BRASÍLIA, DF (UOL/FOLHAPRESS) - De olho em pressionar o governo por reajustes salariais, cerca de 50 categorias de servidores públicos federais realizaram atos em Brasília nesta terça-feira (18).

No protesto marcado para as 10h em frente ao Banco Central, havia 300 manifestantes, segundo estimativas do BC. À tarde, das 14h às 16h, os servidores vão se reunir em frente ao Ministério da Economia.

Essas categorias que estão se mobilizando —e que reúnem aproximadamente 45 mil servidores— fazem parte da base eleitoral bolsonarista. Eles reivindicam aumento salarial de 20% a 28%, dependendo do período em que ficaram sem reajuste. Em carta endereçada ao ministro da Economia, Paulo Guedes, o Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado) afirma que 80% dos servidores acumulam perdas inflacionárias desde 2017. Os demais 20% acumulam perdas desde 2019.

Segundo Fabio Faiad, presidente do Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central), as reivindicações são: reajuste de 26,3%, além de reestruturação da carreira de analistas e técnicos do órgão; mudança da previdência no Banco Central; reconhecimento das atividades como sendo de Estado.

O que as demais categorias pedem:

Policiais federais e Depen: reestruturação das carreiras com reajuste salarial sem porcentual definido;

Judiciário: reajuste de 28%, que representa as perdas inflacionárias desde 2017.

Diplomatas e outras categorias: recomposição das perdas inflacionárias no governo Bolsonaro, de 19,99%, desde 2019;

Receita Federal: regulamentação do bônus de eficiência da categoria e recomposição dos cortes no Orçamento.

A pressão por aumentos se intensificou no fim de 2021, quando o governo Bolsonaro sinalizou que faria reajuste de salários de categorias específicas, como policiais federais, policiais rodoviários federais e agentes penais. A manobra do governo desagradou servidores da Receita, provocando a entrega de 1,3 mil cargos de chefia no órgão desde o último mês.

O presidente tem até esta sexta-feira (21) para sancionar a lei orçamentária deste ano, que destina R$ 1,7 bilhão para aumento do vencimento mensal de servidores. O movimento grevista reclama que o texto aprovado no Congresso não determina o uso exclusivo dessa verba para carreiras policiais e, portanto, os reajustes deveriam se estender a todos funcionários federais.

O consenso entre os adeptos do ato desta terça-feira, que reuniu desde auxiliares até integrantes da elite do setor público, é que o governo deve um aumento salarial linear com correção inflacionária de 28,1% a mais de 1 milhão de trabalhadores vinculados aos Três Poderes.

Integrantes da Receita, do BC e do Itamaraty cobram 20% de reposição salarial, equivalente a perdas inflacionárias desde 2019.

Enquanto o Palácio do Planalto não bate o martelo, diversas manifestações têm sido organizadas para o fim do mês, caso as demandas dos sindicalistas não sejam atendidas.

NEGOCIAÇÃO

"Esperamos que o governo abra uma mesa de negociação para receber os nossos pedidos e dar respostas efetivas de quanto poderia essa recomposição pode ser materializada", disse Rudinei Marques, presidente do Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado). A entidade representa 20% de todos os servidores federais.

A fim de conter o movimento grevista, o ministro da Economia Paulo Guedes tem tentado convencer Bolsonaro a recuar da promessa de privilegiar policiais no plano de reajustes, conforme relataram interlocutores do governo ao UOL.

Internamente, a avaliação é que uma paralisação geral implicaria em maiores danos para o governo do que o descumprimento da promessa que o presidente fez para sua base na PF.

"A sugestão é que nenhum servidor federal tenha reajuste salarial neste ano. Não dar nada a ninguém", disse um parlamentar governista. "O presidente tem a melhor das intenções, mas, se Bolsonaro ceder, sofrerá pressão para dar a todos os outros."

Contrariando Guedes, Bolsonaro havia prometido em novembro do ano passado aumento para todas as categorias em 2022, caso a PEC dos Precatórios, que abriu mais de R$ 90 bilhões em espaço orçamentário neste ano, fosse aprovada. Mas, cálculos da Instituição Fiscal Independente do Senado mostram que a cada 1 ponto porcentual de reajuste linear para os cerca de 600 mil servidores federais, o custo é, em média, de R$ 3,5 bilhões aos cofres públicos.

