Dá gosto ver o Globo Rural, não só porque plantas me atraem desde o quintal de Vó Tiana, mas também porque o programa conserva o jeito de seu pioneiro repórter José Hamilton Ribeiro, de tocar cada reportagem como descobertas e as entrevistas como conversas.


Mas o nome Rural do programa defasou com o surgimento do nome Agro, ficou parecendo coisa da roça, palavra caipirosa em comparação com o Agro tech e pop, conforme a campanha que transformou a palavra em fonte de orgulho para uns e de ódio para outros.



Além da campanha da Bombril, que o ator Carlos Moreno apresentou por mais de 30 anos, não lembro de outra tão longa e marcante, principalmente pela fascinante diversidade da agroeconomia.



Em indústria de mandioca espanta ver quantos produtos derivam dessa raiz indígena, desde o chocolate ao papel. Como espanta saber que o café servido em Nova York passa por mais de cem mãos, desde o sítio da família que plantou e cuidou com carinho “pra dar bebida boa”. E aquele boi vai virar carne, salsicha, sapato, um mundo de coisas, tudo sempre pagando impostos.


O Agro é tão variado que enseja perguntar: o que é Agro? A agricultura de subsistência também é Agro? Decerto não, pois, apesar de vital para tanta gente, não paga impostos. Já quem, num assentamento, passa a produzir tanto que precisa abrir empresa para vender mais, torna-se Agro mesmo que não queira se ver assim.



Interessante é que Agricultura é palavra feminina, de que se originou a masculina Agro. A palavra Agro será assim filha de linguístico machismo?



Seja como for, o Agro não é tudo, até porque depende do comércio, da indústria e dos transportes. Decerto para diluir a jactância de que o Agro “é tudo”, agora o slogan da campanha tem o adendo “da gente para a gente”, ensejando esperança de que inspire e norteie produção com humano respeito ao ambiente e aos trabalhadores e consumidores.



Como repórter desta Folha em 1972, fui ver no Oeste do Paraná as primeiras plantações da rotação soja-trigo. A empolgação era tal que, numa cidade, chegavam a plantar encostadinho nas primeiras casas, e uma senhorinha reclamou:



- No plantio e na colheita não incomoda, mesmo com as máquinas passando na janela, mas, quando passam veneno, a gente fecha tudo, até com pano debaixo das portas, mas mesmo assim o cheiro entra, de sufocar, e o veneno matou todas as plantas da casa e do quintal!



Sempre que ouço alguém louvando ou atacando o Agro, lembro daquela senhorinha e também de Seo Celso: tudo que se for fazer, sempre será melhor fazer bem feito. Até porque o malfeito na produção vai prejudicar no comércio a reputação, como bem descobriram as indústrias de vinho.


Então, fico feliz de comprar numa velha kombi, a caminho de casa, uma paçoca artesanal, esperando que ainda ganhe rótulo de empresa. Como fico feliz de passar por plantações a enverdecer a amarelar como extensões da Bandeira. Dá muito gosto viver num país com gente que planta em poucos metros e em muitos hectares. Sou agro e sou roça porque sou brasileiro.

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