BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O MPF (Ministério Público Federal) em São Paulo acionará o canal de comunicação disponibilizado pelo Telegram ao STF (Supremo Tribunal Federal) para requisitar dados sobre moderação de conteúdo e combate a desinformação dentro das investigações que os procuradores conduzem para tentar enquadrar o serviço de mensagens.

O aplicativo é alvo de inquérito civil que trata da atuação das principais plataformas no país. Apesar de a empresa ter cumprido a decisão do ministro Alexandre de Moraes e conseguido reverter o bloqueio decretado pelo magistrado, o trabalho de apuração prossegue na Procuradoria.

Reagir pontualmente a determinações judiciais, avaliam os investigadores, não basta. "É impositivo que seja dado seguimento normal às diligências", afirma o órgão em manifestação da sexta-feira (18), logo após a divulgação da ordem de Moraes de suspender a plataforma --a medida foi revogada neste domingo (20).

Um ofício será remetido ao email indicado pelo Telegram para o recebimento de demandas judiciais solicitando ainda informações sobre aspectos operacionais da ferramenta. O pedido já havia sido enviado a outros endereços eletrônicos da ferramenta e não houve resposta.

Conforme mostrou a Folha, o MPF propôs uma ação de cooperação internacional com o objetivo de buscar junto à empresa, a partir de uma intervenção judicial, detalhes sobre a política de enfrentamento a práticas organizadas de desinformação e de violência na internet.

Mais do que um pedido de informações, a iniciativa é uma tentativa de obtenção de "provas documentais" na apuração que "visa uma melhor regulação da esfera pública digital brasileira".

Um eventual silêncio do Telegram frente a uma intimação judicial poderia ser considerado um fato relevante e abriria caminho para ações mais drásticas.

No final do mês passado, a Justiça Federal em São Paulo acatou o pedido dos procuradores e mandou intimar o aplicativo para que ele se manifeste, caso seja de seu interesse. Cartas rogatórias serão encaminhadas ao Judiciário nos Emirados Árabes, onde está a sede da empresa, e no Reino Unido.

A ordem de Moraes e seus desdobramentos, incluindo a reação de Palev Durov, fundador e CEO do Telegram, porém, abriram na Procuradoria nova perspectiva de avanços no trabalho.

O inquérito da fake news do STF, no qual foi imposto o bloqueio, tem natureza criminal e está relacionado a pessoas suspeitas da prática de ilícitos penais. São alvos o presidente Jair Bolsonaro (PL), por causa das declarações falsas que fez sobre as urnas eletrônicas, e seus aliados.

O trabalho dos procuradores, por sua vez, é de natureza cível e diz respeito às ações e omissões que as principais plataformas que operam no Brasil têm adotado frente ao fenômeno das notícias falsas e da violência digital.

Nessa apuração foram cobradas informações de Twitter, Instagram, Facebook/Meta, YouTube, WhatsApp e Telegram a respeito de providências que estão adotando para regular comportamentos abusivos na internet. O aplicativo criado e dirigido por Durov não respondeu.

A Procuradoria afirma que o cumprimento de ordens pontuais de remoção de conteúdo, como as que foram listadas pelo ministro Moraes, é dever de toda plataforma que opera no Brasil, segundo regras definidas pelo Marco Civil da Internet.

Mas não é só. Há outros deveres, a exemplo daqueles relacionados à implementação de uma autorregulação conforme o interesse público e a legislação do país.

Até agora no inquérito civil público, "a grande maioria das principais plataformas do país, além de cumprir decisões reativamente, também age proativamente, promovendo a remoção de postagens incompatíveis com seus termos de uso, suspendendo contas envolvidas em comportamentos abusivos, independentemente de ordem judicial neste sentido", diz a Procuradoria.

O Telegram é visto como uma das principais preocupações para as eleições de 2022 devido à falta de controles na disseminação de fake news e se tornou também alvo de discussão no Congresso e no TSE para possíveis restrições em seu funcionamento no Brasil.

Na Alemanha, com cerca de 8 milhões de usuários, o Telegram vinha igualmente se recusando a conversar com autoridades que atuam no enfrentamento a ações de grupos extremistas.

A plataforma mudou recentemente de postura com a sinalização de que medidas mais drásticas poderiam ser adotadas, incluindo o seu banimento do país. Bloqueou mais de 60 canais usados por radicais em atendimento a um pedido da polícia alemã.

A ferramenta é usada amplamente usada pela militância bolsonarista. O presidente conta com mais de 1 milhões de inscritos em seu canal, usado para a divulgação de ações do governo.

Nas redes sociais, Bolsonaro tem convocado apoiadores a se inscreverem em seu canal no serviço de comunicação, onde divulga ações do governo diariamente. Recentemente, ele chamou de covardia o cerco à plataforma e disse que o governo está "tratando" do assunto.

Após a decisão de Moraes, o presidente classificou o bloqueio do Telegram de "inadmissível" e disse que a determinação do ministro poderia causar até óbitos no Brasil.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, disse que buscava uma solução para recorrer à decisão do ministro do STF. Afirmou que "milhões de brasileiros" estão sendo "prejudicados repentinamente por uma decisão monocrática".

O advogado-geral da União, Bruno Bianco Leal, entrou com um pedido de medida cautelar ao STF contra a ordem de bloqueio. O pedido do advogado-geral foi direcionado à ministra Rosa Weber.