SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Guadalupe, 9, deixou as Ilhas Canáras, na Espanha, prometida para o paulista Teobaldo, 6. Ele é sociável, enquanto ela é desconfiada. Ele foi criado por uma equipe e ela, pelos pais biológicos. Para o casamento arranjado, ela deixou a família na sua terra natal e desembarcou no Brasil em outubro, quando foi submetida a uma quarentena e uma série de exames.

Com a saúde em dia, ela agora está conhecendo melhor o pretendente --porém, o relacionamento segue à moda antiga: nada de contato até se apaixonarem e, enquanto isso não acontece, eles vivem separados por uma grade, onde podem flertar e conversar. Agora, resta saber se essa fase vai evoluir para uma história de amor.

O possível romance é protagonizado por um casal de araras azuis que vive no Zoológico de São Paulo e tem como objetivo aumentar a espécie que integra a lista de animais em perigo de estimação, de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza.

Hoje, estima-se que a população de arara-azul-de-pear seja de 1.700 aves. A união de Guadalupe com Teobaldo é parte de um projeto do Cemave (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres), um braço do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade).

Entre os objetivos deste programa está a manutenção de espécies geneticamente viáveis ao longo dos anos. Bióloga responsável pelas aves no zoológico, Fernanda Guida afirma que não dá para arriscar o futuro para essa espécie.

"Por isso, este programa permite que tenhamos uma população reserva que habite sob os cuidados humanos. Para que essa espécie continue vivendo por muitos anos, precisamos reproduzir e manter essa diferença genética com uma população diversa", explica ela que detalha que o comportamento reprodutivo desta espécie costuma acontecer entre dezembro e abril o tempo de incubação dos ovos é de 26 a 28 dias.

O match de Guadalupe com Teobaldo veio de uma análise do Cemave que indica, de acordo com a genética das aves, qual fêmea tem melhores chances com cada macho. Além disso, ele é o primeiro que nasceu em cativeiro no Brasil, em 2015, e, sendo o mais velho, está mais maduro sexualmente que o restante.

Porém, o amor não é uma ciência exata e mesmo que todos os sinais biológicos apontem que o casal tenha de tudo para procriar, o relacionamento pode não engatar.

"Eles precisam criar vínculos afetivos fortes", afirma Guida, que relembra que o zoológico já teve casos que não deram certo, como um casal de aves que viveu por quase 15 anos juntos. A vida entre eles era harmônica, mas sem qualquer sucesso reprodutivo. A solução neste caso foi separar o macho e deixá-lo escolher entre duas fêmeas. O resultado? Ele e sua escolhida soltaram ovos em um mês.

Uma das diferenças entre o casal formado por Guadalupe e Teo é a criação. Isso porque ele foi criado por humanos, já ela por seus pais biológicos. "É muito diferente. A gente tenta criar esses filhotes sem criar muitos vínculos, mas eles acabam conhecendo os humanos de uma forma geral", explica Guida.

A bióloga diz que o momento deles dividirem o mesmo espaço será decidido após uma análise comportamental. "Podemos tentar juntar na sorte e, se der briga, separamos. Mas, sempre preferimos que seja mais natural e tranquila. Eles são jovens e mesmo que formem um casal não vão reproduzir agora. Temos que esperar alguns anos para que consiga algum sucesso."

Apesar do início do relacionamento caminhar ainda de forma conservadora, caso o romance não vingue, o desquite não é um tabu entre Teobaldo e Guadalupe. Aliás, é bem moderninho e ela já tem outros pretendentes à sua disposição: seus cunhados, os irmãos do Teo.

Soltura na Bahia Além da reprodução de espécie, o programa do Cemave também prevê a soltura das aves no Parque Boqueirão da Onça, na Bahia --a arara-azul-de-lear é endêmica da caatinga baiana. Até agora, já foram realizadas duas solturas e, ao todo, 12 aves foram devolvidas para seu habitat.

Na terceira sotura, prevista para o início de 2022, o Zoológico de São Paulo enviou cinco pássaros. Lá, durante alguns meses, as aves passam por uma série de avaliações para que se tenha certeza que elas estão aptas a integrarem o habitat natural. Durante este período, os pássaros precisam demonstram que estão aptos a voar bastante, que são capazes de se alimentar e precisam também mostrar que tem medo de predadores.

"É um processo longo e, se tiverem aptas, serão soltas no inicio do ano que vem. Se não, retornam para o programa de reprodução", afirma a bióloga Fernanda Guida.