Morre aos 77 anos o publicitário Duda Mendonça, que comandou a campanha de Lula em 2002 (2)
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segunda-feira, 16 de agosto de 2021
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Remanescente da era de apogeu dos marqueteiros políticos, o publicitário Duda Mendonça morreu aos 77 anos, nesta segunda-feira (16), em São Paulo. Ele ficou conhecido por comandar campanhas eleitorais como a que levou o petista Luiz Inácio Lula da Silva a seu primeiro mandato presidencial, em 2002.
A causa da morte não foi informada. Duda estava internado desde junho no Hospital Sírio-Libanês.
Essa foi a segunda vez neste ano que o publicitário passou pelo Sírio, segundo o UOL. A Folha procurou o hospital, mas a família não autorizou a divulgação de informações e de boletins médicos.
Baiano de Salvador, José Eduardo Cavalcanti de Mendonça fez parte de uma geração de publicitários que, sob contratos milionários, coordenaram campanhas eleitorais misturando os papéis de marqueteiro e estrategista político, nas décadas de 1990 e 2000.
Tinha a ousadia e o bom humor como traços marcantes, segundo amigos. Na publicidade, emprestou características como irreverência, emoção e criatividade também a campanhas de produtos e empresas.
Ao longo de sua trajetória, Duda foi implicado em investigações de corrupção como mensalão e Operação Lava Jato. Também protagonizou escândalos como a prisão em flagrante por participação em uma rinha de galos em um sítio no Rio de Janeiro, em 2004.
A morte foi lamentada por políticos sobretudo do PT, partido com o qual teve intensa colaboração e colegas de profissão.
"Duda Mendonça foi um gênio da comunicação política. O seu trabalho na campanha de 2002 já está na história como uma das campanhas mais bonitas e sensíveis da nossa história", disse Lula em nota.
Além de ter levado o petista ao Planalto, ancorado no mote Lulinha paz e amor, Duda já havia ajudado a eleger para a Prefeitura de São Paulo, nos anos 1990, Paulo Maluf e seu sucessor e aliado, Celso Pitta.
A contratação do ex-malufista foi bancada por Lula, que entregou a ele a missão de traduzir em imagens uma versão light do PT, afastando temores de setores do eleitorado e do mercado com a eventual vitória do partido.
Trabalhou ainda em campanhas ao Senado de Marta Suplicy (então no PT) e Lindberg Farias (PT). Em 2014, coordenou as campanhas fracassadas de Delcídio do Amaral (à época no PT) ao Governo de Mato Grosso e de Paulo Skaf (MDB) ao Governo de São Paulo.
Sua participação na campanha de Skaf o levou mais uma vez a ser alvo de investigações do Ministério Público e da Polícia Federal. O marqueteiro foi delatado na Lava Jato por executivos da empreiteira Odebrecht, acusado de receber pagamentos do trabalho ao emedebista por meio de caixa dois.
Meses depois, Duda também se tornou delator, tendo sua colaboração homologada pelo Supremo Tribunal Federal em junho de 2018. Skaf sempre negou as suspeitas de desvios.
O marqueteiro virou um dos personagens principais do mensalão, em 2005, quando apareceu sem avisar em uma CPI em andamento e admitiu ter recebido ilegalmente do PT dinheiro da campanha de 2002, como parte do esquema de caixa dois da legenda.
O marqueteiro chegou a chorar durante o depoimento, de quase dez horas. Sete anos depois, ele foi absolvido pelo Supremo.
Em entrevista à Folha em 2018, indagado sobre a possibilidade de fazer campanha sem caixa dois, Duda disse achar "que sim, sobretudo para os que trabalham de forma correta". "Acrescentamos os impostos nos custos e dormimos em paz, afirmou.
Apesar dos envolvimentos nos escândalos, o maior arrependimento de Duda na carreira não tem a ver com isso, conforme revelou na ocasião.
REPERCUSSÃO
"Duda Mendonça foi um gênio da comunicação política. O seu trabalho na campanha de 2002 já está na história como uma das campanhas mais bonitas e sensíveis da nossa história. Em um momento em que o Brasil sofria com uma crise aguda, racionamento de energia e miséria, Duda Mendonça produziu filmes e mensagens de muita sensibilidade, de que a esperança venceria o medo. Aos seus familiares e amigos, meus sentimentos."
Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ex-presidente
"Um dia de tristeza e dor pela morte meu amigo Duda Mendonca, sempre presente e solidário nos momentos mais duros e difíceis que passamos juntos. Publicitário genial, criativo, inovador, um dos maiores do nosso Brasil, responsável pela campanha na TV e rádio que sabia fazer como ninguém vitoriosa de Lula em 2002, mas principalmente amigo e companheiro. Deixo aqui meu abraço de conforto à sua esposa, Aline Lucas, e demais filhos e filhas."
José Dirceu (PT), ex-ministro
É uma perda irreparável. Duda foi um divisor de águas no marketing político brasileiro. Para nossa área, teve o mesmo significado de Boni para a TV brasileira: criador de estilo e renovador de linguagens. Todos nós devemos muito a ele.
João Santana, publicitário
"Duda Mendonça, ou 'Sansão' para os mais íntimos, deixa-nos com lembranças muito intensas, como foi sua vida. Foi um brilhante publicitário com indiscutível talento, especialmente para o marketing politico. De todos nós era o que melhor traduzia para suas campanhas a linguagem de rua, o chamado popular urbano. Ele vivia ali, junto e misturado com o povo e seus hábitos. Tinha amigos em todas as classes, os quais acolhia generoso em sua casa de coração grande. Em todas campanhas que fez, incluía os traços e trejeitos da gente brasileira. Fez escola, rompeu padrões, todos aprendemos com ele. Sinto sua partida."
Fernando Barros, publicitário e sócio e da agência Propeg
"Lamento a morte do baiano Duda Mendonça. Publicitário que teve o seu talento reconhecido no Brasil e no mundo. Meus sentimentos para familiares e amigos."
Rui Costa (PT), governador da Bahia
"Expresso meus sentimentos à esposa, filhos, família e amigos de Duda Mendonça, a quem devemos sempre agradecer pela contribuição ao longo de toda história do Partido dos Trabalhadores, em quase todas campanhas eleitorais importantes para o partido até 2004."
Eduardo Suplicy (PT), vereador da capital paulista
O maior arrependimento é quando ajudamos a eleger alguém e depois ficamos desencantados com ele. Chegamos a uma conclusão frustrante: Deus nos deu um dom e verificamos que ajudamos a eleger a pessoa errada, disse, sem citar nomes. Não é correto dar os nomes das pessoas. Não há quem nunca erre.
Duda trabalhou, entre outros, com o publicitário João Santana, que foi seu funcionário e chegou a ser seu sócio. Os dois desfizeram a parceria em 2001, e o ex-pupilo ascendeu para encabeçar as outras três campanhas seguintes do PT à Presidência, todas vitoriosas.
Hoje, Santana, outro nome que contribuiu para firmar um novo estilo de marketing político no Brasil, atua na pré-campanha de Ciro Gomes (PDT) à Presidência da República em 2022.

