Pandemia, economia e fragilidade política são desafios de Castillo no Peru
PUBLICAÇÃO
domingo, 25 de julho de 2021
SYLVIA COLOMBO
BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - Quando Pedro Castillo, 51, assumir como presidente do Peru, na próxima quarta-feira (28), terá pelo menos três frentes abertas nas quais terá de colocar o foco.
A primeira é a pandemia do coronavírus. O Peru tem a maior taxa de mortalidade na América do Sul relativa à população, com mais de 195 mil óbitos pela doença.
Entre março e abril, o país voltou a ter uma alta de casos. Depois, a situação melhorou, e nas últimas semanas voltou a subir. Segundo especialistas, este aumento se deve à flexibilizações das atividades e ao aparecimento de novas variantes, como a lambda e a delta.
"Temos saturação de UTIs em várias regiões do país e falhas no abastecimento de oxigênio. Além disso, há uma grande preocupação com a taxa de vacinação, que continua sendo muito baixa", afirma o coordenador de emergências dos Médicos Sem Fronteira, Francesco Segoni. Ao todo, estão vacinados com a primeira dose apenas 21,4% dos peruanos, e 12,6% com as duas.
A pandemia agravou um segundo problema urgente do Peru, o aumento da pobreza. Depois de uma época de crescimento do PIB numa média anual de 5,6% entre 2001 e 2016, a quantidade de pobres no país diminuiu de modo acentuado, de 60% da população para 21% (no mesmo período).
A partir de 2019, porém, essa curva voltou a subir e foi acentuada em 2020, por conta das rígidas medidas de quarentena impostas, que abalaram diretamente o mercado informal, onde estão mais de 70% dos trabalhadores peruanos.
Desde 2020 para cá, há mais 3 milhões de peruanos abaixo da linha da pobreza. Agora, esta cifra está em 27%. O PIB do país caiu 11% nos últimos 12 meses (dados do Banco Mundial e do governo do Peru).
A terceira frente com que Castillo irá se confrontar é a política. Com o controle apenas do Executivo e apoio de apenas 37 dos 130 membros do novo Congresso, ele terá de buscar alianças.
"Uma coisa é fazer acordos num sistema político em que os partidos são fortes e se movem por um conjunto de ideias. Mas desde o retorno à democracia após os anos de Fujimori, os partidos são siglas de aluguel, estão fragmentados e respondem a interesses particulares. Neste cenário, é muito difícil firmar alianças sólidas. Não há nenhum indício de que a instabilidade política que vimos nos últimos anos deixe de existir agora", diz Steven Levitsky, da Universidade de Harvard.
Ainda nesta frente, é preciso acompanhar os passos do fujimorismo. Reunidos no partido Força Popular, os 24 parlamentares liderados por Keiko Fujimori serão a segunda força dentro do Congresso.
As palavras de Fujimori ao conceder a derrota foram dúbias. Por um lado, afirmou que aceitava o resultado. Ao mesmo tempo, considerava que Castillo não era um presidente legítimo, porque afirma que houve fraude -ainda que seus pedidos de impugnação de atas tenham sido considerados inválidos pelo tribunal eleitoral.
Fujimori pediu aliança das forças opositoras e prometeu, pelas vias democráticas, uma vigilância atenta às ações de Castillo.
O fujimorismo, porém, foi a principal força a apoiar os pedidos de "vacância" (afastamento) dos ex-presidentes Pedro Pablo Kuczynski (que derrotou sua líder na corrida de 2016) e Martín Vizcarra, que o sucedeu. É de se esperar, portanto, que Castillo tenha neste grupo político o mais duro opositor.
Fujimori também se defende de um processo por corrupção, que a acusa de receber propinas e caixa 2 em suas eleições anteriores.
Antes de ser candidata, passou mais de um ano em prisão preventiva. Uma pressão por sua imunidade pode ser uma moeda de troca do fujimorismo. Sem o status de presidenciável e derrotada na eleição, Keiko Fujimori pode voltar a ser presa a qualquer momento.
"Não se pode considerar o fujimorismo morto no Peru. Não tanto pelos ideias de Alberto Fujimori, mas pelos grupos de interesses que estão por trás de Keiko nos últimos anos e dependem de sua liberdade para manter seus negócios, seu status, seu poder regional", diz o analista Alberto Vergara.
Para o analista James Bosworth, "com a legitimidade questionada pela oposição, Castillo terá um impulso para logo tomar ações focadas em consolidar o poder, o que pode ocorrer com uma reforma judicial, uma ação mais radical no tema das nacionalizações ou em chamar uma nova Constituinte".
Ele afirma, porém, que isso não ocorreria nos primeiros meses, que devem ser marcados por uma trégua, tanto pelo lado da oposição, como do governo, que "tende a dar os primeios passos sinalizando moderação".
A maneira como Castillo deve governar, especialmente na área econômica, ficará mais clara nos próximos dias, quando no novo presidente deverá anunciar sua equipe ministerial.