Saímos de Londrina de manhã, para ver o mar e rever amigos que o tempo e a distância tornaram preciosos. Em Ponta Grossa pernoitamos na casa do primeiro amigo, e no jantar falamos do presente tão conturbado, de chorar, e sem saudade nem pesar lembramos do passado, só para rir. Para ele, a melhor terapia é rir da gente mesmo, rindo até do que doeu, pois nos dá a certeza de que superamos e evoluímos.

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. | Foto: Divulgação

Pois como éramos bobos! (Como se tivéssemos ficado muito espertos... Mas ao menos não somos mais enganados tão facilmente por mestres e gurus). Comendo melancia no café da manhã, lembrei de quando comi macrobiótica durante sete anos, evitando melancia, rabanete e tomate, que, por serem vermelhos, seriam muito ying... Rimos com boca cheia de melancia. E com o amigo partilhamos o maior dos milagres, a família, a comunhão de leite com alegria, café com ternura, pão com amor, nas palavras e gestos, olhos e sorrisos, milagre que a gente pouco percebe porque tanto se repete.

Daí fomos almoçar nos Campos Gerais, na pousada de outro amigo, vendo como funciona bem o turismo rural que antes parecia sonho. Diante de grande foto de casal com treze filhos na parede, ele diz que são seus pais e seus doze irmãos, dos quais ele é o único vivo: - Os outros todos trabalham... Mas, na verdade, ele toca sua pousada com gentil firmeza, alegremente menino como se não tivesse 82 anos.

De Curitiba veio outro amigo para almoçar conosco, também aposentado (“Pela previdência, pela vida não!”). Está sempre procurando o que fazer e, quando não acha, inventa. Lembrou de quando fizemos a trilha de 47 quilômetros pelas montanhas até Machu Pichu, e quase congelei os pés lavando cuecas num riacho de degelo. Eu tinha esquecido disso, mas os amigos lembram da gente mesmo quando da gente nos esquecemos. E nos despedimos com olhos úmidos.

Depois fomos jantar em Curitiba, com o quarto amigo, que também foi repórter lá no tempo do telex, mas continua com o mesmo olhar sagaz para as contradições e deslizes dos chamados homens públicos, como para as ingenuidades e ilusões da cidadania. Afinal, diz ele, políticos não são eleitos pelos deuses, mas pelas pessoas. Mas será, perguntamos, que as pessoas não aprendem, será que continuaremos sempre a cometer e sofrer os mesmos erros?

A gente aprende sim, ele garante, e, mesmo com a vida humana tão curta comparada por exemplo com a vida das montanhas, é só olhar para trás que vemos quantas mudanças! Afinal, diz ele, a cordilheira do Himalaia cresce alguns centímetros todo ano, coisa que um adolescente cresce em poucos meses, e continuamos crescendo por dentro mesmo quando o corpo passa a perder altura. Brindamos então a nosso crescimento e nossa vida pois, mesmo que as montanhas durem muito mais tempo, nunca rirão como nós, nunca dançarão nem cantarão, nunca se sentirão felizes como nós quando encontramos amigos tipo vinho, que melhoram com o tempo.

Depois fomos para a praia, mas chovia e ventava frio, almoçamos e voltamos sem nem pisar na areia. Foi uma viagem para dentro.