SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A previsão de perda de arrecadação com a reforma que altera o Imposto de Renda ligou um sinal de alerta entre economistas preocupados com a sustentabilidade das contas públicas.

O texto preliminar apresentado pelo relator, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA), a líderes na Câmara nesta terça-feira (13) prevê um corte de 12,5 pontos percentuais na tributação sobre empresas -acima do que foi apresentado anteriormente, pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia).

A proposta original propunha uma redução da alíquota do IR de empresas dos atuais 15% para 10%, com um escalonamento de 2,5 pontos percentuais no primeiro ano e mais 2,5 pontos no segundo ano.

A versão preliminar do relator alivia o IR para empresas, mas deve deixar um rombo de R$ 30 bilhões nas contas públicas. Segundo ele, a perda será compensada pelo aumento de arrecadação com a retomada da economia.

A estimativa do governo é que a renúncia seja compensada pela retomada da atividade, mas isso é arriscado, afirma Juliana Damasceno, economista e pesquisadora de finanças públicas do Ibre FGV (Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas).

"A questão é que a gente já viu que as renúncias fiscais não são necessariamente compensadas depois", diz.

Ela acrescenta que já era dado que a proposta original do governo seria revisada, mas que prever um rombo de R$ 30 bilhões nas contas pode renovar no futuro a vontade de criar impostos nos moldes da extinta CPMF, como o governo já defendeu no passado.

Qualquer mudança que venha a reduzir a arrecadação é perigosa agora, avalia o especialista em finanças públicas e assessor especial na Secretaria da Fazenda de São Paulo, Guilherme Tinoco. Ele lembra, no entanto, que as estimativas do relator ainda precisam ser detalhadas.

A previsão é perigosa pelo volume e pela incerteza que gera para os próximos anos, avalia Tinoco. "A revisão pesa a mão no corte para o Imposto de Renda de pessoa jurídica. Não é hora de reduzir a carga tributária, e o país ainda não tem nem horizonte de voltar a ter superávit primário."

O resultado primário aponta a capacidade que o governo tem de pagar as contas, excluindo os encargos da dívida pública. Se as receitas são maiores que as despesas, há superavit. Caso contrário, há deficit. O país fechou 2020 com um rombo fiscal de R$ 743,1 bilhões e o resultado é negativo desde 2014.

Na terceira queda seguida, a dívida bruta do governo chegou a 84,5% do PIB (Produto Interno Bruto) em maio, uma queda de 1,1 ponto percentual ante o mês anterior, segundo o Banco Central. Os economistas projetam que a dívida encerre o ano em 83,2% do PIB e volte a crescer nos anos seguintes, chegando a 87,5% em 2025.

"A dívida pública é preocupante, mas a trajetória recente era de alívio. Há poucos meses, todo mundo o esperava que fosse fechar em 90% do PIB, e hoje está perto de 80%", avalia Tinoco. Ainda é uma dívida alta e a situação, como um todo, é frágil, diz.

Na visão dos analistas ouvidos pela Folha, o governo parece ter pesado a mão na tributação de empresas na proposta original, para sentir como seriam as reações dos empresários e agentes do mercado.

"O desenho original da reforma tinha cheiro de aumento de carga tributária e havia um desbalanceamento entre a redução de imposto para PJ e a cobrança na distribuição para sócios", diz o especialista em contas públicas da Tendências, Fabio Klein.

Ficou melhor do ponto de vista de evitar o encarecimento para o setor produtivo, mas é uma perda importante, diz o economista. "É muita perda para um país que continua em deficit primário, que só deve virar um superávit em 2026."

Ao mesmo tempo, dada a velocidade e a profundidade das primeiras mudanças no texto, as críticas parecem ter sido maiores do que o esperado.

"O governo tem um padrão de divulgar propostas para ver a reação do mercado e foi exatamente o que aconteceu agora. Mas não estamos no momento de abrir mão de arrecadação", diz Damasceno.

Na última terça-feira, o coordenador do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da FGV AESP, Nelson Marconi, havia dito que a proposta vai na direção contrária ao discurso de equilíbrio fiscal.

"Está na cara que vai piorar a situação fiscal", disse o economista, ao avaliar que a redução da carga sobre as empresas está sendo proposta de forma desestruturada.