BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A RelataSoft, nova empresa contratada pelo PSDB, na terça-feira (23), para concluir a votação das prévias presidenciais teve seu aplicativo reprovado em testes feitos pelo partido durante a madrugada desta quarta-feira (24).

A votação, que está acirrada entre os governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), foi suspensa no domingo (21), depois que o aplicativo desenvolvido para o partido travou. Filiados e figuras históricas do PSDB não conseguiram votar pela ferramenta criada pela Faurgs (Fundação de Apoio à Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

Nesta quarta, a fundação afirmou em nota que "considera muito plausível a ocorrência de um ataque de hackers" ao app.

Agora, com a votação inconclusa, o partido iniciou testes, nesta quarta, com outras empresas, entre elas a Beevoter, que passou pela fase inicial de testagem, mas apresentou desempenho considerado aquém do desejado pela legenda em outras fases.

A empresa, contudo, não foi descartada. Testes feitos em outras duas companhias simultaneamente, ainda nesta quarta, também tiveram resultado insatisfatório. As campanhas pressionam pelo fim da eleição.

"Em relação à empresa de votação eletrônica para as prévias do PSDB [RelataSoft], os testes realizados durante toda noite e madrugada não foram totalmente satisfatórios. Em reuniões confirmadas já para o início desta manhã, o PSDB e campanhas já programam testes com nova empresa [Beevoter]. Outras entidades também já estão contatadas", afirmou o partido em nota na manhã desta quarta.

Segundo relatos, nos testes de estresse a empresa teria tido o sistema invadido em pouco mais de um minuto e meio.

A expectativa é que os resultados dos testes desta quarta sejam divulgados na manhã de quinta-feira (25). A partir daí, o novo cronograma de votação seria estabelecido.

Internamente, o partido ainda confia ser possível concluir a votação até domingo por meio da votação via aplicativo. Isso porque seria a melhor forma de contemplar os quase 40 mil filiados que não puderam registrar seus votos —se o processo ocorresse via urna eletrônica, a capilaridade seria menor.

Leite, que defendeu a retomada em 48 horas, o que já não foi possível, diz querer que a votação prossiga assim que houver um mínimo de segurança para isso. Doria e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio, terceiro concorrente, propunham a retomada da votação no domingo (28).

Na segunda-feira (22), o presidente do PSDB, Bruno Araújo, afirmou que o partido iria concluir o pleito até o próximo domingo.

Membros do PSDB fizeram questão de ressaltar que o app D.Vota, da RelataSoft, empresa de tecnologia eleitoral que faz parte do projeto Eleições do Futuro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), é uma boa ferramenta, mas que as exigências do partido e das três campanhas em relação à segurança são muito rigorosas.

Em entrevista na noite de terça, Araújo já havia informado que o partido avançara em negociações com empresas privadas para que novas ferramentas sejam testadas pelas campanhas.

"Estamos em conversas paralelas com uma segunda empresa, com uma terceira empresa, se essa [a RelataSoft] não passar por razão de avaliação [das campanhas], nós já temos mais duas empresas em processo de conversação com o partido", disse.

Uma vez escolhido o app, a ideia seria fatiar a votação em mais de um dia —separando a votação de políticos com mandato e, em seguida, de filiados.

A retomada das prévias por meio do aplicativo original, da Faurgs, já é descartada nos bastidores. Oficialmente, porém, o app da Faurgs ainda não foi dispensado.

Na nota divulgada nesta quarta, a fundação afirma que "garantidas as condições normais, o aplicativo está apto para sua utilização".

"A apuração da Faurgs apontou como causa mais provável um congestionamento de acessos incompatível com o número de eleitores cadastrados. Portanto, a Faurgs considera muito plausível a ocorrência de um ataque de hackers ao aplicativo, a partir das 8h15 —uma vez que desde às 7h o sistema funcionou perfeitamente. [...] A instabilidade, portanto, se deu por condições externas ao aplicativo", diz o texto.

Também por meio de nota, o partido afirmou que "cresce o alerta de que o PSDB pode ter sido vítima de um ataque de hackers".

"Independente de providências a serem tomadas pelo partido, cabe especialmente à fundação, como provedora da solução contratada (aplicativo, sistema de votação, infraestrutura e operação), realizar as devidas diligências para esclarecer o ocorrido", afirma a sigla.

O [app] da fundação é um processo paralelo. Se ele acontecer de se habilitar antes de tudo isso, ele pode ser usado. Mas nós não vamos ficar sentados, parados, esperando só essa solução", afirmou Araújo na terça, acrescentando que o PSDB devia "um respeitoso pedido de desculpas" aos filiados.

A ideia era que a empresa dissesse, até terça, se havia conseguido identificar o que provocou a falha no domingo e anunciasse a viabilidade de dar prosseguimento ao processo. No entanto, o diagnóstico só foi apresentado nesta quarta.

Segundo a Folha apurou com técnicos das campanhas que acompanham os testes, a dificuldade dos aplicativos alternativos está em duas questões.

