Limitar Defensorias 'fere de morte' acesso à Justiça pelos mais pobres, diz chefe da DPU
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sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022
MÔNICA BERGAMO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O defensor público-geral federal, Daniel Macedo, afirma que limitar o acesso a documentos pelas Defensorias Públicas poderá agravar as desigualdades e até mesmo impedir o exercício de cidadania por aqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade.
A iniciativa é capitaneada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. O PGR busca derrubar uma legislação federal de 1994 e outras normas estaduais que concedem às Defensorias o poder de requisitar documentos de órgãos públicos. O julgamento do caso deve ser retomado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nesta sexta-feira (11).
"Retirar o poder de requisição, diante dos limites já existentes, é ferir de morte a possibilidade de acesso à Justiça das pessoas mais vulneráveis", afirma o chefe da Defensoria Pública da União (DPU).
"A prerrogativa de requisição, a toda evidência, além de constituir um instrumento mitigador da cultura da litigância, prestigia o princípio da isonomia, em sustentação a direitos dos historicamente relegados à desigualdade e em cumprimento aos desígnios de que foi investida pela Constituição", segue.
Augusto Aras defende que legislações que permitem aos defensores requisitar certidões, exames, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações e demais providências necessárias à sua atuação não estão de acordo com a Constituição.
Segundo o procurador-geral da República, como advogados privados não têm esse poder, defensores públicos também não deveriam poder obrigar autoridades públicas a expedir documentos e fornecer informações.
Em novembro do ano passado, por exemplo, a Defensoria Pública de SP só conseguiu a soltura de sete pessoas que estavam presas por furtos considerados insignificantes graças ao poder de requisição. Em comum, todos tinham o fato de que terem sido descobertos ao acaso pelo defensor Patrick Lemos Cacicedo.
Após tomar ciência de um dos casos, Cacicedo solicitou à unidade prisional uma lista com todos aqueles que estavam detidos pela prática de furto. E descobriu que alguns deles poderiam estar respondendo em liberdade. A comarca não tem Defensoria Pública instalada, e a lista não poderia ter sido obtida sem a prerrogativa de requisição de documentos.
Como mostrou a coluna nesta sexta-feira (11), a AGU (Advocacia-Geral da União) tem se manifestado de maneira contraditória junto ao Supremo no que diz respeito às ações que querem limitar o poder das Defensorias Públicas.
Como a PGR impetrou 22 ações, a AGU precisa se pronunciar sobre cada uma delas. Nas seis primeiras manifestações do órgão, entre os meses de junho e julho do ano passado, o entendimento era de que o pedido da PGR seria improcedente ou seja, de que a prerrogativa da Defensoria seria constitucional.
"Observa-se que o poder conferido à Defensoria Pública, de requisitar elementos de órgãos e agentes públicos e privados para o exercício de seu mister constitucional, não ofende as normas apontadas como parâmetros de controle na petição inicial", disse a AGU em um parecer favorável às Defensorias.
Com a chegada do ministro Bruno Bianco à AGU, no entanto, o órgão mudou de direção. Desde agosto de 2021, 12 das 14 manifestações proferidas foram pela inconstitucionalidade da prerrogativa.
A mudança chegou a ser apontada pela própria AGU em um dos ofícios. "Em ocasiões anteriores, o então Advogado-Geral da União exerceu a defesa de ato normativo análogo ao impugnado. Contudo, o tema foi objeto de novo discernimento na instituição, recebendo conclusão atualizada", afirmou o órgão.

