O impasse em torno do fechamento do Hospital São Camilo, em Jataizinho (Região Metropolitana de Londrina), expõe uma situação recorrente em muitos municípios de pequeno e médio porte, que é a falta de serviços de saúde de média complexidade. No Paraná, segundo dados da Sesa (Secretaria de Estado da Saúde), há 168 cidades sem nenhum hospital conveniado ao SUS (Sistema Único de Saúde), o que corresponde a 42% do total de municípios.

O Hospital São Camilo chegou a fechar as portas, mas após um acordo com a 17ª RS para manutenção do contrato de urgência e emergência, a instituição foi reaberta e deve permanecer atendendo os pacientes até que o posto de saúde esteja concluído
O Hospital São Camilo chegou a fechar as portas, mas após um acordo com a 17ª RS para manutenção do contrato de urgência e emergência, a instituição foi reaberta e deve permanecer atendendo os pacientes até que o posto de saúde esteja concluído | Foto: Gustavo Carneiro - Grupo Folha

Embora a falta de hospitais secundários afete cidades em todas as regiões do Estado, na área de abrangência das regionais de saúde que compreendem os maiores municípios paranaenses, a realidade é um pouco mais favorável. Na 1ª Regional de Saúde, em Curitiba, há 53 hospitais para atendimento pela rede pública, na 17ª RS, em Londrina, são 27 instituições de saúde. Já na região da 6ª e da 7ª RS, em União da Vitória (Sudeste) e Pato Branco (Sudoeste), respectivamente, são sete hospitais em cada regional e, na área da 21ª RS, em Telêmaco Borba (Campos Gerais), há apenas quatro hospitais, segundo dados da Sesa.

Entre as cidades polo, Curitiba concentra o maior número de hospitais para assistência a pacientes do SUS, com 25 instituições, seguida por Maringá (Noroeste), com 11, e Londrina, com dez unidades.

O hospital de Jataizinho é apenas um exemplo do que acontece em muitos municípios brasileiros, que se veem forçados a fechar hospitais secundários por falta de verbas para cobrir as despesas. O Hospital São Camilo anunciou que encerraria as atividades no dia 30 de abril, mas em razão de uma determinação judicial, teve que manter a estrutura em funcionamento. À meia-noite do dia 13 de junho, a direção da unidade chegou a fechar o hospital, mas após um acordo com a 17ª RS para manutenção do contrato de urgência e emergência, a instituição foi reaberta três dias depois e deve permanecer atendendo os pacientes até que o posto de saúde esteja concluído.

DISCUSSÃO ULTRAPASSADA

O funcionamento de unidades de média complexidade em cidades menos populosas, no entanto, divide opiniões. O médico sanitarista especialista em Saúde Pública João José Batista de Campos, de Londrina, considera essa discussão ultrapassada. A falta de estrutura tecnológica e de recursos humanos especializados para acolher pacientes que precisam de atendimento de maior complexidade é apontada por ele como o principal motivo para que município e Estado não invistam na manutenção dessas unidades. “A superespecialização da medicina impossibilita que se tenha um cirurgião de tórax em cada cidade pequena para dar conta de um traumatismo torácico que possa ter existido após um acidente de carro, por exemplo”, apontou o médico.

Manter um médico, preferencialmente especialista em saúde da família, nas pequenas localidades para dar um primeiro suporte antes do encaminhamento a um hospital de maior complexidade instalado nas cidades polo de micro ou macrorregiões, afirmou Campos, seria a melhor solução. Hospitais que tenham estrutura física e tecnológica e profissionais especializados podem dar conta do atendimento com maior eficácia e melhor custo-benefício, afirmou o especialista. “Um acidente de carro nem deveria ir para a clínica desse médico (saúde da família) na pequena cidade. Já deveria haver um sistema de resgate para levar a pessoa para centros de maior complexidade.”

ENTENDIMENTO DA SESA

O mesmo entendimento tem a Sesa. O órgão afirma não ser necessário manter um hospital em cada município, considerando que os serviços têm alto custo e, para que o atendimento seja de qualidade, são necessários escala de atendimento, estrutura física e equipamentos adequados, assim como profissionais qualificados.

A Sesa esclareceu que os municípios que não possuem hospitais contam com unidades básicas de saúde, pronto atendimento ou UPA (Unidade de Pronto Atendimento), que prestam o primeiro socorro em situações de urgência e, quando necessário, solicitam a transferência do usuário para serviços de maior complexidade por meio do Sistema Estadual de Regulação, que compreende a regulação das urgências feitas pelo Samu ou regulação de acesso aos leitos.