A primeira é suportar o fluxo de acessos de todos os filiados durante as horas de votação. É preciso haver segurança: o aplicativo não pode ser derrubado e nem invadido.

A segunda é permitir a apuração dos votos sem que nem os técnicos responsáveis por isso possam saber quem votou em quem. A confidencialidade e o sigilo do voto são pontos chave para o PSDB.

Além disso, há o desafio de encontrar no mercado empresas que possam oferecer um aplicativo até domingo.

Por outro lado, a migração dos dados dos cadastros de votantes para os novos aplicativos é uma etapa feita sem maiores dificuldades.

Na terça, o ministro Benedito Gonçalves, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), determinou que o PSDB preste informações, no prazo de dez dias, sobre as falhas no app e a suspensão da votação. A decisão ocorreu no âmbito de um mandato de segurança apresentado por Gustavo Futagami, da Juventude do PSDB-MS.

"Considerando a repercussão do tema e, ainda, as notas veiculadas no sítio eletrônico do PSDB desde a data de ontem (23) noticiando a suspensão das prévias partidárias até que solucionadas as intercorrências tecnológicas quanto ao processo de votação, entendo prudente que o exame do pedido liminar ocorra após a legenda prestar as informações cabíveis", afirmou o magistrado.

Na ação, o advogado pediu ao TSE que suspenda a convenção nacional do partido até que sejam resolvidas as falhas que afetaram o processo interno de votação. Segundo Futagami, a instabilidade no aplicativo "fere direito líquido e certo do filiado de escolher, através do voto, o próximo presidenciável do PSDB".

O PSDB informou que solicitará nota técnica à Faurgs sobre as informações pedidas.

Na segunda-feira, após Araújo sinalizar a possibilidade de substituição do aplicativo da Faurgs, Leite afirmou que o processo das prévias estava perdendo credibilidade e que não havia concordado com a possibilidade de troca da ferramenta. Já nesta terça, passou a endossar testes em novos apps.​

No último domingo, o PSDB fez uma votação híbrida.

Num evento em Brasília, feito para anunciar o vencedor, mas que terminou de forma melancólica sem os resultados, puderam votar por meio de urnas eletrônicas os prefeitos e vices, deputados estaduais, deputados federais, senadores, governadores e vices e os ex-presidentes do partido.

Os filiados sem mandato e os vereadores deveriam votar pelo aplicativo, que não funcionou. A votação, que seria das 7h às 15h, foi ampliada para 18h e acabou suspensa. Outros tucanos do alto clero que não viajaram a Brasília e preferiram votar pela ferramenta online tampouco conseguiram votar.

No início do processo das prévias, o PSDB decidiu desenvolver do zero um aplicativo de votação próprio porque tinha a intenção de doá-lo aos demais partidos, incentivando prévias em outras legendas.

A ideia era alavancar o PSDB como o partido com expertise em votações internas, uma referência nacional numa iniciativa inovadora —imagem que já naufragou.

O contrato com a Faurgs, para criar o app, foi de cerca de R$ 1,3 milhão, sendo que aproximadamente metade do valor já foi paga. O partido não descarta renegociar o restante, alegando que a ferramenta não cumpriu seu propósito.

​A suspensão da votação agravou a divisão interna entre Doria e Leite, que voltaram a trocar acusações. Enquanto Doria e Virgílio propuseram retomar a votação no próximo domingo, a campanha de Leite quer a retomada mais imediata.

A avaliação de aliados de Leite é a de que o tempo corre contra o gaúcho, já que a capacidade de mobilização do PSDB de São Paulo é maior. Ou seja, Doria poderia virar mais votos até domingo.

Leite vem fazendo acusações a respeito de compra de votos e pressão do time de Doria sobre tucanos em São Paulo. O caso mais conhecido é a demissão do então secretário de Habitação da capital paulista, Orlando Faria, após declarar voto no gaúcho.

Ao todo, 44,7 mil tucanos (cerca de 3% do 1,3 milhão de filiados) se inscreveram para a votação indireta, em que cada grupo representa 25% da pontuação: filiados; prefeitos e vices; vereadores e deputados estaduais; deputados federais, senadores, governadores e vices, ex-presidentes do PSDB e o atual.

São Paulo, pela concentração de mandatários e filiados cadastrados, larga com 35% de peso nas prévias. Além do Rio Grande do Sul, Leite tem o apoio de estados chave no tucanato, como Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.

O saldo de domingo para o PSDB foi de vexame e mais tensão entre Doria e Leite. Líderes de partidos da chamada terceira via veem o PSDB em frangalhos —uma união da sigla em torno do vencedor das prévias parece cada vez mais distante.

Araújo informou que de 62% a 65% dos votos, considerando os pesos desiguais dos grupos de votação, foram dados no domingo, pela urna e aplicativo. Os resultados estão blindados e não serão apurados até que haja a votação complementar.