BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O médico Walter Correa de Souza Melo, que relatou ter sido ameaçado pelo diretor-executivo da Prevent Senior, Pedro Benedito Batista Júnior, também afirmou durante a conversa telefônica entre os dois que o prontuário do óbito do médico negacionista Anthony Wong foi manipulado.

O objetivo da alteração, segundo Melo, seria não deixar constar a Covid-19 como causa da morte do pediatra e toxicologista que morreu, aos 73 anos, no dia 15 de janeiro deste ano.

O médico era um dos principais defensores do chamado tratamento precoce, com medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19.

A revista Piauí revelou nesta terça-feira (21) que, apesar de a nota omitir que Wong fora internado com sintomas de Covid-19, o prontuário médico também não faz qualquer menção à morte em decorrência do vírus. Apesar disso, a infecção pelo vírus foi o que motivou todas as complicações subsequentes que o mataram.

Nesta quarta-feira (22), a Folha de S.Paulo revelou um trecho do diálogo em que o médico relata ter sido ameaçado e coagido pelo diretor-executivo.

Em outro trecho da conversa, Batista Júnior afirma que o médico "está ameaçando um trabalho que salvou milhares de vidas", ao que Melo responde: "Não salvou, Pedro, a gente sabe que não salvou".

Também acrescenta ao diretor que "a gente sabe" que os números de óbitos em tratamentos ineficazes contra a Covid foram manipulados.

"Eu conversei com quem fez o estudo, me contou que o estudo foi manipulado... como manipular atestado de óbito. O do Anthony Wong a gente sabe que foi manipulado, não foi?", diz Melo.

O diretor-executivo responde: "O que foi manipulado o Anthony Wong? Olha as coisas que você está falando".

"Não foi dito na declaração de óbito que ele foi por Covid?", questionou o ex-funcionário.

"Ele não foi de Covid, velho", afirmou Batista Júnior, o diretor-executivo.

"E aquilo que está no prontuário dele?", questionou o médico.

"Ele teve Covid no mês anterior, não foi de Covid. Ele entrou por causa de um sangramento gástrico", rebateu o diretor-executivo, que em seguida afirmou que Melo cometeu crime por acessar indevidamente um prontuário de paciente que não era seu.

Na ocasião da morte de Wong, sua família divulgou uma nota afirmando que ele havia sido hospitalizado com queda de pressão e mal-estar e que recebeu o diagnóstico de úlcera gástrica e hemorragia digestiva.

O áudio e os documentos sobre o caso estão entre os arquivos sigilosos da CPI. O ex-funcionário da Prevent ainda registrou as ameaças em um boletim de ocorrência na Polícia Civil de São Paulo.

O empresário será ouvido nesta quarta por senadores, após o surgimento de denúncias de que hospitais do grupo podem ter sido espécie de laboratório para indicação de medicamentos sem eficácia contra a Covid-19.

Segundo um dossiê assinado por 15 médicos da Prevent, profissionais eram coagidos a prescrever remédios como hidroxicloroquina sem consentimento de parentes dos pacientes e eram obrigados a trabalhar mesmo quando infectados com o coronavírus.

Além disso, o documento afirma que a Prevent teria omitido sete mortes durante um estudo clínico sobre a eficácia dos remédios.

Em uma nota breve, a assessoria de imprensa da Prevent Senior afirmou que "o dr. Pedro Batista Júnior nega qualquer ameaça a colegas". A empresa ainda não se pronunciou sobre o caso de Wong citado no áudio da conversa.