GUARULHOS, SP (FOLHAPRESS) - Os jornalistas Maria Ressa e Dmitri Muratov, ganhadores do Nobel da Paz de 2021, receberam o prêmio em Oslo, capital norueguesa, nesta sexta (10). Além de defenderem a liberdade de imprensa, tema que deu o tom da premiação, os dois aproveitaram para levantar bandeiras que defendem em seus países de origem.

Ressa, repórter filipino-americana, reiterou o apelo à reforma das plataformas de mídias sociais. A editora do site Rappler, de jornalismo investigativo, é uma das principais vozes críticas ao ambiente de desinformação e violência contra profissionais nas redes.

"Nossa maior necessidade é combater esse ódio e essa violência, essa lama tóxica que percorre nosso ecossistema de informações", disse. "O que acontece nas redes sociais não fica nas redes sociais; violência online é também violência no mundo real", seguiu.

Ela, que chegou a ser presa pelo governo de Rodrigo Duterte com base em uma controversa legislação, lembrou os colegas mortos ou encarcerados como tentativa de silenciar a liberdade de imprensa.

Levantamento publicado nesta quinta (9) mostrou que 293 jornalistas estão presos ao redor do mundo, um número recorde, enquanto 24 foram assassinados neste ano em razão da profissão.

Como é perseguida com outros processos judiciais nas Filipinas, Ressa precisou de uma autorização da Justiça para que pudesse viajar a Oslo. Em artigo publicado no The New York Times, ela afirma que o governo filipino entrou com processos contra ela 10 vezes. "Desde que o presidente Rodrigo Duterte assumiu o poder, 22 jornalistas foram mortos, o último esta semana", afirma a editora.

Já o russo Dmitri Muratov disse que autoridades russas estão promovendo ativamente uma ideia de guerra no país e que a invasão da Ucrânia se tornou uma possibilidade real.

Ele criticou o tom de violência que domina o Kremlin e disse que os políticos que evitam o derramamento de sangue têm sido vistos como fracos, enquanto aqueles que ameaçam o mundo com uma guerra são, equivocadamente, vistos como patriotas.

"Na cabeça de alguns políticos malucos, uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia deixou de ser algo impossível", disse, referindo-se à possibilidade da invasão russa do país vizinho, que vem sendo anunciada pela inteligência americana e ucraniana.

Muratov também afirmou que o jornalismo na Rússia passa por um "vale escuro", com mais de uma centena de jornalistas, meios de comunicação, defensores dos direitos humanos e ONGs rotuladas como "agentes estrangeiros", designação usada na Guerra Fria para classificar dissidentes e hoje dada a críticos do governo Putin.

"Na Rússia, isso significa 'inimigos do povo'", afirmou o jornalista, cofundador e editor-chefe do Novaia Gazeta (novo jornal, em russo), um dos principais jornais de oposição ao governo Putin. Ele dedicou o prêmio a todos os jornalistas investigativos e a seus colegas de trabalho que foram assassinados —entre eles está Anna Politkovskaia, morta a tiros no dia do aniversário de Putin em 2006.

O prêmio de Ressa e Muratov é o primeiro para jornalistas desde que o alemão Carl von Ossietzky o recebeu, em 1935, por revelar o programa secreto de rearmamento de seu país no pós-guerra. Como lembrou Maria Ressa, porém, o alemão não chegou a colocar as mãos no prêmio, uma vez que morreu em um campo de concentração nazista.

"Ao dar esse prêmio aos jornalistas hoje, o comitê do Nobel sinaliza um momento histórico, um ponto existencial para a democracia", disse.

Os ganhadores do Nobel recebem um certificado, uma medalha de ouro e um cheque de 10 milhões de coroas suecas (R$ 6,2 milhões).​