BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Rosa Weber negou, nesta quarta-feira (30), pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, para arquivar inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) no caso do processo de compra da vacina indiana Covaxin.

Nesse inquérito, o presidente é investigado sob suspeita de prevaricação.

O caso Covaxin se tornou centro da CPI da Covid no Senado, inflamou protestos pelo impeachment do presidente e expôs uma série de contradições no discurso bolsonarista sobre vacinas e combate à corrupção.

O PGR havia seguido o entendimento da Polícia Federal, que em 31 de janeiro já havia dito que não foi identificado crime, porque não havia dever funcional do presidente da República de "comunicar eventuais irregularidades de que tenha tido conhecimento" a órgão de investigação.

De acordo com o delegado William Tito Schuman Marinho, "juridicamente, não é dever funcional (leia-se: legal), decorrente de regra de competência do cargo, a prática de ato de ofício de comunicação de irregularidades pelo presidente da República". Aras concordou com a tese da PF.

A ministra Rosa Weber discordou da tese e disse que "é perfeitamente possível extrair, do próprio ordenamento jurídico-constitucional, competência administrativa vinculada a ser exercida pelo Chefe de Governo".

"Embora a gestão superior da administração envolva, de fato, tal como defende a Procuradoria-Geral da República, inúmeras decisões discricionárias, não há espaço para a inércia ou a liberdade de 'não agir' quando em pauta o exercício do controle da legalidade de atos administrativos -ou, mais especificamente, do poder-dever de anular atos contrários ao ordenamento jurídico- e do poder disciplinar em face de desvios funcionais", afirmou.

"Ao ser diretamente notificado sobre a prática de crimes funcionais (consumados ou em andamento) nas dependências da administração federal direta, ao Presidente da República não assiste a prerrogativa da inércia nem o direito à letargia", acrescentou Rosa.

Nesses casos, o presidente deve "acionar os mecanismos de controle interno legalmente previstos, a fim de buscar interromper a ação criminosa -ou, se já consumada, refrear a propagação de seus efeitos".

"Esses são, portanto, os atos de ofício reclamados, no contexto acima descrito, do Chefe de Governo. Retardá-los ou omiti-los, injustificadamente, 'para satisfazer interesse ou sentimento pessoal', constitui, sim, conduta apta a preencher o suporte fático da cláusula de incriminação prevista no art. 319 do CP", afirmou.

Não é praxe que um ministro do Supremo negue pedido de arquivamento de um inquérito pelo procurador-geral da República. Rosa afirma que essa hipótese é possível porque houve conduta atípica nesse caso, com "verdadeiro julgamento antecipado do mérito da controvérsia criminal, atividade inequivocamente inserida nas atribuições do Estado-juiz".

A suspeita de prevaricação foi atribuída ao chefe do Executivo pelo deputado Luis Miranda (União Brasil-DF) e o seu irmão, o servidor Luis Ricardo Miranda.

Em depoimento, o deputado afirmou ter alertado o presidente sobre supostas irregularidades na compra da Covaxin, negociada com a intermediação da Precisa Medicamentos.

O encontro, segundo o congressista, teria ocorrido no dia 20 de março. A conversa com o presidente foi presencial. Segundo relato de Miranda, Bolsonaro teria ligado o líder do governo, deputado Ricardo Barros (PP-PR), às supostas irregularidades.

Luis Ricardo, que era chefe da divisão de importação da Saúde, relatou ao MPF (Ministério Público Federal) ter sofrido pressão incomum para assinar o contrato para a compra da vacina. Esse depoimento foi revelado pela Folha de S.Paulo.