa o samba que curto quando tem tambores (ô, Afoxé, divino, Olodum de baixar o santo no Pelourinho!), mas dispenso aquela fantasia toda de quem passa o ano se embelezando pra fazer caras e bocas na avenida.

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Do carnaval, curto mais a espontaneidade das cabrochas que não estão nem aí para o silicone, trocando passos com a flacidez e as estrias, mas a vaidade nacional, essa dos holofotes da Globo, me cativa menos que as rodas de samba do bairro.

Isso não quer dizer que eu não goste da alegria, mas alegria de biquíni e coxas plastificadas, de tiozão branquelo empunhando um estandarte que nem é seu na escola famosa, dispenso. Para mim tanto faz se eles empunham um estandarte ou uma vassoura, soaria falso do mesmo jeito no meio dos ritmistas. Sei que a parafernália toda dá dinheiro, um abadá custa 2 mil reais, mas, definitivamente, não sou parâmetro.

Acho divertido ver as fotos dos amigos sambando, cantando, parecendo crianças com suas fantasias. Mas este ano, e em tantos outros, não sambei, não bebi, me desvinculei. Estou numa espécie de alegria íntima, numa folia com minha liberdade de me desobrigar do carnaval neste domingo.

Já frequentei clubes e sambei na rua - o que acho muito mais divertido - mas sempre padeci de uma enorme preguiça de marchinhas e sobretudo axé, que tomou conta do Brasil há décadas. Sentia-me tonta coreografando aquilo. Tenho pavor de passinhos pro lado e mãozinhas pra cima. Mas respeito a alegria de quem ama gritar uuú, ooô, balbuciando monossílabos feito bebê que não cresceu.

Esses sons guturais do carnaval, o refrão maçante dos sambas-enredo, valem uma Wikipédia só com especialistas explicando o oooô, mas não sou a pessoa indicada para a tarefa, daria um tabefe no emissor de uuuús pra ver se sai som do outro lado. E me desculpem, mas neste carnaval não estou fazendo concessões, então abram alas ou vair sair tabefe pra todo lado.

De tudo, ainda gosto de samba e, como disse, de tambor. Mas na falta de uma boa bateria ou daqueles maracatus e afoxés que tocam o espírito, acho a folia carnavalesca sem graça. Mas não levem a sério, sou do tipo que às vezes sente tédio em festa, embore goste de ver pessoas felizes.

Carnaval é uma grande brincadeira. Carnaval é para almas puras com janelas abertas para diabruras. Eu encontro felicidade viajando em nuvens, tomando sol, bebendo água e comendo maçã, chega a dar barato como se filtrasse o pensamento.

Ando sentindo uma alegria suprema comigo mesma, um animal anárquico em sua toca confortável, enquanto o carnaval passa.

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A opinião da colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina.

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