SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Rússia enfrenta nesta quarta-feira (16) a primeira rodada de pagamentos de títulos em meio à ameaça de default, com seus ativos no exterior congelados por sanções internacionais.

O país deve reembolsar US$ 117 milhões (R$ 600 milhões) de dois títulos em euros, o primeiro pagamento de uma série prevista para março e abril.

Mas atualmente, em represália pela operação militar russa na Ucrânia, quase US$ 300 bilhões (R$ 1,5 trilhão) das reservas da Rússia estão congelados em bancos ocidentais.

Na segunda-feira (14), o ministério das Finanças anunciou que emitiu uma "ordem de pagamento ao banco correspondente para pagar o valor de US$ 117,2 milhões".

Um pouco antes, o ministro russo das Finanças, Anton Siluanov, havia ameaçado pagar as dívidas em rublos.

"As declarações de que a Rússia não pode cumprir suas obrigações em relação a sua dívida pública não correspondem à realidade", disse o ministro das Finanças na segunda-feira (14).

"O congelamento de contas em moeda estrangeira do Banco da Rússia e do governo pode ser considerado como o desejo de países estrangeiros de provocar um default artificial", acrescentou.

Se a Rússia cumprir a ameaça de pagar em rublos, começará um período de 30 dias após o qual o país será declarado inadimplente em sua dívida externa, pela primeira vez desde 1918, quando Lenin não cumpriu as obrigações do país.

Porém, há alguma ambiguidade a respeito da primeira data de vencimento de 16 de março, pois a situação é inédita.

Os analistas do JPMorgan consideram que os pagamentos devem ser possíveis.

O Tesouro dos Estados Unidos especifica que o pagamento de juros pode ser feito até 25 de maio de 2022 no caso dos americanos, em títulos emitidos antes de 1 de março de 2022 pelo Banco Central da Rússia, um fundo soberano russo ou pelo ministério das Finanças.

Após a data, precisarão de uma autorização para continuar recebendo estes pagamentos.

As sanções ocidentais paralisaram parte do sistema bancário e financeiro russo e provocaram uma forte desvalorização do rublo.

Um default corta automaticamente o acesso de um Estado aos mercados financeiros e coloca em risco sua rentabilidade durante anos.

Entenda o que acontece se a Rússia não conseguir pagar seus credores Quanto a Rússia deve em títulos de moeda forte? A Rússia tem 15 títulos internacionais com um valor de cerca de US$ 40 bilhões (R$ 205 bilhões) em circulação, cerca de metade deles detidos por investidores internacionais.

Os títulos emitidos depois que a Rússia foi sancionada pela anexação da Crimeia, em 2014, contêm uma provisão que permite pagamentos em moeda alternativa. Para títulos listados após 2018, o rublo é listado como uma opção de moeda alternativa.

Os títulos vinculados ao pagamento de cupom desta quarta-feira (16) foram listados em 2013 e devem ser pagos em dólares, com o Citi como agente pagador.

Moscou pagará?

Um decreto presidencial de 5 de março anunciou que os devedores russos têm o direito de pagar os credores estrangeiros em rublos.

Mas o Ministério das Finanças disse em um comunicado na segunda-feira (14) que havia aprovado um procedimento temporário para fazer pagamentos em moeda estrangeira e que a Rússia cumpriria as obrigações "em tempo hábil e na íntegra".

Os investidores conseguem receber o dinheiro? O Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros dos EUA emitiu uma licença geral em 2 de março que autoriza transações para pessoas dos EUA em relação ao "recebimento de juros, dividendos ou pagamentos de vencimentos em conexão com dívida ou patrimônio" emitidos pelo Ministério das Finanças da Rússia, seu banco central ou seu Tesouro. No entanto, isso se esgota em 25 de maio.

A Rússia deve o pagamento de quase 2 bilhões (R$ 10 bilhões) em seus títulos soberanos externos após esse prazo e até o final do ano.

Quais seriam as consequências de um calote?

Países inadimplentes não têm acesso aos mercados de capitais internacionais, embora, dadas as restrições atuais, a Rússia esteja excluída de qualquer maneira.

No entanto, um calote pode ter consequências amplas.

Isso poderia desencadear o pagamento de CDS (Credit Default Swaps), uma proteção contra calotes que os investidores contratam para esse tipo de situação. O banco de investimentos JPMorgan estima que há cerca de US$ 6 bilhões (R$ 30 bilhões) em CDS pendentes que precisariam ser pagos.

Além disso, não são apenas os gestores de ativos internacionais que estão expostos à dívida externa da Rússia. "Muitos investidores russos compraram esse papel por meio de suas contas em bancos ocidentais", disse Evgeny Suvorov, economista do CentroCredit Bank.