Renata Belei, 50, estava de férias quando as informações sobre um novo vírus começavam a entrar no noticiário brasileiro. A experiência de 26 anos no HU (Hospital Universitário) de Londrina a fez considerar que a chegada da doença na cidade faria com que a unidade onde trabalha se tornasse referência no tratamento aos pacientes, como já fora em outras ocasiões. Com o retorno ao trabalho, no final de janeiro, e acompanhando tudo que ocorria ainda fora do País, acionou o departamento de compras para garantir o máximo de equipamentos aos profissionais. Este é mais um relato de profissional de saúde ouvido pela FOLHA.

Imagem ilustrativa da imagem Enfermeira relata a rotina de cuidados no HU de Londrina

“Acionei o departamento de compras e falei: ‘vamos tentar comprar o máximo que conseguir’ e vi que a gente já teve dificuldade para comprar equipamentos ali em janeiro, aí eu me preocupei”, comenta a enfermeira que faz parte do CCIH (Comissão de Controle de Infecção Hospitalar) do HU.

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Os equipamentos chegaram por meio de um fluxo de compra. “Nós usamos muito a nossa experiência com o H1N1, então começamos o treinamento desde a portaria, pronto-socorro, quem faz a limpeza, treinamos as pessoas, fizemos a primeira sedimentada dos conceitos”, aponta.

PRIMEIRA EXPERIÊNCIA

A enfermeira conta que a primeira experiência com a suspeita de doença no hospital pegou todos de surpresa, gerando um nervosismo maior que o esperado. “A gente achou que o paciente iria chegar no pronto-socorro, mas teve uma paciente que já estava internada há alguns dias e o pulmão dela começou a ficar ruim”, comenta.

Ainda que a paciente tenha testado negativo para Covid-19, para ela, esse foi um momento importante de maior conscientização sobre os cuidados com a biossegurança e tornou a equipe mais segura e mais preocupada em não falhar nos próximos casos suspeitos que surgiram. Tudo isso, lidando sobre as notícias falsas que surgiam dentro da unidade.

“A gente fazia os treinamentos intensivos e alguém perguntava: ‘é verdade que o hospital está com três positivos?’ Surgiam as fake news lá dentro e a gente precisava orientar. Nós ficamos um bom tempo sem positivo, quando tivemos um paciente confirmado, nós já estávamos com vários suspeitos”, aponta.

MAIS SOLIDARIEDADE

O protocolo seguiu conforme as orientações, gerando maior controle emocional. “Não gerou pânico, eu lembro que no H1N1 o pessoal se assustou mais, agora eu vejo mais solidariedade e mais envolvimento dos profissionais”, afirma. O hospital também colocou uma equipe de atendimento aos colaboradores que estiverem sentindo os sintomas e também que necessitarem de apoio emocional.

“Eu vejo que é um misto de sentimento. As pessoas chegam preocupadas no trabalho todos os dias, muitos fazem uma oração e nós nos sentimos abençoados por Deus, porque estamos cuidando de uma doença que podemos pegar e não resistir, mas sabemos do nosso compromisso, a cidade precisa do HU e isso nos anima”, afirma.

MOTIVAÇÃO

Trabalhando diretamente com a compra dos materiais e treinamento das equipes, Belei comenta a dificuldade ainda de adquirir os materiais e do aumento dos preços dos EPI (Equipamentos de Proteção Individuais) e que nas cidades em que assessora existem situações muito piores. Nesse ponto, enxerga a abertura de caminhos inesperados. “Essa corrente de pessoas nos ajudando, costurando uniformes, doando comida, produto de desinfecção, união de grupos, donas de casa, empresários, políticos, ex-alunos, isso motiva muito e às vezes eu fico super emocionada”, afirma.

O que a motiva a continuar trabalhando, mesmo tomando todos os cuidados, nesse momento de pandemia, o hospital continua a ser um ambiente de risco. “No começo, eu saía cedinho de casa, olhava as ruas vazias (pela quarentena), dava uma tristeza, porque você tem família, as pessoas estão protegidas em casa, e tem que ir. Mas na hora que você entra no hospital e percebe que está ajudando uma pessoa sobreviver e vê a equipe muito unida, comprometida, isso é muito legal.”