Imagem ilustrativa da imagem Impasse em Jataizinho levanta discussão sobre hospitais secundários
| Foto: Folha Arte

OBRAS EM ANDAMENTO

O governo do Estado informou ainda que há obras em andamento, como a do Hospital Regional de Guarapuava (Centro), que está 98,7% concluída, mas já vem sendo utilizada para atendimento aos casos de Covid-19. O investimento na construção do hospital deverá totalizar R$ 47 milhões.

A Sesa também investiu R$ 18,5 milhões em obras em andamento nos hospitais municipais. O recurso irá financiar reformas, ampliações e novas construções. E por meio do QualiCIS (Programa Estadual de Qualificação dos Consórcios Intermunicipais de Saúde), o Estado tem a previsão de repasse anual de R$ 60 milhões para apoiar os municípios por meio dos consórcios.

'ABSURDO FECHAR EM UM MOMENTO DESSE'

Prefeito de Arapongas e presidente da Amepar (Associação dos Municípios do Médio Paranapanema), Sergio Onofre criticou a Sesa (Secretaria de Estado da Saúde) e disse que irá conversar com o governador Ratinho Junior na próxima semana sobre a situação do Hospital São Camilo, de Jataizinho, assim como a de outros hospitais nos municípios da região de abrangência da associação. “Acho um absurdo deixar fechar um hospital em um momento desse (de pandemia de coronavírus). Deveriam dar as mínimas condições aos hospitais de pequeno porte porque os grandes hospitais não estão aguentando, não têm vagas. Neste momento, tem que abrir vagas e não fechar. A Sesa está equivocada.”

Manter essas instituições de saúde em atividade, afirmou Onofre, é uma questão de equilíbrio financeiro. Ele defende que órgãos públicos comecem a trabalhar como as empresas privadas e que a solução pode ser a terceirização. “Os hospitais têm que se viabilizar financeiramente. Eles conseguem se pagar desde que haja uma boa gestão. Quando é do município, tem um custo variável, a cada mês custa um tanto. É preciso terceirizar para ter um custo fixo. Terceirizamos a UPA 24 horas (em Arapongas) e tudo mudou da noite para o dia.”

Na reunião com o governador Ratinho Junior, que deverá acontecer na semana que vem, Onofre irá acompanhado de um técnico de Arapongas. “Estamos elaborando um estudo técnico que diz que hospitais abaixo de 60 leitos não se pagam, mas tem que viabilizar para que se pague.”

CUSTOS DA COVID

O prefeito disse ainda que em razão da pandemia, as unidades de pronto atendimento passaram a ter um alto custo aos municípios, que mantêm o funcionamento com recursos próprios. “No ano passado, Arapongas recebeu R$ 14 milhões do governo federal para o tratamento da Covid-19. Neste ano, recebi R$ 240 mil. Mas no ano passado todo eu gastei o que eu gastei em seis meses neste ano”, comparou Onofre. “A UPA em Arapongas virou hospital. As pessoas estão internadas na UPA porque não tem vagas nos hospitais e o custo disso fica muito maior porque tem que manter médicos e enfermeiros que entendam de UTI.”

HOSPITAL DE WENCESLAU BRAZ

Em atividade desde novembro de 1956, o Hospital São Sebastião, em Wenceslau Braz (Norte Pioneiro), inaugurou em maio passado o centro cirúrgico, construído com recursos repassados por meio de um convênio com o governo do Estado. Com a reestruturação, a capacidade foi estendida de 33 para 52 leitos, mas devido a um decreto estadual publicado em razão da pandemia, as cirurgias eletivas estão suspensas e, atualmente, os casos de Covid-19 concentram o maior volume de atendimentos. “A infraestrutura está montada. Neste momento, a instituição busca parcerias através de convênios com o município de Wenceslau Braz e demais municípios da região para o custeio”, disse o presidente do hospital, Juan Pablo de Azevedo Zub.

O custo operacional da unidade, segundo o presidente, é de cerca de R$ 150 mil mensais com faturamento em torno de R$ 120 mil. Zub destacou que há previsão de implantação de novos serviços que, se concretizados, irão gerar mais custos, embora a receita também deva crescer. Hoje, o município repassa R$ 60 mil mensais para o custeio do plantão de urgência e emergência. Em média, são realizados quatro mil atendimentos todos os meses. Wenceslau Braz tem aproximadamente 20 mil habitantes e o hospital atende a população dos municípios vizinhos, além de pessoas de passagem pela rodovia que precisam de atendimento médico.

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