Na rede, chupo laranjas vendo como elas têm a forma do planeta, como tantas frutas arredondadas. Lembro então que no Japão há melancias quadradas, desde novinhas envoltas em caixas plásticas que enquadram seu crescimento, para permitir empilhamento naquele país tão carente de espaços. Mas a natureza se vingou: melancia quadrada perde a doçura, tornando-se apenas decorativa...

O Gênesis começa o mundo humano com uma fruta, a maçã, mas admirável é que depois, na desgraceira do Apocalipse, uma “árvore da vida” esteja a frutificar. E, entre Gênesis e Apocalipse, inclusive na Santa Ceia, temos muito vinho, que é feito da fruta uva.

Continuo na rede a escrever sobre as frutas, e a rede parece uma bananona esticada na varanda, como tantas coisas humanas parecem frutas ou vice-versa. Pois a maçã de Eva, no formato e até na cor, não parece um coração? A pera não tem uma cintura sensual? Pitangas não parecem frutas pérolas? E decerto Cleópatra teria gostado de jaboticada, outra fruta joia, enquanto o morango, despido de casca, é a fruta que mais parece se oferecer, não?

.
. | Foto: iStock

Mas só a banana pode ser despida com tanta facilidade quanto elegância. E não se pode falar de manga mas de mangas, tão variadas e sempre em guerra no mercado: a Aden foi derrotada pela Tommy que porém, por ainda ter alguns fiapos, vem sendo derrotada pela Palmer. Talvez a biotecnologia chegue ao abacaxi sem casca, mas os cruzamentos genéticos já nos legaram a atemóia, essa filha pródiga da pinha com a cherimóia, uma espécie de fruta-do-conde. A variedade frutal é tanta que só a família das anonas, de que a atemóia descende, tem desde a pequena ata até a gigante graviola que chega a oito quilos!

Conforme tio Goo, as frutas são precursoras da globalização, espalhando-se pelo mundo há milênios, viajando de caravelas como as mangas e abacates quando vieram da Índia, mas, antes disso, frutas já eram levadas a pé de um continente a outro. A banana é campeã viajante, saindo do Sudeste da Ásia para as Filipinas e todas as milhares de ilhas da Indonésia, sem falhar nenhuma, e daí para todo o mundo tropical; é a fruta pan.

Já limão, se não é de comer, além das limonadas dá temperos e coquetéis tão variados quanto os próprios limões. (Mas levei décadas para descobrir que como tempero de carne o limão é ressecante, pode ser usado mas depois da carne assada. Fica também a dica de leite de mamão para limpar e suavizar a pele das mãos.) E, se a mestiçagem é a raça do futuro, o limão-rosa é o mais mestiço das frutas, com sua parecença tão sertaneja mas, na verdade, mistura de tangerina e cidra, originário, quem diria, dos sopés do Himalaia!

Já a jaca é anta das frutas, e a melancia seria muito mais amada sem sementes, mas quem é perfeito? Talvez só a cereja, embora a goiaba pareça tão feliz consigo mesma.

O liquidificador espera o próximo suco de fruta. Meu café da manhã é quase sempre abacate ou banana com mel e granola, e meu Natal tem gosto de lichia.

Por mim, o planeta devia se chamar Fruta.

...

Os artigos publicados não refletem necessariamente a opinião da Folha de Londrina que os reproduz no exercício de sua atividade jornalística e diante da liberdade de expressão que lhes são inerentes.