<p>BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O Senado aprovou nesta quinta-feira (29) projeto de lei que permite a quebra de patente de vacinas contra a Covid-19, de medicamentos e também de testes de diagnóstico.

</p><p>Após muitas discussões e polêmicas, a proposta foi aprovada por 55 votos a favor e 19 contrários. O projeto agora segue para a votação na Câmara dos Deputados.

</p><p>A quebra de patentes provocou grande divisão entre os senadores nas últimas semanas. A proposta chegou a constar na pauta de votação do Senado no início de abril, mas acabou retirada por pressão do governo federal.

</p><p>O texto inicial, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), previa a suspensão por parte do Brasil de cumprir obrigações assumidas em acordo internacional sobre direito do autor, desenhos industriais, patentes e proteção de informação confidencial --o chamado Trips (da sigla em inglês para Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio) -- para combater a pandemia do novo coronavírus.

</p><p>O relator do texto, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), no entanto, argumentou que seria inviável para o país deixar de cumprir acordos internacionais apenas por meio de uma lei ordinária. Por isso apresentou um projeto substitutivo, no qual afirma respeitar o Trips, mas abre a possibilidade para análise caso a caso.

</p><p>O projeto substitutivo de Trad, aprovado pelos senadores, altera a Lei de Propriedade Industrial para conter dispositivos e conceder licenças compulsórias para a exploração de patentes de invenção ou de modelos e utilidade que sejam necessários para enfrentar emergências de saúde pública.

</p><p>A proposta, no entanto, restringe os limites das quebras de patentes e suspensão de licenças. O texto determina que, assim que for declarada emergência nacional ou estado de calamidade pública, o governo federal deve publicar uma lista de patentes ou pedidos de patentes que considera fundamentais para atender suas necessidades em até 30 dias.

</p><p>Se as empresas detentoras dessas patentes não repassarem sua tecnologia, o texto prevê a licença compulsória de maneira tácita, ou seja, a quebra das patentes. A proposta, portanto, deixa a decisão final para o Executivo.

</p><p>O texto também específica que, na lista que será elaborada, estarão obrigatoriamente as patentes ou pedidos de patentes associados às vacinas contra a Covid-19 e suas variantes, os ingredientes ativos e insumos, além do medicamento Remdesivir, já aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

</p><p>"Na prática, seria uma lista de patentes que poderiam vir a ser licenciadas de maneira compulsória. A lista deverá informar os números das patentes ou pedidos que poderão ser objeto de licença compulsória, os titulares das patentes e especificar os objetivos para os quais será autorizado cada licenciamento compulsório", afirma o relatório de Nelsinho Trad.

</p><p>"Na segunda etapa, seriam efetivamente concedidas licenças apenas de patentes da lista de prioridade para as quais surgissem propostas efetivas e baseadas em condições objetivas de mercado, capacitação tecnológica e de investimentos para sua produção no País", completa.

</p><p>O texto afirma que a remuneração dos responsáveis pela patente ou do pedido de patente objeto de licença compulsória será fixada em 1,5% sobre o preço líquido de venda do produto a ela associado até que seu valor venha a ser efetivamente estabelecido.

</p><p>O texto de Trad prevê negociação entre as partes para evitar a quebra efetiva das patentes. O relator argumenta que poderão ser excluídas da lista alguns itens caso o Executivo considere que seus titulares assumiram compromissos objetivos de atender às necessidades de emergência nacional.

</p><p>Alguns governistas criticaram a aprovação do projeto de lei, argumentando que ele pode trazer futuros problemas ao país.

</p><p>"Nós hoje no mundo temos um sistema internacional que regula e que pode fazer com que países que desrespeitem essas regras sejam punidos. E isso pode acontecer com o Brasil", afirmou o senador Carlos Viana (PSD-MG), vice-líder do governo.

</p><p>Viana falou que laboratórios que estão negociando venda de vacinas ao Brasil podem recuar por conta da decisão de quebrar patentes.

</p><p>"Nós podemos perder 200 milhões de doses nos próximos meses, é um projeto que vem em um momento em que nós já estamos aqui no Brasil com duas vacinas praticamente desenvolvidas, uma em São Paulo e outra na nossa Universidade Federal de Minas Gerais. O caminho para a vitória, para a prosperidade não passa por uma questão que parece simples mas não é. Patentes são acordos internacionais de que o Brasil é signatário", disse.

</p><p>Elizabeth de Carvalhaes, presidente executiva da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), que representa 51 laboratórios, entre eles a Pfizer, Gilead e AstraZeneca, já disse ao jornal Folha de S.Paulo que se o Brasil fizer licenciamento compulsório, grandes laboratórios como Janssen, Pfizer e AstraZeneca podem preferir fornecer para outros mercados. "Não é retaliação. A demanda é muito maior que a oferta, e eles podem achar mais vantajoso, do ponto de vista econômico, vender para países que não quebram patente."

</p><p>Senadores favoráveis à quebra de patentes, por outro lado, afirmaram que se trata de uma época excepcional que exige medidas extraordinárias.

</p><p>"Em tempos normais, eu aplaudiria o senador Carlos Viana. Eu também sou a favor do livre mercado, da livre concorrência, mas nós não estamos em tempos normais. Nós não estamos sequer em estado de calamidade pública. Nós estamos em guerra, guerra civil não declarada contra um vírus mortal, que ceifou a vida de 400 mil almas brasileiras", afirmou a senadora Simone Tebet (MDB-MS), líder da bancada feminina.

</p><p>O líder da minoria, senador Jean Paul Prates (PT-RN), disse que mais de 80 nações do mundo são favoráveis à quebra temporária de patentes para assegurar a disponibilidade de vacinas contra a Covid-19 em larga escala.

</p><p>"Toda ação que contribua para acelerar a imunização, em âmbito mundial, é imperiosa. Entendemos as preocupações financeiras das empresas, mas as margens de lucro não podem ser mais importantes do que salvar vidas. É importante lembrar que mesmo caso seja necessário o licenciamento compulsório, ele é remunerado", afirmou.</p>