SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Governo de São Paulo anuncia nesta quarta-feira (30) a implantação de novo sistema operacional da Polícia Civil, o Polícia Inteligente, que reestrutura os registros de ocorrência e métodos de investigação criminal no estado.

São ao menos cinco mudanças importantes (veja abaixo), entre as quais a adoção de plataforma com inteligência artificial capaz de analisar boletins de ocorrência e bancos de dados (imagens, digitais e DNA) e detectar, por exemplo, a existência de um possível criminoso em série.

O novo sistema, oficialmente chamado de SPJ (Sistema de Polícia Judiciária), teve um investimento superior a R$ 60 milhões. Ele está sendo anunciado nesta tarde no Palácio da Polícia, na região central capital paulista, por integrantes da cúpula da Segurança Pública.

Um dos reflexos do uso dessa plataforma inteligente será o fim de álbuns de fotos de suspeitos, constante alvo de críticas de especialistas por ser fonte de inúmeros casos de inocentes presos.

Quando a vítima for ao distrito policial e descrever as características do crime e do criminoso, o sistema indicará ao investigador um grupo de pessoas com característica física e modo de atuação semelhantes.

A indicação dos suspeitos, segundo a polícia, leva em conta princípios de criminologia incorporados ao sistema. Por exemplo: 80% dos autores praticam delitos a até três quilômetros de onde moram.

Os apontamentos da plataforma nortearão os rumos da investigação. Os policiais trabalharão para confirmar ou descartar o envolvimento daquele suspeito, mas não usarão esses apontamentos como prova. Será o início de uma investigação, não o fim dela, segundo a Polícia Civil.

A ferramenta é capaz, ainda, de realizar pesquisas por meio de fotos ou imagens captadas por câmeras de segurança. Atualmente, isso é feito de maneira pontual e passará a ser sistematizado em todo o estado. O banco de dados da polícia conta com mais de 60 milhões de imagens digitais.

Outra mudança importante é a implantação do boletim de ocorrência único para as policiais Civil e Militar. Essa unificação tende a acabar com o retrabalho entre as instituições. Um registro feito pelo PM na rua será o mesmo usado pelo delegado no distrito, algo que não acontece atualmente.

Na maioria dos casos, os PMs não precisarão mais conduzir as pessoas envolvidas em uma ocorrência para o distrito policial. Após a inserção das informações no sistema da própria PM, os dados são encaminhados à Delegacia Eletrônica e, na sequência, ao distrito policial responsável pela investigação do caso.

Os policiais militares informarão aos envolvidos na ocorrência que elas receberão posteriormente, por email, cópia do boletim e eventuais intimações para mais esclarecimentos da ocorrência. As vítimas também receberão, em futuro breve, segundo a polícia, agendamento de exames periciais.

A Polícia Civil estima que só na capital a PM apresente cerca de 300 mil ocorrências nos distritos policiais anualmente. Com a mudança, a expectativa é que esse número caia para cerca de 20 mil.

Até nas situações mais graves, em que os envolvidos precisarem ser levados ao distrito, o BO único também reduzirá o retrabalho da Polícia Civil. As versões tomadas pelos PMs na rua já estarão disponíveis para o delegado no sistema quando as partes forem apresentadas a ele.

Essa medida também tende a desafogar o fluxo de pessoas presentes no distrito policial que, muitas vezes, esperam por horas pelo registro de um boletim de ocorrência.

O boletim único entre polícias também será único em outro aspecto. Atualmente, quando uma pessoa registra um boletim de ocorrência e precisa complementá-lo posteriormente, um boletim complementar é registrado pelos policiais. Um adendo com número diferente.

Assim, o boletim principal pode gerar vários boletins complementares, com vários números e vários históricos adicionais.

O novo sistema da polícia vai criar um único arquivo de ocorrência. As complementações e alterações posteriores serão feitas no próprio documento e, assim, mais fácil de controle e produção de estatísticas.

De acordo com a polícia, com esse "boletim versionado", a Segurança Pública paulista será capaz de produzir estatísticas de esclarecimento de casos, o que não existe atualmente. Com esses números, será possível identificar quais unidades esclareceram menos e mais casos.

De acordo com o sociólogo Luis Flavio Sapori, há uma série de vantagens no BO único. "Ele cria um procedimento de integração entre as polícias, permitindo a agilidade na avaliação dos crimes registrados e posterior instauração do inquérito policial", disse o professor, um dos idealizadores de serviço semelhante implantado em Minas Gerais em 2004.

"Além disso, unifica o registro das estatísticas criminais, evitando duplicidade de dados. Estatísticas criminais consistentes são imprescindíveis ao planejamento operacional das polícias", disse o pesquisador disse desconhecer outro estado que tenha BO unificado.

A Polícia Civil também vai implantar nos próximos meses um sistema de câmeras nos distritos policiais para registrar em áudio e vídeo o depoimento de partes e, também, as circunstâncias em que esses trabalhos foram feitos na unidade policial.

Uma câmera estará focada no depoente e, outra, com ângulo de 180 graus, nas pessoas presentes na sala. Isso evitará eventuais abusos dos policiais e alegações de abusos por parte de suspeitos.

Os depoimentos gravados, aliados ao boletim único com a PM, reduzirão em mais da metade o tempo gasto na elaboração de flagrantes, estimam os policiais civis envolvidos na implantação do sistema.

Segundo eles, hoje, o tempo médio de um flagrante em São Paulo é de cerca de duas horas e meia. Com a medida, esse tempo deve cair para uma hora.

