SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A União Europeia aprovou nesta quarta-feira (23) um pacote inicial de sanções contra a Rússia em reação ao reconhecimento por parte do presidente Vladimir Putin da independência de duas regiões separatistas na Ucrânia.

A decisão ocorre em meio a tensão provocada pelos temores de um conflito armado —a Rússia posicionou mais de 100 mil soldados em diferentes pontos da fronteira ucraniana— e um dia depois de os Estados Unidos anunciarem seu próprio pacote de medidas contra instituições financeiras e membros da elite russa.

O conjunto de sanções europeias já havia sido chancelado por unanimidade pelos ministros das relações exteriores dos 27 países-membros na terça (22), mas precisava ainda ser confirmado pelos respectivos embaixadores, procedimento formal que ocorreu nesta quarta.

As sanções impactam os 351 membros da Duma (Câmara baixa do Parlamento russo) que chancelaram a decisão de Putin —por enquanto, o presidente está de fora da lista. Eles estão proibidos de viajar aos países do bloco e tiveram bens na UE congelados.

O pacote de retaliações atinge ainda 27 entidades e indivíduos que, segundo comunicado da UE, participaram "da ameaça à integridade territorial, soberania e independência da Ucrânia". Neste grupo estão membros do governo; bancos e executivos que forneceram apoio financeiro e material às operações nas regiões separatistas de Donetsk e Lugansk; e autoridades militares e indivíduos "responsáveis por liderar a guerra de desinformação contra a Ucrânia".

As novas medidas também restringem o comércio das regiões separatistas com a União Europeia, bem como o acesso a investimentos, e a proibição de exportação de bens e tecnologias. O governo russo também terá acesso restrito ao mercado europeu de capitais.

Ainda que o conjunto de sanções tenha sido aprovado por unanimidade nesta terça, a UE enfrentou um xadrez para decidir o tom do pacote, pois há membros do bloco mais próximos a Moscou que preferiam algo mais limitado. Outros queriam ver uma resposta ampla e dura, com base no que foi discutido nas últimas semanas.

A Itália, por exemplo, que depende do gás russo, defendia que as sanções não impactassem a importação de energia —Putin garantiu que manteria o fornecimento para mercados mundiais—, enquanto a Lituânia argumentava que elas não poderiam ser simbólicas e a Polônia subiu o tom, defendendo que elas se estendessem ao presidente russo.

A adoção de medidas mais brandas, porém, faz parte de uma estratégia adotada pelos ocidentais para poder endurecê-las caso a crise se agrave. O chefe da diplomacia do bloco, Josep Borrell, afirmou na terça que esta era parte da resposta a ser dada, e o Reino Unido já afirmou ter mais sanções preparadas, ainda que esteja fora do bloco.

Mais sanções já estão engatilhadas. Segundo o jornal americano New York Times, na quinta-feira (24) o bloco deve anunciar medidas contra autoridades do círculo próximo de Putin e contra executivos de mídia russos.

O jornal diz ter tido acesso ao documento que lista as sanções que serão anunciadas na quinta. O pacote incluiria o ministro da defesa da Rússia, Serguei Choigu, além do chefe de gabinete de Putin, Anton Vaino. Entram ainda a diretora do Departamento de Informação e Imprensa do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, e Margarita Simonian, chefe da rede russa de televisão RT. A União Europeia deve categorizar os executivos de mídia russos como agentes de propaganda, diz o New York Times.

O executivo russo Ievgeni Prigozhin, próximo a Putin e líder da organização paramilitar Grupo Wagner, também deve ser incluído na lista, assim como membros de sua família. As sanções também incluem a proibição de viajar para a União Europeia e o congelamento de bens. Segundo o jornal, a lista foi elaborada em coordenação com autoridades dos Estados Unidos.

Além das sanções decididas em bloco, a Alemanha reagiu individualmente nesta terça, ao congelar a certificação do gasoduto Nord Stream 2, que liga a Rússia ao país europeu e está pronto, mas sem poder operar devido à crise na Ucrânia.

Na tarde desta quarta, o presidente americano Joe Biden também anunciou sanções à Nord Stream 2 AG, empresa responsável pelo gasoduto, e seus dirigentes. O comunicado da Casa Branca, no entanto, não detalha quais serão essas sanções.

O Nord Stream 2 é o segundo ramal de um megaprojeto iniciado nos anos 2000. Duplica a capacidade de transporte de gás natural pelo mar Báltico, possibilitando à Rússia desviar o fornecimento que hoje é majoritariamente feito por meio justamente da Ucrânia e da turbulenta ditadura aliada Belarus.

A Rússia minimizou o impacto da decisão, com o vice-chanceler Andrei Rudenko dizendo que Moscou não tem nada a temer e que "não acredita em lágrimas", segundo divulgou a agência de notícias Tass.

A medida não afeta ainda o fornecimento de energia, segundo a própria Comissão Europeia, uma vez que o gasoduto não estava operante. O ministro da Economia alemão, Robert Habeck, disse nesta terça que o abastecimento estava garantido, mas que poderia haver um aumento no preço a curto prazo, o que já ocorreu. O valor subiu 9,2% para € 78,5 por megawatt/hora.

Diante disso, o porta-voz do presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou que o governo tem adotado fortes medidas para congelar o preço do gás, que já vinha em alta há cerca de um ano no país. "Nós bloqueamos o preço do gás e vamos continuar a bloquear o aumento do preço do gás, é claro", afirmou Gabriel Attal. "A segunda coisa que foi lembrada nesta manhã por Bruno Le Maire [ministro da Economia] é que somos bem menos dependentes do gás russo que outros países."

A Alemanha, maior economia do continente, depende da Rússia para garantir cerca de metade de sua necessidade energética.

Líderes do bloco europeu marcaram uma cúpula de emergência para quinta-feira para discutir os próximos passos. "É importante que continuemos unidos e determinados e definamos conjuntamente nossa abordagem e ações coletivas", disse o chefe do Conselho da UE, Charles Michel,.

Segundo ele, a pauta da reunião incluirá discutir "como protegera ordem internacional baseada em regras; como lidar com a Rússia, notadamente responsabilizando a Rússia por suas ações; como apoiar ainda mais a Ucrânia e seu povo".