KIEV, UCRÂNIA (FOLHAPRESS) - Cerca de 50 combatentes do Batalhão Azov, um grupo paramilitar neonazista que agora faz parte da Guarda Nacional da Ucrânia, reuniram-se nesta sexta-feira (25) para a cerimônia de cremação de dois combatentes que foram mortos em Moschum, a nordeste da grande Kiev e a 35 km do centro da capital.

Um deles, que adotou o nome de guerra Tur, retornou ao país após dois anos trabalhando numa empresa de proteção de animais ameaçados de extinção na África do Sul. "Protejo os animais porque não sabem fazer guerra. Faço guerra por eles", disse, enquanto aguardava a chegada dos corpos dos atingidos por um bombardeio. "Não estamos em 2014 [em referência à anexação da Crimeia pelos russos], esta é uma outra guerra -não temos mais combates cara a cara. Hoje os russos nos atacam com morteiros."

Ao anunciar o início de sua "operação militar especial", o presidente russo, Vladimir Putin, citou entre os motivos para desencadear a guerra a necessidade de "desnazificar" a Ucrânia. A existência do Batalhão Azov, criado há oito anos para lutar contra separatistas russos, confirma a presença de neonazistas no país, ainda que não sejam maioria no Exército nem façam parte do governo ucraniano.

Tur, 32, diz que, no início deste ano, não acreditava que a Rússia fosse de fato invadir a Ucrânia. "Putin sempre soube que os ucranianos são melhores soldados do que os russos. Um soldado ucraniano pode combater dez soldados russos e ainda ter grande chance de vencer." Otimista, ele é um entre um desconhecido número de combatentes na linha de frente, cifra que o governo mantém em segredo.

Seja qual for, esses soldados têm hoje em mãos equipamentos militares modernos fornecidos por países ocidentais para empreender não só estratégias de defesa, mas também de contra-ataque, o que vem possibilitando, até agora, em algumas cidades, que as forças ucranianas mantenham suas posições.

Informações do relatório dos serviços de inteligência do Reino Unido divulgado nesta sexta (25) dão conta de que as tropas da Ucrânia estão recapturando cidades a leste de Kiev, e as da Rússia, que tentavam tomar a capital, recuando. De acordo com Volodimir Borisenko, prefeito de Borispol, onde fica o principal aeroporto de Kiev, as forças da Ucrânia retomaram o controle de uma região entre a cidade e Brovari e avançaram, mas pararam para evitar o perigo que a operação representaria aos civis.

Em outra frente, a noroeste de Kiev, os embates ocorrem em meio a ruínas deixadas pelos combates das últimas semanas. Em Irpin, Bucha e Hostomel, tropas ucranianas tentam cercar as russas.

No cemitério de Kiev, enquanto o padre lia o sermão de despedida, o som de explosões de artilharia que parecia ser lançada de dentro da área urbana da capital, de algum lugar muito próximo de onde os dois corpos seriam cremados, era ouvido --e seus efeitos, sentidos em forma de abalos na terra.

Com pouco mais de dois metros de altura, forte sem ser musculoso, com cabelos e barba bem ruivos, o combatente ucraniano, além de ter adotado o nome Tur, segue também um visual inspirado em Thor, deus do trovão na mitologia nórdica, adorado por muitos outros membros da extrema direita ucraniana.

Uma das estratégias de recrutamento do Azov é buscar pessoas como Tur, fascinadas pelo mundo militar, mas que em algum momento foram impedidas de seguir a carreira por motivos físicos, sociais e até psicológicos. Muitas vezes, a convicção ideológica é forjada com o tempo nas zonas de combate.

Na porta da capela, os dois caixões, um aberto e outro lacrado, ficaram expostos a combatentes e familiares dos jovens mortos. Diante das urnas, cobertas com a bandeira amarela e azul da Ucrânia ornamentada com o emblema do Batalhão Azov, o "Wolfsangel", símbolo heráldico alemão inspirado nas armadilhas medievais de caça de lobos, cinco soldados se colocaram em linha e dispararam salvas de tiros depois de um comandante pronunciar as palavras "Slava Ukaini" -Glória à Ucrânia.

O "Wolfsangel" foi utilizado amplamente pelas SS nazistas, inclusive por sua segunda divisão de combate.