SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um grupo de 11 pessoas fortemente armadas foi preso nesta quinta (8) após invadir a embaixada de Taiwan no Haiti, informou o governo da ilha asiática. A suspeita é a de que os detidos tenham participado do assassinato do presidente haitiano, Jovenel Moïse, morto a tiros na quarta (7), em Porto Príncipe.

Assim, o número de suspeitos presos subiu para 17 —15 colombianos e 2 haitianos-americanos. O chefe da polícia do país, Leon Charles, já havia afirmado que a investigação indica que 28 pessoas participaram do crime. Além dos que já estão presos, outros quatro criminosos foram mortos na noite de quarta, durante confronto com as forças de segurança, e outros oito membros do grupo estão foragidos.

Os governos de Colômbia e EUA anunciaram nesta sexta (9) o envio de agentes ao Haiti para auxiliarem nas investigações, uma vez que o comando da polícia colombiana confirmou a presença de ao menos 17 militares reformados do Exército do país na lista de envolvidos —além dos 15 presos, dois dos mortos.

A declaração aconteceu pouco depois de a imprensa local começar a revelar a identidade dos colombianos presos no país caribenho. Entre os nomes já identificados está o de Manuel Antonio Grosso Guarín, ex-membro da elite do Exército colombiano. Segundo a revista colombiana Semana, as autoridades haitianas investigam se ele era o líder do grupo de mercenários que matou Moïse.

Guarín e três outros ex-militares colombianos teriam viajado no dia 4 de junho de Bogotá para a República Dominicana —país vizinho ao Haiti. Dois dias depois, o grupo cruzou a fronteira por via terrestre, de acordo com o jornal El Tiempo. Fotos no Facebook de Guarín mostram ele em Punta Cana nesse período.

Uma outra leva de colombianos teria chegado ao Haiti no início de maio, a partir de um voo de Santo Domingo, capital dominicana. Além de Guarín, os outros suspeitos já identificados são, de acordo com a publicação colombiana, Jhon Jairo Ramírez, Víctor Alberto Pineda, Alejandro Giraldo Zapata, Naiser Franco Castañeda, Ángel Mario Yarce Sierra, Carlos Giovanni Guerrero, Germán Alejandro Rivera García, Enalbert Vargas Gómez, Jhon Jairo Suárez Alegría, Francisco Eladio Uribe Ochoa —todos os quais detidos—, além de Duberney Capador Giraldo e Mauricio Javier Romero Medina, ambos mortos pela polícia.

Além deles, há ainda os haitianos-americanos James J. Solages e Joseph Vincent, que vivem na Flórida. Segundo o New York Times, eles dizem terem sido contratados para servir de tradutores aos colombianos.

Ainda segundo a imprensa colombiana, os 11 detidos na embaixada de Taiwan chegaram a trocar tiros com a polícia antes da prisão. Joanne Ou, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores taiwanês, disse em entrevista coletiva nesta sexta que os seguranças do prédio perceberam a presença do grupo no pátio do edifício e avisaram a cúpula da embaixada e a polícia haitiana. "A pedido do governo haitiano e para ajudar na detenção dos suspeitos, a embaixada deu permissão à polícia haitiana para entrar no perímetro da representação diplomática", afirmou ela, que chamou os 11 detidos de mercenários.

O prédio, que fica próximo à casa onde Moïse foi assassinado, já tinha sido esvaziado na quarta por questões de segurança e, por isso, não havia ninguém no local no momento da invasão, afirmou Ou.

A revelação do caso joga luz na relação entre Porto Príncipe e Taipé. O Haiti é um dos 15 países do mundo a reconhecer Taiwan como um país independente. A pequena cifra se deve à pressão exercida pela China, que considera a ilha uma província rebelde e, por isso, recusa-se a manter relações diplomáticas com quem mantém elos formais com Taiwan. “Nesse momento difícil, o governo de Taiwan reitera seu apoio à capacidade do primeiro-ministro interino, Claude Joseph, em liderar o Haiti durante essa crise e a restaurar a ordem democrática. Taiwan condena fortemente essa ação violenta e barbára”, afirmou Ou nesta sexta.

Com a morte do presidente, Joseph assumiu de fato o comando do país e declarou estado de sítio durante duas semanas, medida que amplia os poderes do Executivo. Há dúvidas, porém, sobre a legitimidade de suas ações, já que o sucessor de Moïse, segundo a Constituição, seria o presidente da Suprema Corte. O cargo, no entanto, está vago desde que seu titular, René Sylvestre, morreu de Covid-19 no mês passado.

Para deixar a situação ainda mais delicada, um novo premiê, Ariel Henry, deveria ter assumido o posto na quarta-feira, dia do assassinato de Moïse, e os desdobramentos do crime acabaram impedindo a transferência de poder. Assim, Joseph segue no comando, com o apoio dos EUA e da ONU, sob o discurso de que a prioridade do momento é encontrar os mandantes da morte do presidente haitiano.

Os mandantes e as motivações do crime, porém, seguem desconhecidas. A hipótese de os assassinos serem estrangeiros já havia sido levantada pelo próprio Joseph pouco depois do crime. Ele disse na quarta-feira que os criminosos foram ouvidos falando em inglês e espanhol, o que indicaria que não são haitianos, já que os idiomas oficiais do país são o francês e o crioulo.

Segundo a imprensa local, citando o juiz encarregado do caso, Moïse foi encontrado com ao menos 12 marcas de tiros. “O escritório e a sala foram saqueados. Nós o encontramos deitado de costas, [usando] calça azul, camisa branca manchada de sangue, boca aberta, olho esquerdo furado”, disse o magistrado Carl Henry Destin ao jornal haitiano Le Nouvelliste.

Jomarlie, filha do casal, estava em casa durante o ataque, que ocorreu durante a madrugada, mas conseguiu se esconder num dos quartos. A primeira-dama, também baleada, foi transferida para receber tratamento em Miami e, segundo Joseph, está fora de perigo e em situação estável.

Na quinta, centenas de pessoas se reuniram do lado de fora da delegacia em que os suspeitos estão detidos em Porto Príncipe. Aos gritos de "queimem-os", atearam fogo em um veículo que presumiram ser dos assassinos. A ação, que se soma a um longo histórico de manifestações violentas nas ruas haitianas, levou o premiê interino do país a fazer um apelo para que a população não linche os suspeitos.

O caso acirrou a crise política do país, que tinha no centro da disputa uma discussão sobre o término do mandato de Moïse. Ele foi eleito em 2015 e deveria ter tomado posse em 7 de fevereiro de 2016 para um mandato de cinco anos. Em meio a acusações de fraudes, porém, o pleito foi anulado e teve que ser refeito no ano seguinte. Durante esse período, o país foi comandado por um governo interino.

Moïse saiu vencedor na nova votação e assumiu o comando do Haiti em 7 de fevereiro de 2017. Como o mandato presidencial no país é de cinco anos, ele alegava que deveria permanecer no cargo até fevereiro de 2022, portanto —uma alegação apoiada pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

Em meio a essa discussão, o então presidente decidiu suspender dois terços do Senado, toda a Câmara dos Deputados e todos os prefeitos e passou a comandar o país via decretos —o que rendeu uma onda de protestos contra o governo e acusações de autoritarismo.