SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Desde o incêndio ocorrido num depósito da Cinemateca Brasileira na semana passada, uma série de entidades internacionais do setor de cinema têm publicado notas de apoio aos profissionais da instituição e com críticas ao governo federal brasileiro.

Nesta terça (3), a Associação de Cinematecas Europeias publicou um texto comentando a demissão em massa dos funcionários da Cinemateca Brasileira, ocorrida no ano passado, e responsabilizando o governo Bolsonaro pelo fogo que danificou os materiais da unidade da Vila Leopoldina.

"Desde junho de 2020, representantes de várias instituições do patrimônio cinematográfico europeu e munidial expressam preocupação em relação ao futuro desta respeitada instituição. A administração e os funcionários da Cinemateca são os últimos a serem considerados responsáveis por este desastre", afirma a nota.

"O governo federal tem tratado a Cinemateca com tanto desprezo que em 2020 a instituição morreu de fome, com fundos congelados, funcionários não pagos e demitidos, atividades paralisadas."

Na sexta (30), a Fiaf (Federação Internacional de Arquivos de Filmes, na sigla em inglês) definiu o incêndio como uma catástrofe para o cinema mundial.

"Enquanto nós não sabemos a extensão total dos danos, é provável que a catástrofe tenha causado a perda de quantidades significativas de filmes e outros artefatos culturais importantes da Cinemateca Brasileira, um dos mais antigos e respeitados membros da nossa rede global e um guardião essencial do rico patrimônio cinematográfico do Brasil", diz a nota da Fiaf.

Ainda na sexta, o Instituto Lumière, que reúne acervo de filmes de diversas partes do mundo, disse que o acontecimento representa um símbolo "da terrível gestão cultural" existente no país.

"É mais um desastre sofrido pela Cinemateca em vários anos, após quatro incêndios e uma enchente", diz a nota. "A maior dificuldade, no entanto, são as condições impostas pelo atual governo brasileiro."

A publicação do Lumière destacou ainda o fato de que desde julho do ano passado o Ministério Público Federal fez vários alertas sobre o risco de incêndio na instituição.

Os 950 membros do Conselho da Associação de Arquivistas de Imagens em Movimento também se manifestaram sobre o ocorrido.

Segundo eles, os ex-profissionais da Cinemateca, demitidos em meio à crescente crise institucional, "defendem incansavelmente o patrimônio cultural" do país e deveriam voltar aos seus cargos.

Além de entidades, algumas organizações de eventos internacionais de cinema também se pronunciaram, como o Festival de Locarno, da Suíça. "O patrimônio audiovisual brasileiro não pode mais esperar. Exigimos uma resolução imediata", diz um post no Twitter.

O incêndio teria começado durante a manutenção, por parte de uma empresa terceirizada, no ar condiciado de uma sala no primeiro andar do imóvel. Ela e outra sala adjacente, que abrigam o acervo histórico de filmes da entidade, foram atingidas, bem como um terceiro ambiente dedicado a arquivos impressos.

O prédio em questão não é a sede principal da Cinemateca, que fica na Vila Clementino, na zona sul da capital paulista. Mas o depósito atingido pelas chamas também abriga parte importante de seu acervo, como filmes de 35 mm e 16 mm, feitos de material altamente inflamável. Eles seriam cópias para exibição, não os rolos originais, que ficam em outro local.

Além deles, também ficam guardados ali o acervo da Programadora Brasil --iniciativa do antigo Ministério da Cultura para exibição de conteúdo em circuitos não comerciais--, equipamentos museológicos, como projetores antigos, e documentos, incluindo quatro toneladas de arquivos sobre políticas públicas para o audiovisual, recentemente transferidas do Rio de Janeiro.