RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) - O TJ (Tribunal de Justiça) de São Paulo absolveu o médico Matheus Gabriel Braia, que participou de um trote universitário considerado machista por grupos feministas em Franca (a 400 km de São Paulo) em 2019. Cabe recurso.

Naquele ano, o médico, ex-estudante da Unifran (Universidade de Franca), participou de um trote aplicado aos calouros do curso e leu uma espécie de "juramento", que gerou queixas e motivou investigação do Ministério Público Estadual.

Ajoelhadas e com os corpos pintados, as universitárias tiveram que "jurar" nunca entregar o corpo "a nenhum invejoso, burro, brocha, filho da puta da odonto ou da Facef [Centro Universitário de Franca]" e "sempre atender aos desejos sexuais" e "nunca recusar a uma tentativa de coito" dos veteranos.

"Repudio totalmente qualquer tentativa deles se aproveitarem e me reservo totalmente a vontade dos meus veteranos e prometo sempre atender aos seus desejos sexuais. Compreendo que namoro não combina com faculdade e a partir de hoje sou solteira, estou à disposição dos meus veteranos [...] Juro solenemente nunca recusar a uma tentativa de coito de veterano", diz trecho do "juramento".

Quatro meses depois do trote, a Promotoria ajuizou ação civil pública contra Braia, um dos envolvidos, e pediu à Justiça que ele fosse condenado a pagar R$ 39.920 por danos morais coletivos.

O trote provocou críticas de grupos como o Conselho Municipal da Condição Feminina de Franca e de outras associações estudantis, como a própria Atlética da Medicina da Unifran.

Em primeira instância, a juíza Adriana Gatto Martins Bonemer absolveu o médico e afirmou que a ação do Ministério Público "retrata bem a panfletagem feminista, recheada de chavões que dominam, além da esfera cultural, as universidades brasileiras".

"É bom ressaltar que o movimento feminista apenas colaborou para a degradação moral que vivemos, bem exemplificada pelo 'discurso/juramento' que ora se combate", escreveu em sua decisão.

No recurso ao TJ, a Promotoria alegou que a sentença deveria ser anulada por cerceamento do direito de produção de provas e que havia dano moral coletivo e dano social, devido ao juramento entoado pelo réu no trote universitário.

Em sua decisão, porém, o relator Rogério Murillo Pereira Cimino afirmou não ter ocorrido cerceamento de defesa e que as declarações foram feitas em tom de brincadeira.

"Em que pese o conteúdo reprovável, mera infração de ordem moral incapaz de causar consequências no âmbito jurídico, posto que as declarações foram realizadas em tom de brincadeira tanto pelo veterano que as entoou como pelas demais participantes que a repetiram, de livre e espontânea vontade, tudo em tom jocoso, a eliminar a gravidade que se pretende imputar aos fatos", escreveu Cimino.

Ele afirmou ainda que é preciso ponderação e que, no caso, não houve maculação dos direitos fundamentais das mulheres. "O que se propõe é o bom senso e o limite do razoável entre o que é chiste e o que é ofensa séria e grave."

Ainda conforme o relator, seria desproporcional punir o réu "ante a atitude das próprias calouras presentes no evento".

"Pois ao contrário de rechaçarem a brincadeira proposta, dela participaram declarando os dizeres, ora condenados, sem constrangimento algum, não havendo que se falar em coação, haja vista que se tratam de estudantes universitárias, maiores e plenamente capazes civilmente, as quais, caso houvessem ao menos se incomodado com a situação, poderiam ter se retirado do evento ou silenciado à brincadeira proposta, recusando-se a dela participarem, o que não ocorreu."

A reportagem procurou o médico, mas não houve resposta até a publicação da reportagem.

A defesa de Braia alegou à Justiça durante o processo que o trote não passou "de um teatro e brincadeira", que o médico apenas reproduziu um juramento já existente e que o vídeo do momento "demonstra um clima de descontração e risos".