PROTESTO 'JUSTIFICADO'

Na avaliação do deputado Rogério Correia (PT-MG), coordenador da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público no Congresso Nacional, a manifestação desta terça em Brasília é justificada.

"A ideia, daqui para frente, é realizar uma greve dos servidores em defesa dos serviços públicos no Brasil", disse ao UOL.

"O governo prevê reajuste só para a categoria policial, deixando de fora os demais setores. Isso é absurdo porque os servidores estão há quase 5 anos sem reajuste. Existe muita variação salarial entre as diversas categorias e um processo de unificação precisa ser realizado para equilibrar o problema", destacou o petista.

DISCREPÂNCIA

Dados organizados pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostram que o vencimento médio de um servidor do Executivo federal é de R$ 3,9 mil —ou 65% do salário médio de um funcionário do Legislativo (R$ 6 mil). Esse valor, por sua vez, é metade do que ganha em média um servidor do Judiciário (R$ 12 mil).

O desequilíbrio também aparece entre os níveis da federação: servidores municipais têm salário médio de R$ 2,9 mil —ou 57% do vencimento de R$ 5 mil de um servidor estadual, que por sua vez equivale a 55% do salário médio de R$ 9,2 mil de um servidor federal.

MOMENTO NÃO É IDEAL

Para o líder do Cidadania na Câmara, Alex Manente (SP), este não é o melhor momento para atender às reivindicações de aumento salarial dos servidores públicos.

"Todas as categorias precisam de valorização. É descabido, no momento atual, em que o Brasil passa por diversas dificuldades, nós falarmos em reajuste total para o funcionalismo. Precisamos recuperar a economia, fazer com que ela tenha condições de gerar uma cadeia de desenvolvimento nacional e, a partir disso, dar os reajustes salariais", disse.

Entre as categorias privilegiadas por Bolsonaro em sua previsão de reajuste salarial em 2022, os delegados da PF tem remuneração inicial de R$ 23,6 mil, de acordo com dados do Painel Estatístico de Pessoal do Ministério da Economia. Agentes podem ganhar até R$ 18,6 mil. Policiais rodoviários têm salários que podem chegar a R$ 16,5 mil.

O salário de auditores da Receita, que em início de carreira ganham R$ 21 mil, pode chegar a R$ 30,3 mil. Também estão entre os que pedem aumento com correção inflacionárias ao governo outras categorias de elite, como funcionários do BC, que podem ganhar de R$ 7,2 mil a R$ 27, 3 mil; e diplomatas —que ganham de R$ 19, 1 mil a R$ 27, 3 mil. O último reajuste para essas classes foi em 2019.

EMENDAS

Uma correção salarial de 5% aos cerca de 600 mil funcionários federais provocaria custo anual permanente de R$ 15 bilhões aos cofres públicos, segundo cálculos da IFI. Se Bolsonaro resolver conceder os reajustes, cortes em outras áreas serão necessários.

Isso ocorre porque o governo não tem espaço orçamentário para elevar ainda mais as despesas neste ano.

Um dos alvos dos cortes poderia ser as emendas parlamentares, recursos liberados pelo governo federal, de olho em vencer resistências no Congresso e aprovar projetos.

Outra possibilidade seria cortar despesas relacionadas a promessas de Bolsonaro e que seriam acomodadas dentro dos recursos liberados pela PEC dos Precatórios.

Entre elas, está o auxílio a caminhoneiros e o vale-gás.

Além de ampliar o valor do Auxílio Brasil, o presidente quer pagar subsídio no valor do botijão de gás para famílias pobres e planeja conceder a chamada "bolsa diesel" a 750 mil caminhoneiros.

Portanto, quase todo esse dinheiro a ser liberado com a PEC destina-se a fortalecer a candidatura de Bolsonaro à reeleição.

Na avaliação do deputado feral professor Israel, o ato de olho é uma resposta às políticas do Planalto.

"O governo pega a verba da classe média, de servidores públicos, e aplica em emendas sem usar nenhum critério. É um governo que faz escolhas de investimentos incorretas. O presidente toma atitudes voluntariosas sem ouvir a própria equipe."