BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O STJ (Superior Tribunal de Justiça) interrompeu pela segunda vez o julgamento que vai determinar se as operadoras de planos de saúde estão obrigadas a bancar procedimentos não incluídos na lista de cobertura estipulada pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).

Suspenso em setembro do ano passado, o debate foi retomado nesta quarta-feira (23), mas um novo pedido de vista (mais tempo para estudar) voltou a paralisá-lo. O placar está empatado em um voto a um. Não há data prevista para o reinício do julgamento.

A análise ocorre na 2ª Seção, composta por dez ministros. O pedido de vista foi feito pelo ministro Villas Bôas Cueva, convertido posteriormente em coletivo.

De forte apelo popular, o tema atraiu manifestantes à sede do STJ. Mais de 100 pessoas se enfileiraram em frente ao alambrado que cerca o tribunal para defender que os planos de saúde arquem com mais despesas.

A lista da ANS estabelece a cobertura assistencial a ser garantida pelos planos privados. É chamada de Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde. A primeira versão foi editada em 1998 e, desde então, sofreu atualizações para incorporar novas tecnologias em saúde.

A corte superior avalia se a lista da agência é exemplificativa ou taxativa. Por taxativa, entende-se que ela é restrita, sem margem interpretativa.

Se exemplificativa, a lista funciona como referência mínima e outras obrigações podem ser acrescidas para atender as necessidades dos pacientes. É um conceito mais favorável aos consumidores.

Uma decisão colegiada do mesmo STJ de 2019, porém, reviu tal posicionamento, motivando, agora, um debate mais amplo que é travado pela corte.

Relator do caso, o ministro Luís Felipe Salomão entende que a lista deve ser taxativa, mas considerou a possibilidade de hipóteses excepcionais. Frisou que o rol taxativo é adotado em diversos países, como Estados Unidos, Japão e Inglaterra.

O magistrado afirmou que esse modelo protege os beneficiários dos planos de aumentos excessivos uma vez que a segurança jurídica dada às operadoras evita o repasse de custos adicionais. De acordo com Salomão, a lista mínima obrigatória é garantia de preços mais acessíveis.

"Considerar esse mesmo rol meramente exemplificativo representaria, na verdade, negar a própria existência do 'rol mínimo' e, reflexamente, negar acesso à saúde suplementar à mais extensa faixa da população", afirmou.

Ele mencionou hipóteses excepcionais em que seria possível determinar à operadora de saúde a cobertura de procedimentos não previstos expressamente pela ANS.

Entre elas estariam terapias com recomendação expressa do CFM (Conselho Federal de Medicina) que possuam comprovada eficiência para tratamentos específicos.

Como exemplo está o caso de um dos recursos analisados pelo STJ. O autor da ação pleiteou a cobertura do tratamento de EMT (estimulação magnética transcraniana), prescrito pelo psiquiatra para um quadro depressivo grave e esquizofrenia.

Salomão entendeu que a excepcionalidade da situação autorizava a determinação de cobertura, pela operadora, de procedimento não previsto no rol de procedimentos.

Segundo o ministro, o CFM passou a reconhecer a eficácia da EMT, com indicação para doenças psíquicas e no planejamento de neurocirurgias. Ele também ressaltou estudos científicos que demonstram a indicação do tratamento nas situações em que o paciente não responde adequadamente à intervenção com medicamentos antidepressivos.

Para reforçar a argumentação, o relator lembrou que Medida Provisória nº 1.067/2021 explicitou que a amplitude da cobertura no âmbito do sistema de saúde suplementar deve ser estabelecida em norma editada pela ANS. A MP revisou trechos da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998).

Ela instituiu a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, com a missão de assessorar a agência "na identificação de evidências científicas sobre eficácia, acurácia, efetividade e segurança do medicamento, produto ou procedimento analisado".

Após o voto de Salomão, a ministra Nancy Andrighi pediu vista para aprofundar a análise da matéria. Começou por ela a retomada do julgamento nesta quarta.

A magistrada apresentou voto divergente ao entender que o rol da ANS tem caráter exemplificativo porque "só dessa forma se concretiza a política de saúde idealizada pela Constituição".

Para a ministra, o documento é uma importante referência, seja para operadoras de saúde, profissionais e para os beneficiários de coberturas.

"Mas nunca como imposição genérica de tratamento, que deve ser obrigatoriamente prescrito e coberto pelo plano de saúde para determinada doença", afirmou Andrighi.