Em Alice no País das Maravilhas, o Coelho diz que, além do dia de aniversário, todos os outros dias são de desaniversário. Penso nisso em almoço familiar de aniversário, enquanto todos posamos para foto. Depois, discursando como aniversariante, agradeci a todos por demonstrarmos juntos nossa versão do maior dos empreendimentos.

É um empreendimento com tanta gente que em todo dia do ano terá nascido algum dos nossos milhares de pioneiros. São os nossos 4 avós, 8 bisavós, 16 trisavós, 32 tataravós e assim por diante, ou melhor, para trás, sempre aumentando a parentaiada enquanto a população do mundo foi diminuindo, assim evidenciando até numericamente que, como disse Jesus, somos todos irmãos.

Esse imenso empreendimento se multiplica por bilhões mas não tem ações na Bolsa. Alimenta seu pessoal, veste, cuida, dá banho e ensina a se banhar, como ensina a todo novato a língua, a higiene, costumes e condutas, e adverte contra os perigos do mundo, inclusive os do mundo interior de cada um.

Esse empreendimento busca na creche e dá aos novatos bolsa de estudos desde a pré-escola. Também dá cama, comida e roupa lavada. E dá tanto apoio na caminhada quanto faz reparos para o jovem achar rumo.

Esse empreendimento já cuidava dos idosos desde o tempo em que eram chamados de velhos e caducos.

Hoje se aponta que a próspera estabilidade da Suiça se baseia no seu modelo de cantões, as cidades-Estado com autonomia. Pois o maior empreendimento humano, a família, também se baseia na autonomia dos casamentos, como micro-empresas consorciadas por respeito mútuo.

Mudamos muito desde o tempo dos antepassados mais primitivos, que desceram das árvores para viver de coletar frutos e ovos, quando tínhamos só chefes de bandos e nem linguagem ainda.

Mudamos bastante para virar tribos, com língua e moradias, armas e arados, lideranças e cerimônias.

Mudamos mais ainda criando cidades, que originaram nações e impérios com crenças e exércitos, até chegando a armas que podem destruir o próprio planeta.

E durante todo esse tempo só a família não mudou fundamentalmente, continuando com pai e mãe e filhos, primos e sobrinhos, nenês e avós – e agora também filhos com dois pais e duas mães nos casais homoafetivos.

Da família saem os políticos e policiais, os militares e os juízes, os cientistas e os artistas, os sacerdotes e os sacripantas.

A família sustenta o Estado e os poderes chamados públicos, pagando impostos embutidos nos produtos que consome.

Além disso, cada família é já em si amostra da diversidade humana, basta ver as diferenças entre irmãos, muitas vezes maiores que as semelhanças. Como se calcula que as variedades todas somam 10% da população, quem renega variedade de gênero entretanto terá estatisticamente alguém de gênero variado em cada dez aparentados. Até por isso a família é campeã de tolerância e inclusão.

E esse imenso empreendimento nem tem logomarca, e não obriga ninguém a se filiar, o que a grande maioria faz apenas por amor.