SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - Se em 2019 a ala ideológica do governo competia por protagonismo com os militares, hoje ela ficou restrita a alguns poucos espaços no governo Jair Bolsonaro (PL). O principal deles é a Secretaria Especial da Cultura, cujos nomes mais importantes devem se lançar candidatos em outubro.

O secretário Mario Frias e o seu número dois, o secretário-executivo André Porciuncula, disputarão as eleições neste ano pela primeira vez. Outrora ator global, Frias deve mirar uma cadeira na Câmara dos Deputados pelo PL de São Paulo.

Já Porciuncula, segundo relatos, negocia para sair para deputado estadual pela Bahia, também pelo partido do presidente.

Outro nome do núcleo mais radical do governo, Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares, também deve se lançar à vaga de federal por São Paulo.

Segundo a reportagem apurou, ele também tem conversado com o PL de Bolsonaro. Questionado sobre a candidatura, Camargo se limitou a dizer: "Estou cumprindo a missão que me foi dada pelo presidente Jair Messias Bolsonaro, transformando pela primeira vez a Fundação Palmares numa verdadeira fundação cultural".

Hoje, a secretaria virou o principal núcleo da ala mais radical e ideológica do governo. A estrutura enfrentou turbulências desde o primeiro ano da administração Bolsonaro.

A principal bandeira de Frias à frente da Cultura foi a reestruturação da Lei Rouanet, de incentivo a artistas --a quem ele se referiu de forma pejorativa na época como "mamadores da Rouanet".

Segundo aliados do presidente, Frias, que tem bom desempenho nas redes sociais, estava bem cotado entre bolsonaristas com o discurso de "moralizar" a cultura. Mas caiu em contradição com a notícia de que sua recente viagem a Nova York somou gastos equivalentes a 13 vezes o teto da lei para o cachê de artistas.

Como o jornal Folha de S.Paulo mostrou, dados do Portal da Transparência revelam que foram gastos R$ 39 mil para tratar de "projeto de cultura envolvendo produção audiovisual, cultura e esporte" com o lutador de jiu-jitsu Renzo Gracie.

No último dia 8, o governo oficializou as mudanças na Rouanet e o limite para cachês de artistas foi a R$ 3 mil.

O episódio em Nova York repercutiu mal dentro e fora do governo. Segundo relatos de palacianos, Bolsonaro teria ficado muito irritado e tido uma dura conversa com Frias. Alguns esperavam que ele pudesse ser demitido, mas o cálculo do Planalto foi de que o desgaste com a demissão seria maior do que esperar a desincompatibilização do cargo.

Frias deve deixar a secretaria no começo de abril para ser candidato, como determina o TSE, o Tribunal Superior Eleitoral.

Para aliados de Bolsonaro, o episódio pode se tornar um contratempo perigoso para a campanha de Frias em São Paulo.

Mesmo antes disso, ele já não integrava a lista de prováveis puxadores de voto do PL, encabeçada por Eduardo Bolsonaro, Carla Zambelli, Tiririca e Ricardo Salles.

Com a saída de Frias, a Cultura passará para o comando do sexto secretário no governo Bolsonaro.

Desde o primeiro ano de governo, a área passa por disputas e atritos. Já houve demissões por acusação de censura, imitação de discurso nazista e "chilique" ao vivo de Regina Duarte.

Além de Porciuncula e Frias, ao menos mais dois nomes devem disputar cargos eleitorais este ano: Felipe Carmona, secretário nacional de Direitos Autorais e Propriedade Intelectual; e Felipe Cruz Pedri, secretário nacional de Audiovisual.

Este último foi da Secom, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, da Presidência até novembro do ano passado. No início da gestão Bolsonaro, era lá o principal reduto da ala ideológica, que foi perdendo força com o crescimento do centrão no governo.

Hoje, o principal reduto da ala ideológica também marca presença, em menor grau, no Ministério da Educação, com filtros a reitores de esquerda, por exemplo, no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos e na Secretaria da Pesca.

Estes dois últimos têm no comando futuros candidatos: a ministra Damares Alves, que deve sair ao Senado, e Jorge Seif, que provavelmente se lançará à Câmara dos Deputados.

Gestores estaduais e produtores culturais temem o destino que a secretaria possa vir a ter com a nova mudança no comando. Eles trabalham hoje pela aprovação de medidas no Congresso que sirvam para resgatar o setor, como a Lei Paulo Gustavo.

Segundo disseram reservadamente à Folha de S.Paulo, há um temor da eventual gestão dos programas, que, se forem aprovados no Parlamento, terão quase R$ 4 bilhões em caixa.

No começo de fevereiro, Rafael Nogueira deixou a presidência da Biblioteca Nacional para assumir a Secretaria Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural.

Olavista, Nogueira teve sua indicação à Biblioteca Nacional criticada por servidores. Hoje ele é um dos nomes cotados para assumir a vaga de Frias.

Outra possibilidade para a sucessão da Cultura é Larissa Peixoto, presidente do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Segundo integrantes do governo, seu principal fiador é o ministro do Turismo, Gilson Machado, que nega trabalhar por qualquer nome.