SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Cerca de um ano atrás, uma música de uma garota de 18 anos era a mais ouvida no mundo. "Drivers License", de Olivia Rodrigo, retratava a insegurança de ser trocada por uma garota mais interessante. Mas, nessa época, ela estava no ensino médio e morava com os pais.

"É maluco", ela diz, em encontro virtual com a imprensa. "Minha vida mudou muito drasticamente desde que lancei minha primeira música. Agora tenho muitas oportunidades e sou muito agradecida que tanta gente queira ouvir o que tenho a dizer, é tipo viver o sonho. Mas no fim das contas eu meio que sou a mesma pessoa fazendo as mesmas coisas no dia a dia."

Depois do sucesso de "Drivers License", Rodrigo se firmou com o álbum "Sour", que expande os sentimentos de insegurança e desilusão do single, em vários momentos com ironia e deboche. Todo esse processo de feitura do disco, que levou a cantora a colecionar indicações a prêmios no Grammy, é registrado no filme "Dirigindo até Você (Sour: o Filme)", em que Rodrigo viaja por cidades nos Estados Unidos enquanto conta histórias sobre suas composições.

Ela também apresenta as canções em novos arranjos e surge em imagens antigas ao lado do produtor, Daniel Nigro, compondo e gravando no estúdio. "Minha parte favorita são as cenas de GoPro no estúdio com o Dan. Tem uma hora que estamos escrevendo a música 'Brutal', que é uma das minhas favoritas do álbum. É muito curioso ver aquilo em um estágio tão inicial e comparar com o que se tornou."

Mas o mais interessante talvez seja perceber como "Sour", e todo o apelo de Rodrigo na música, nasce de sentimentos pessoais muito latentes. Em uma cena do filme, contando sobre a criação de "Jealousy, Jealousy" e a obsessão que estava sentindo em relação às redes sociais, ela diz que escrever as músicas era como criar um amigo ou um confidente imaginário.

"Esse relacionamento foi uma desilusão que não acabava nunca. Eu vivi uma situação em que precisava vê-lo. Ele estava com outra pessoa, o que me deixou arrasada. Sentia meu mundo se acabando quase todo dia. Ninguém entendia como eu me sentia, ninguém conseguia se identificar. Então, fazendo músicas para dizer exatamente como eu estava me sentindo, eu estava criando um amigo para mim", ela diz no longa.

Não apenas "Drivers License" ou "Jealousy, Jealousy" retratam o mesmo relacionamento de Rodrigo, mas praticamente todas as músicas de "Sour". Em um momento do filme, ela está numa cama lendo o que aparenta ser um diário, com um texto escrito no dia em que tirou carteira de habilitação, segundo ela, por causa desse tal garoto. "Sinto o domínio dele sobre mim diminuindo. É uma sensação boa. Mas não consigo me apaixonar por outra pessoa. Nem consigo pensar nisso agora", diz.

É interessante perceber como as músicas são desabafos quase literais das situações que ela estava vivendo. E, neste caso, quando "Drivers License" estourou, os fãs não demoraram para entender de quem ela estava falando.

Rodrigo, que atuava na série "High School Musical", se apaixonou no set pelo colega Joshua Bassett, mesmo que o relacionamento nunca tenha sido assumido publicamente. Em seu primeiro single, ela canta sobre ser trocada por uma menina mais interessante, confiante e mais velha.

Essa garota era Sabrina Carpenter, também uma estrela da Disney, que acabou ficando com Bassett --e, aliás, lançou uma música chamada "Skin", em que celebra estar com o namorado enquanto a ex dele está chorando e sofrendo.

A ideia de fazer "Sour" veio depois que Rodrigo compôs "Drivers License", o que se reflete nas outras letras, como um retrato explícito --e que não esconde o ridículo-- do que é se apaixonar profundamente pela primeira vez, e a sensação de que o sofrimento após a decepção seria eterno.

"Amo o verso de 'Enough for You', em que digo 'um dia serei tudo para uma outra pessoa'. Também gosto de 'Hope Ur Okay', do verso 'espero que você tenha pego seus problemas e feito um royal flush'. E gosto muito do verso 'você não traiu, mas ainda assim é um traidor'. Acho que eu estava tendo dificuldade em expressar esse sentimento de traição no meu dia a dia, e acho que essa música consegue realmente captar isso."

Sobre o verso em que cita o royal flush, uma combinação de cartas do pôquer, ela conta que tirou a ideia de uma conversa com o pai. "'Hope Ur Okay' foi a última música que finalizei do disco. Queria fazer uma música no estilo folk, contando uma história", ela diz no filme. "Fiz essa música no meu quarto ou na sala. Fui até o quarto em que estava meu pai e perguntei, 'qual é a melhor jogada de cartas possível?' E ele falou 'royal flush'. Eu disse, 'perfeito', dá pra rimar. Voltei e inseri na letra."

Rodrigo também poderia citar a letra de "Deja Vu", em que ela imagina o ex ouvindo a música "Uptown Girl", de Billy Joel, com a atual namorada, e dizendo que ama ela exatamente entre uma determinada estrofe e o refrão.

"Quando você vai dizer a ela que fizemos isso também? Ela acha que isso é especial, mas é tudo reciclado", Rodrigo canta, dizendo que foi ela quem apresentou a música de Billy Joel ao ex. Ou até "Good 4 You", quando ela diz, sem esconder a raiva, "acho que aquela terapeuta que eu arrumei pra você realmente te ajudou".

"Quando você escreve uma música, aquilo é uma experiência totalmente íntima e pessoal, você derrama seu coração e alma nessa obra. E acho que quando chega a hora de lançar, você meio que tem que se separar da música, e ela não é mais uma extensão do seu coração. Deve ser diferente para os outros. Mas é algo que tive que aprender no processo de lançar 'Sour'. Por isso estou muito animada para mostrar as partes íntimas da composição de uma música nesse filme."

Um ano depois do lançamento do disco --e, agora, com 19 anos recém completados--, Rodrigo diz que também conseguiu superar os sentimentos de "Sour".

"Não me sinto mais como me sentia quando compus 'Sour', e definitivamente superei a maioria daqueles sentimentos e aprendi muitas lições. Então também é interessante olhar para aquela época da minha vida e pensar, 'eu cresci bastante' --o que é uma sensação gratificante. Também é interessante ter um álbum que funciona como uma máquina do tempo daquela período da minha vida. É muito legal pensar que vou ter isso para sempre."

Sentada em cima de um carro no filme, Rodrigo imagina se é possível compor obras a partir de algo que não seja um sofrimento profundo.

"É muito interessante ter uma plataforma como a composição quando você está com o coração partido", ela diz. "Mas não acho que todas as músicas têm de vir deste lugar de devastação. Existem cores muito diferentes no espectro das emoções humanas que merecem ser capturadas em música. Então estou bastante animada em tentar fazer isso no meu próximo trabalho."

*

Olivia Rodrigo: Dirigindo até Você (Sour: o Filme)

Onde: No Disney +

Quando: A partir desta sexta (25)