RIBEIRÃO PRETO, SP, E SÃO PAULO, SP (FOLHPRESS) - Uma mulher de 30 anos foi detida e levada à delegacia depois de xingar o presidente Jair Bolsonaro às margens da via Dutra no sábado (27), em Resende (RJ).

Bolsonaro esteve na cidade para participar da cerimônia de formatura dos cadetes da Aman (Academia Militar das Agulhas Negras).

Especialistas ouvidas pela Folha de S.Paulo consideraram anormal e abusiva a detenção realizada pela polícia.

Antes da formatura, o presidente estava com sua comitiva na Dutra, próximo à Aman, e acenava aos veículos que trafegavam pela rodovia que liga São Paulo ao Rio, as duas cidades mais populosas do país, quando foi xingado.

A mulher, que era passageira do automóvel e não teve seu nome revelado, "proferiu palavras de baixo calão e xingamentos", segundo a polícia. O carro foi abordado pela PRF (Polícia Rodoviária Federal).

No local, ela foi encaminhada à equipe da Polícia Federal que estava na Dutra e, de lá, levada para a delegacia da PF em Volta Redonda (RJ), distante cerca de 50 quilômetros, para o registro de um termo circunstanciado pelo crime de injúria.

A mulher não chegou a ficar presa e foi liberada depois de ter assumido o compromisso de que vai comparecer em juízo.

A pena para o crime de injúria, se condenada, é de até três anos de reclusão e multa, conforme o artigo 140 do Código Penal, mas, no caso de ser cometido contra o presidente da República, é aumentada em um terço.

Especialistas em direito penal consultadas pela Folha avaliam que a polícia agiu de forma atípica e abusiva no episódio.

Para a advogada criminalista Marina Coelho de Araújo, presidente do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), "xingar alguém não configura necessariamente crime. O crime de injúria tipifica-se por ofender a dignidade e o decoro. Xingamento não é a forma mais civilizada de conviver, mas não leva alguém à delegacia pela prática de crime".

"Ainda, ao tratar de uma figura pública, é necessário que sejam aceitas críticas e descontentamentos sob pena de se utilizar o direito penal de forma autoritária e ilegítima", completa.

A advogada criminalista Ana Carolina Moreira Santos, conselheira da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, afirma que "o crime contra a honra do presidente da República procede-se mediante requisição do ministro da Justiça. Não há possibilidade da dita ‘detenção’, bastando a identificação e lavratura de auto circunstanciado. Entendo que a Polícia Federal não poderia compelir a cidadã a ir para a delegacia, bastando sua identificação".

As criminalistas entendem que a conduta dos policiais envolvidos pode, em tese, configurar delitos previstos na Lei de Abuso de Autoridade, sancionada em 2019.

Depois de percorrer a via Dutra Bolsonaro esteve na formatura de 391 cadetes do quarto ano da Aman, onde se formou em 1977. Os cadetes se dividem entre infantaria, cavalaria, artilharia, engenharia, material bélico, intendência e comunicações.

Pela primeira vez em 210 anos, conforme a Aman, houve a formatura de um grupo misto, com 23 mulheres.

Além de Bolsonaro, participaram da cerimônia o vice, Hamilton Mourão, e os ministros Braga Netto (Defesa), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência).

Não foi a primeira vez que alguém foi detido por envolver o nome do presidente. Em março, em Uberlândia (MG), por exemplo, um homem foi preso por ter publicado em seu perfil no Twitter a frase: "Gente, Bolsonaro em Udia [Uberlândia] amanhã...Alguém fecha virar herói nacional?".

A Polícia Militar foi à sua casa no mesmo dia, à noite, dando voz de prisão a ele e avisando que ele teria que acompanhá-los à Polícia Federal.

Ficou preso até o dia seguinte com base na Lei de Segurança Nacional sob a acusação de "fazer propaganda" e "incitar" a prática de crimes contra a vida do presidente da República.

O homem disse que a publicação era uma piada e nem sabia se Bolsonaro iria mesmo à cidade. O presidente visitou o município mineiro no dia.