Esta semana, uma nova versão de A Revolução dos Bichos, nome de um dos livros mais conhecidos do escritor britânico George Orwell, publicado em 1945, ganhou as redes sociais. A revolução dos bichos brasileira tem o mesmo espirito de sátira empregado por Orwell em sua obra para se referir à União Soviética, sob o comando de Joseph Stalin. No livro, ele demole a ideia de um sistema ideal, um paraíso social, ao mostrar o quanto os animais de uma fazenda são explorados pelo dono.

A ideia apareceu aqui depois que o presidente da República foi bicado por uma ema, nos jardins do Palácio da Alvorada; um estudante foi picado por uma cobra naja, mantida ilegalmente em cativeiro num apartamento em Brasília, e o ministro da Economia , Paulo Guedes, foi mordido por um cachorro da família, da raça Malamute do Alaska, quando ia para o trabalho e tentava fechar o portão de casa.

Os fatos em sequência bastaram para que os memes dos bichos povoassem as redes, dando pistas do momento insólito que vivemos, uma espécie de pré-revolução tupiniquim.

O presidente Jair Bolsonaro encontra-se em quarentena por ter sido contaminado pela covid-19. Mas a ema, alheia ao seu estado de saúde, não gostou quando ele lhe estendeu a mão para lhe dar comida, num grau de intimidade nunca visto, reagindo como um bicho da fazenda de Orwelll que está até as tampas com o patrão.

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. | Foto: Marco Jacobsen

Já o estudante Pedro Henrique Lehmkul, 22 anos, que mantinha a cobra em cativeiro - uma naja da Ásia, considerada uma das espécies mais venenosas do planeta - ficou dias numa UTI até se recuperar e agora está sendo investigado até mesmo por tráfico internacional de animais, já que ele mantinha outras cobras na mesma condição em Brasília, pondo em risco não só sua vida como as das outras pessoas. Quanto ao ministro Paulo Guedes, não há explicação para o “Totó” da família ter lhe dado uma mordida que o obrigou a tomar vacinas antitetânica e antirrábica. Pelo sim, pelo não, consta que todos os humanos e animais passam bem.

As fábulas são um gênero literário muito apreciado, no qual os animais assumem comportamentos humanos, como a fala, deixando ao fim da história uma lição de moral. O escritor francês Jean de La Fontaine era um craque no assunto e grande divulgador das histórias do grego Esopo.

Fontaine reescreveu essas histórias e descreveu as características dos animais com maestria em fábulas como A Raposa e as Uvas ou O Coelho e a Tartaruga.

Mas é no livro de Orwell que o sentido político ganha espaço com os porcos Bola-de-Neve e Napoleão liderando uma revolução contra a traição e a corrupção do governo, na tentativa de criar uma sociedade sob outras bases. Mas Napoleão também acaba traindo Bola-de-Neve, criando aquela ciranda tão conhecida: as lideranças são honestas ou se dizem honestas até serem seduzidas pelo poder.

No caso do Brasil, a metáfora foi resgatada com os comportamentos da ema, da cobra e do cachorro transformada em memes, sendo um dos assuntos que ficaram no topo da lista do Twitter, dando indícios de uma grande insatisfação popular em curso mas, no meu ponto de vista, ainda longe de uma solução. Enquanto isso, os animais vão fazendo 7 x 1 contra as lideranças políticas e cidadãos mal intencionados, como no caso do rapaz que, literalmente, cria cobras para fins suspeitos..