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. | Foto: Dalva Vidotte/ Divulgação

Volto ao tema agradecer porque quanto mais olho para trás, mais dá vontade de. Agradecer antes de tudo ao Sol, essa estrela de nome masculino que um dia explodiu, lançando pedaços que esfriaram e se juntaram, formando os planetas a orbitar em torno da estrela mãe.

Agradeço à Terra, por ser o único planeta com terra, água e ar para a vida, e também por girar inclinada, assim nos dando quatro estações e todas suas frutas e castanhas.

Agradeço por nascer numa região intertropical, sem inverno gelado nem verão tórrido, onde se pode mesmo plantar de tudo que a terra-vermelha tudo dará.

Então é preciso agradecer também aos seres minúsculos, das bactérias às minhocas, que durante bilhões de anos foram transformando em terra a rocha dura que cobria os continentes.

Depois é preciso agradecer por nascer na primeira cidade de uma grande colonização, com gente do país inteiro e do mundo todo, desde menino vendo muita gente a ousar e empreender.

Por tanto, é preciso agradecer também ao café, por ter feito virar logo cidadezinha o povoado Três Boas. E agradecer à cafeicultura pela Capital do Café onde o menino tinha o Cine Ouro Verde que tinha o Zorro e o Tarzan, O Gordo & O Magro e Carlitos, Grande Otelo e Oscarito.

Agradeço igualmente crescer ouvindo no rádio samba, baião e rock, Noel e Ataulfo, Jackson e Gonzaga, Elvis e todos os que fizeram do rock a primeira comunicação global em massa.

Aí agradeço aos Beatles e aos Rolling Stones, Mamas and Papas, Roberto e Erasmo, todos que encheram minha vida de canções, um festival interminável porque levanto cantarolando uma música e ela fica o dia inteiro ecoando na cabeça.

Agradeço enfim por viver num tempo em que, depois de milênios de civilizações analfabetas e desconectadas, numa só vida pude ouvir rádio e LP, ver cinema e tevê, viajar da fita cassete ao streaming!

Agradeço à velha vitrola com que aprendi a ouvir jazz, deitado no tapete entre suas duas caixas de som, percebendo então cada instrumento, entrando nas entranhas da sinfonias.

Entretanto agradeço também a Lao-Tse por aprender a ouvir o som do silêncio.

Mas é preciso lembrar de agradecer também aos velhos navios, desde as caravelas, sem o que não viriam para a América nem se encontrariam meus 48 trisavós e tetravós.

Agradeço aos acasos que fizeram meus avós e pais se cruzarem na teia da vida, agradecer por ser resultado de tantos encontros.

Como agradeço por ter pedido a bênção a meus avós e ouvir netos me chamando de você.

Agradecer por ter visto a democracia se espalhar por tantos países, tantas ditaduras caírem, a transparência começar, a cidadania ir assumindo, o mundo, apesar de tudo, ir melhorando, portanto agradecendo também por ser otimista, esperançoso e confiante.

Sem esquecer de agradecer ao ar por estar sempre aqui mesmo tão esquecido.

Agradecer ao vapor por enuvecer e às nuvens por chover.

Agradecer à língua, que dá a tudo isso o nome de Deus.

E agradecer a Deus por ser. Agrade-ser.