Outra ampliação da tecnologia no trabalho da polícia será na Delegacia Da Mulher Online e, também, no CPJ (Centros de Polícia Judiciária) que estão sendo criadas agora. Eles funcionarão em 44 unidades espalhadas pelo estado 24 horas por dia e, até o final do ano, devem ser 165 unidades.

Nessas unidades, por exemplo, uma vítima de violência doméstica será encaminhada para uma sala especial e atendida virtualmente por uma delegada, que poderá solicitar imediatamente à Justiça medidas de proteção. Não precisará esperar a abertura da DDM física em horário comercial.

Atualmente, o estado tem 138 delegacias da mulher, mas apenas 11 delas abrem 24 horas por dia, em cinco municípios. As 44 unidades atenderão o mesmo número de cidades da Grande SP e interior.

As CPJ funcionarão em esquema parecido, mas, para crimes comuns. Envolvidos em ocorrência em cidades sem delegados, serão atendidos virtualmente pela autoridade policial em centrais específicas.

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POLÍCIA INTELIGENTE

Segurança Pública de São Paulo implanta novo sistema operacional que reestrutura registros de ocorrências e métodos de investigação

DESTAQUE

Entre outros benefícios, mudanças devem reduzir para menos da metade tempo gasto pela polícia para registrar um flagrante

Atualmente, tempo médio é duas horas e meia

Média de tempo de flagrante deve cair para uma hora

Principais mudanças

BO ÚNICO

O que é:

As polícias Militar e Civil de São Paulo terão boletim de ocorrência único

Como funcionará:

Os registros feitos por PMs durante atendimento de ocorrência entrarão diretamente no sistema da Delegacia Eletrônica

Partes serão dispensadas ainda no local e solicitantes receberão cópia da ocorrência e intimações por email

Nos casos mais graves, com necessidade deslocamento de partes às delegacias, delegado continuará boletim iniciado pelo PM

Como é hoje: PM registra boletim de ocorrência próprio e, em parte das ocorrências, leva partes para o distrito onde Polícia Civil registra novo BO

O que melhora?

- Acaba com retrabalho entre as polícias

- Evita deslocamento de partes ao distrito sem necessidade

- reduz gastos operacionais (combustível, material e força policial)

- agiliza atendimento de registros no distrito

- libera mais PMs para patrulhamento

Situação: Sistema em teste nas zonas leste e sul da capital. Previsão de implantação em todo o estado até o final do ano

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

O que é:

Sistema cruza informações entre registros em todo o estado para identificar comportamento padrões e provas recolhidas nas investigações

Como funcionará:

Detalhes da forma de atuação, características do suspeito, imagens, impressões digitais e até perfil de DNA serão confrontados automaticamente pelo sistema entre todos boletins e inquéritos

Como é hoje: depende da memória do investigador ou sorte

O que melhora?

Eleva número de resolução de casos e identifica criminosos em série

Situação: começa a funcionar agora

SISTEMA DE CÂMERAS

O que é:

Depoimentos em distrito serão gravados em áudio e vídeo

Como funcionará:

Todos os depoimentos nas unidades policiais serão registrados em áudio e vídeo. Depoimentos serão transcritos automaticamente para em documento para compor inquérito policial

Destaque: Salas também terão câmeras com ângulos de 180 graus para registar quais pessoas estão presentes nos depoimentos. Isso evita alegações de eventual constrangimento de testemunhas ou suspeitos

Como é hoje: Depoimentos não são gravados, a não ser em casos isolados por inciativa isolada do delegado

O que melhora?

Aumenta a qualidade das provas, evita ações inadequadas de policiais, reduz as alegações de coação por parte de suspeitos e produz material para estudo acadêmico de casos emblemáticos

Situação: Aguarda finalização de compra para implantação das câmeras. Expectativa de começar a funcionar ainda neste semestre

ÍNDICE DE ESCLARECIMENTO

O que é:

Banco de dados da polícia produzirá informações do trabalho da polícia

Como funcionará:

Boletim de ocorrência em SP será único e, também, "versionado". Todas as informações ficarão em único arquivo (sem adendos) e casos solucionados entrarão para estatísticas automaticamente

Inteligência artificial ajudará na análise de casos solucionados com prisão de suspeito de crimes em série

Como é hoje: Não há uma estatística oficial sobre índice de esclarecimento por unidade policial e muitos casos solucionados ficam em aberto eternamente

O que melhora? Transparência do trabalho policial e ajuda gestores e identificar quais equipes têm baixo índice de solução de casos

Situação: sistema em implantação. Entrará em funcionamento total quando BO único estiver implantado em todas as unidades policiais

ATENDIMENTOS A DISTÂNCIA

O que é:

Polícia abre 44 centros de atendimento 24 horas para atendimento de ocorrências de violência doméstica (DDMs) e de crimes de forma geral

Como funcionará:

Vítimas de violência doméstica poderão procurar centros de atendimento espalhados pelo estado e que funcionarão 24 horas por dia. Unidades terão salas especiais para que vítima fale com equipe de plantão online. Isso também vale para crimes comuns em cidades sem delegado

Como é hoje: serviço não existe

O que melhora?

Vítimas de violência doméstica poderão ter seus casos solucionados imediatamente, como obtenção de medidas protetivas, solicitadas por delegada de plantão 24 horas

Envolvidos em casos graves em cidades sem delegado presente serão atendidos pela internet por delegado de plantão online

Situação: passa a funcionar agora com 44 unidades. Até final do ano, serão 165 centros de atendimento

Fonte: Polícia Civil de São Paulo