Ando eu chateado, com má notícia ecoando na cabeça, e eis que cantam as corruíras. Quando procuram ninho, o casal canta junto, ou melhor, um depois do outro, seu canto de nove notas, se é que contei bem na sua última visita.

Eles vêm fazer ninho em casinha na varanda, ao lado da porta de meu escritório, de modo que mais os escuto que vejo, evitando até me mover para não espantar os visitantes.

Já fizeram ninho aqui dois anos, depois passaram dois anos sem vir mas, agora, voltam a namorar a casinha. Ele vigia, sentado em viga do telhado, ela visita o velho ninho. Se gostarem (leio na net), farão o ninho com gravetos, penas, pelos de gado e até cabelos de gente, o que mais nos aproxima das corruíras, além de virem morar em nossa casa.

Mas não ficarão muito tempo, corruíra é ligeira até nisso, em dois meses os filhotes estarão no mundo – com muita chance de sucesso de vida, pois, se não sabe atacar, já que vive de insetos, larvas, sementes e frutos, a corruíra sabe bem se defender com ligeireza, voando tão rápido que gavião nem vê. Como os empreendedores humanos, que, se não são fortes, tem de ser ligeiros...

O ninho também é bem defendido por ser sempre em buraco de árvore ou no chão, vão de telhado ou chaminé, onde possam entrar por um buraquinho e ficar protegidos. O joão-de-barro constrói sua casinha, a corruíra acha seu buraco.

Assim tão pequenininha quanto bem dotada, essa avezinha que pesa apenas 10 gramas se espalhou pelas Américas e não está apenas no Ártico, só não vive bem no gelo.

Os ovos (confiro na net o que vi na última ninhada) são vermelho claro salpicado de vermelho escuro com manchas em cinza claro. Não esqueço de quando, olhando pelo buraco de entrada da casinha, vimos cinco filhotes arreganhando os bicos à espera de comida da mãe. Ou do pai, que também traz bichinhos no bico (e como saberá, a cada entrega, quem já comeu antes? Lembro de nossa cachorra Maga, que teve dez filhotes e a menorzinha não conseguia disputar as tetas com os irmãos, a mãe pegava na boca e levava para mamar longe dos outros, com a sabedoria dos instintos).

Na net leio que, depois de entregar ao mundo seus filhos, o casal continuará ou se separará, e matuto comigo como é que se chegou a tal conhecimento, botam chips nas corruíras?

Leio também que o canto das corruíras só perde em sonoridade para o canto da araponga. É assim um bicho pequenino mas com duas grandes características, o canto e a ferocidade, pois leio ainda que, quando tem de defender o ninho de predadores, a corruíra se agiganta enfrentando até bichos bem maiores.

Agora, quando o casal se vai depois da visita, vou ver se estão refazendo o ninho: ainda não, deve ter sido só uma visita de reconhecimento ou inspeção. Ou será outro casal? Talvez reprovem a casinha porque já foi usada? Ou porque viram aqui um sujeito triste?

Então olho o céu azul de um belo dia, tanto que começou com música, o canto das corruíras, aí esqueço minha notícia triste, respiro fundo o ar que compartilhamos e vou em frente. Corruiro-me.