SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Produtores culturais e captadores de recursos estão assustados com a demora da Prefeitura de São Paulo em lançar o edital deste ano do Promac, um mecanismo público de fomento às artes conhecido como a Lei Rouanet local.

O atraso, dizem os produtores e também uma fonte próxima da administração que prefere não se identificar, se deve a um decreto a ser publicado em breve que deve alterar radicalmente o mecanismo, visto como inovador pelo mercado por promover a descentralização de atividades culturais, atendendo bairros periféricos da cidade.

Caçula das leis de incentivo, o Promac permite a isenção de 20% do ISS ou do IPTU de empresas que investirem em projetos em bairros com menor escolaridade e em geral mais carentes, como Marsilac, Parelheiros, São Mateus e Brasilândia. A dedução do imposto é menor se a atividade ocorrer em regiões centrais abastadas, como Bela Vista, Consolação e Jardim Paulista, justamente áreas providas de mais opções culturais.

A ideia da territorialização, incluída no edital em 2019, era fazer com que coletivos periféricos já atuantes pudessem entrar no programa com maior facilidade, já que o desconto no imposto das empresas que incentivam nestas áreas é maior. Em geral, projetos em regiões centrais ou estrelados por grandes nomes são mais atrativos para os patrocinadores, que preferem associar seus logotipos a um show de um artista consagrado no centro, por exemplo, do que a um mural de grafite na zona leste, segundo a fonte próxima da administração municipal.

O decreto em análise, dizem, vai desvincular o projeto do local de sua execução, alterando o fundamento do programa e possivelmente tirando verba da cultura destinada à periferia. Esta mudança é contrária ao discurso da secretária de Cultura, Aline Torres, que assumiu em setembro do ano passado afirmando querer descentralizar as artes e garantir que equipamentos culturais em bairros como Brasilândia, Jaraguá e Perus tenham programação o tempo todo.

Questionada, a prefeitura afirma que não há atraso na publicação do edital, pois ele é lançado no primeiro quadrimestre do ano, sem um mês definido. Em 2018 foi publicado em abril; em 2020, em janeiro, e em 2021, em março. Não houve edital em 2019. O deste ano ainda está sem data --outro fator gerador de ansiedade no mercado--, mas, segundo a Secretaria Municipal de Cultura, mais informações serão divulgadas em breve.

Questionada sobre as possíveis mudanças no teor do edital, a Secretaria Municipal de Cultura afirma que vai anunciar em breve as alterações e que não comentará o conteúdo do decreto previamente. Ressalta que qualquer mudança "será feita de acordo com as prioridades desta gestão, que tem como norte a descentralização da cultura e a valorização da periferia e de seus artistas".

Desde que foi lançado, o Promac cresceu. A verba destinada aos projetos passou de R$ 15 milhões para R$ 30 milhões, cerca de 4% do orçamento da pasta da Cultura neste ano. O número de propostas apresentadas pulou de 500 em 2019 para 947 em 2020, cifra quase igual à de 2021 --911. Cada projeto pode captar até R$ 600 mil, com exceção de planos anuais de atividades e restauro e conservação de bens protegidos, iniciativas nas quais o teto é de R$ 1 milhão.

A não publicação até o momento do chamamento de 2022 é um tanto dramática num cenário em que o setor cultural começa a se recuperar do baque da pandemia e sofre com o desmonte da Rouanet promovido pelo governo federal, que limitou em R$ 3.000 os cachês da maioria dos artistas e faz os projetos tramitarem a passos de tartaruga.

De acordo com a produtora Larissa Biasoli, que inscreve projetos no Promac desde o seu começo, quanto mais tempo ele leva para ser publicado menos dinheiro a cultura recebe. Isso porque a lei se baseia na dedução do ISS, um imposto municipal sobre serviços pago mensalmente por empresas que não pode ser descontado retroativamente.

Além disso, a indefinição penaliza projetos aprovados, que esperam o lançamento do edital para andarem. É o caso, por exemplo, da proposta "Aprenda com uma Avó SP" --que prevê o letramento digital de pessoas da terceira idade em bairros periféricos--, e de um outro projeto de oficinas de moda em Paraisópolis com a duração de um ano, culminando num desfile final. Este, ao custo de R$ 524 mil, já conseguiu patrocinador.

De acordo com a prefeitura, "quanto aos projetos citados, é normal que, no início de ano, exista uma certa quantidade de projetos aguardando a abertura do edital e a abertura do período de captação".