Quando a Rússia invadiu a Ucrânia com tantos tanques e quase 200 mil soldados, parecia que íamos ver uma guerra relâmpago, mas que. Os ucranianos fizeram como os russos com Napoleão, espertamente deixaram-se invadir e passaram a guerrilhar. Napoleão voltou derrotado para a França com apenas 60 mil dos quase 600 mil soldados que levou, e agora Putin se vê em tal embaraço que declara ser “impossível vencer as tropas russas”, o que, como sempre na linguagem política, devemos traduzir ao contrário.

Logo ficou claro que os russos não têm e os ucranianos têm de sobra o combustível essencial das guerras, motivação para lutar. Além disso, a mesma soberba de Napoleão acometeu Putin, mandando atacar já no fim do inverno, quando os tanques ainda não podiam trafegar na neve alta dos campos e foram emboscados às centenas nas estradas. Kiev foi cercada mas resistiu, até porque os ucranianos tinham lá um presidente que recusou oferta de refúgio do presidente Joe Biden, dizendo que precisava “de munição, não de carona”.

Volodymyr Zelensky já era então conhecido do mundo por suas falas ao vivo na internet, liderando seu povo sem retórica heróica, com coragem calma e dura determinação, desmentindo os descrentes na eficácia de alguém oriundo “da Cultura”. Pois antes de se candidatar a presidente, em 2019, tinha sido apenas ator e diretor de cinema, inclusive fazendo papel de presidente do país numa série de tevê muito popular.

Para participar da construção política da nação, seu grupo artístico Kvartal95 transformara-se em partido político, apregoando reformas agrária, eleitoral, política e judicial (como o Brasil tanto precisa) e Zelensky foi eleito com 73% dos votos em segundo turno. Focou seu governo também na desmontagem das oligarquias (que ainda imperam na Rússia), e também em cotas eleitorais femininas de 40% e fim do foro privilegiado. Tornou-se tão notório mundialmente que deu entrevista coletiva para 300 jornalistas, respondendo a 500 perguntas em 14 horas, um recorde Guiness.

Então tentou inutilmente dialogar com Putin, sobre as regiões com parte de população de origem russa. Sobreviveu a três tentativas de assassinato por mercenários a mando da Rússia. Mas enfim, após a invasão russa, teve de declarar que “a fronteira é só o que a Rússia e a Ucrânia têm em comum”.

Andrew Roberts, biógrafo de Churchill, comparou Zelensky ao líder inglês que liderou a luta contra o nazismo, tornando famoso no mundo o V da vitória feito com dois dedos e um sorriso, mesmo quando as bombas caíam em Londres. Já Zelensky não adotou um gesto mas toda uma postura de firmeza na pequenez com simplicidade e determinação.

Com suas falas diárias sem retórica política, falando de forma simples e clara para seu povo e para o mundo, sem gravata nem paletó, a evidenciar que não é um político profissional e sim um serviçal, tornou-se a maior arma da Ucrânia, todo dia injetando moral nas suas tropas e esperança no seu povo.

É um sujeito baixinho, como também foram nossos gigantes Santos Dumont e Rondon, mas servindo seu povo sem temor e com grandeza de espírito tornou-se símbolo mundial de democracia. Um baixinho arretado.

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