A humanidade transita por um momento de incertezas. Conflitos de diversas naturezas (bélicos, étnicos e religiosos) promovem migrações em massa de cidadãos de países conflitados para países mais pacíficos e desenvolvidos onde pretendem iniciar uma nova vida com seus costumes e crenças, nem sempre bem aceitos pelas comunidades locais. Chegam avisando que não têm do que sobreviver e precisam de ajuda para iniciar uma nova vida, gerando conflitos com quem os recebe. Somam cerca de 70 milhões os migrantes nas duas últimas décadas, a maior parte afetando países desenvolvidos da Europa, pela proximidade com a África, o continente mais afetado pela fome e pelos conflitos de todo tipo.

Para países em desenvolvimento, as incertezas do momento geraram vantagens. No transcorrer das duas primeiras décadas deste século, os países em desenvolvimento – Brasil no meio - capturaram 20 pontos percentuais do PIB dos países ricos, segundo informado pelo colunista da Folha de São Paulo, Marcos Jank, em 2018. O agro brasileiro foi beneficiado pelo aumento da demanda mundial de produtos agrícolas. Mas o Brasil poderia beneficiar-se muito mais se soubesse aproveitar a oportunidade e não continuar paralisado pela crise doméstica que o inibe de buscar maior inserção no comércio internacional, que a tanto tempo busca e não consegue.

O Brasil lidera a produção agrícola em zonas tropicais de baixa latitude. A maior parte do seu território encontra-se localizado nessa região, onde os solos são ácidos e inférteis, mas para os quais o Brasil desenvolveu tecnologias que o converteram num dos maiores centros mundiais de produção agrícola e dando ensejo para o Brasil creditar-se como o futuro maior provedor de alimentos para um mundo cada vez mais urbano e dependente de comida, a qual precisará ser produzida por um contingente de agricultores ainda dispostos a trabalhar na zona rural, cada vez em menor número.

Foi um avanço reconhecido pela comunidade internacional a transformação das terras de Cerrado do Brasil central em um imenso campo de produção de grãos, fibras e carne. Mas o Brasil pode mais, dada a grande disponibilidade de terras aptas, clima favorável para produzir ao longo de todo o ano e água em abundância para irrigar, quando a operação compensar financeiramente.

Embora eficiente no domínio das tecnologias tradicionais de produção, isto não mais é suficiente para garantir ao Brasil um lugar ao sol, na futura arena global. Novos paradigmas tecnológicos (tecnologias digitais e biotecnologias, entre outras) estão sendo disponibilizados ao mercado, e seu domínio e uso são necessários para que o Brasil avance e ocupe o lugar que merece no contexto dos maiores produtores globais de produtos agrícolas.

A transformação do Cerrado infértil num dos maiores celeiros do mundo, é uma demonstração de força do agro brasileiro, rumo à liderança mundial do setor agrícola, ainda em poder dos EUA. Além de muitos recursos naturais, o Brasil também conta com agricultores dos mais dinâmicos do planeta, em sua grande maioria oriundos de pequenas propriedades que evoluíram para mega empreendimentos agrícolas, dada a garra e a disposição ao trabalho diuturno desses heróis anônimos.

Já comentamos neste espaço que a Holanda, pequeno país europeu, uma fração do território brasileiro, fatura mais com a exportação de produtos agrícolas do que o Brasil. Os volumes exportados pelo Brasil são bem maiores, mas têm pouco valor. Diferente da Holanda, o Brasil exporta commodities agrícolas com pouco valor agregado, o que prova que produzir bem é importante, mas agregar valor à essa produção pode ser ainda mais importante.

Para que o produto brasileiro seja valorizado no exterior, além da qualidade ele precisa provar que foi produzido respeitando o meio ambiente e as condições do trabalhador envolvido no processo da produção, criando, assim, reputação positiva dos produtos “made in Brazil” e promovendo a abertura de novos mercados.

A participação do Brasil no mercado internacional é irrisória (menos de 1,5%) considerando seu tamanho e potencial. Mas está evoluindo, com o agronegócio mostrando o caminho das pedras.

Amélio Dall’Agnol, pesquisador da Embrapa Soja