BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A eclosão de uma nova crise institucional no Paraguai preocupa o governo Jair Bolsonaro, que teme a destituição de um aliado -- o presidente Mario Abdo Benítez -- e a consequente desestabilização da região num momento de pandemia.

O Paraguai vive jornadas de manifestações que têm tomado as ruas principalmente de Assunção contra a condução da pandemia de coronavírus pelo governo.

Membros do Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) decidiram entrar com um pedido de julgamento político contra o atual presidente, o que pode terminar com seu afastamento.

O Itamaraty passou a receber informações da embaixada em Assunção após o início das manifestações, na sexta-feira (5).

A avaliação de interlocutores de Bolsonaro consultados pela Folha é que, até o momento, Abdo Benítez tem conseguido se manter no cargo graças às trocas realizadas em seu gabinete.

A principal sinalização da sobrevida do presidente foi o fato de o grupo majoritário do partido Colorado, controlado pelo ex-presidente Horacio Cartes, não ter declarado apoio ao impeachment.

Membros do governo brasileiro, no entanto, permanecem preocupados e ressaltam que no Paraguai um processo de impeachment pode acontecer em tempo recorde.

A destituição do ex-presidente Fernando Lugo, por exemplo, foi concluído em apenas dois dias.

Bolsonaro é um aliado de Abdo Benítez, não tem interesse em vê-lo destituído do cargo e já o ajudou quando, há dois anos, ele esteve ameaçado de perder a cadeira presidencial.

Em 2019, o governo Bolsonaro não apresentou objeções à decisão do Paraguai de cancelar um acordo bilateral que aumentava o custo para o país vizinho com a aquisição de energia de Itaipu.

Na ocasião, o processo de impeachment que corria contra Abdo Benítez perdeu força após a anulação do documento.

De acordo com membros do governo Bolsonaro, a preocupação com a atual crise no Paraguai vai além da proximidade ideológica com o mandatário: existe o receio que uma troca no poder seja um fator de desestabilização na região em plena pandemia de Covid-19.

O problema é que a motivação das atuais manifestações --a gestão na crise sanitária-- deixa o Brasil com pouca margem para auxiliar o país vizinho.

Embora o governo paraguaio tenha imposto um duro conjunto de medidas de isolamento social, mantendo baixos números de infecção e de mortes, a vacinação no país praticamente não começou.

Até o momento, nem 0,1% da população foi imunizada. No Brasil, onde o governo enfrenta críticas pelo atraso na sua campanha de vacinação, o índice é de cerca de 4%.

Autoridades do Paraguai chegaram a solicitar ao Brasil o envio de um lote de imunizantes, mas a resposta foi negativa.

Os brasileiros argumentaram que enfrentam uma forte escassez de vacinas, que Bolsonaro tem sido criticado pelos atrasos na campanha de imunização e que permitir a exportação desses produtos é um tema politicamente sensível.

Com a crise no Paraguai, a expectativa de integrantes do governo Bolsonaro ouvidos pela Folha é que o país vizinho faça novas solicitações de ajuda.

O chanceler paraguaio, Euclides Acevedo Candia, tem visita agendada a Brasília na próxima semana e deve tratar de novos pedidos de cooperação.

De acordo com o Itamaraty, desde o começo da pandemia o Brasil doou ao Paraguai 50 ventiladores pulmonares mecânicos, 50 mil kits de testes e 20 tendas de campanha para a montagem de estruturas para o tratamento de pessoas com suspeita de Covid-19.

No momento, o Ministério da Saúde analisa ainda um outro pedido do país vizinho, de entrega de mais 35 mil kits de testagem.

"Além de atender a pedidos de doação, o governo brasileiro compartilhou com o governo paraguaio os protocolos do Ministério da Saúde para o enfrentamento à Covid-19", disse o Itamaraty, em nota.