BRASÍLIA, DF, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Denunciado sob a acusação de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no caso das "rachadinhas", o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) comprou uma mansão em Brasília no valor de R$ 5,97 milhões, segundo revelou o site O Antagonista.

A casa fica localizada no Setor de Mansões Dom Bosco, no Lago Sul, bairro nobre da capital. Ela tem 1.100 m² de área construída, em um terreno de 2.500 m².

De acordo com o site, o parlamentar e a esposa, Fernanda Bolsonaro, visitaram nos últimos meses outras casas de valores similares na cidade.

O negócio imobiliário foi concretizado às vésperas de o STJ (Superior Tribunal de Justiça) analisar vários recursos do senador no caso das "rachadinhas".

No primeiro deles, julgado na semana passada, os ministros da Quinta Turma do STJ anularam as quebras de sigilo bancário e fiscal da investigação conduzida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.

A mansão em Brasília é o 20º imóvel que Flávio adquire num intervalo de 16 anos --considerando um andar com 12 salas comerciais de que foi proprietário. A intensa atividade imobiliária do senador foi revelada pelo jornal Folha de S.Paulo em 2018.

Atualmente ele é dono de um apartamento na Barra da Tijuca adquirido por R$ 2,5 milhões, com financiamento, e uma sala comercial num shopping da zona oeste, avaliada em R$ 150 mil.

Na denúncia oferecida contra o senador no caso das "rachadinhas", o Ministério Público do Rio de Janeiro apontou que as operações de compra e venda de dois imóveis foi usada para lavagem de dinheiro.

A reportagem do site O Antagonista reproduziu um trecho da certidão do imóvel comprado em Brasília. De acordo com o documento, o negócio foi fechado no final de janeiro com a RVA Construções e Incorporações, empresa do advogado e empresário Juscelino Sarkis.

A certidão informa que parte do valor (R$ 3,1 milhões) foi financiada pelo BRB (Banco de Brasília). A quitação será em 360 parcelas.

O documento menciona taxas que variam de 3,65% a 4,85% ao ano. A amortização será pelo sistema SAC, que consiste em prestações mais altas no início e menores no final.

O BRB é controlado pelo governo do Distrito Federal, comandado por Ibaneis Rocha (MDB), um aliado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O salário de Flávio no Senado é de R$ 25 mil líquidos. A esposa é dentista e tem consultório em Brasília. São casados em regime de comunhão parcial de bens.

A escritura de compra e venda foi feita em um serviço notarial de Brazlândia, cidade do DF distante cerca de 45 km do Plano Piloto. A matrícula do imóvel, por sua vez, é de responsabilidade do 1º Ofício do Registro de Imóveis do DF, a poucos quilômetros do Congresso.

O Antagonista reproduziu também conteúdo do anúncio do imóvel, recentemente tirado do ar.

Um trecho dizia: "No piso superior, sala e copas íntimas, uma brinquedoteca, quatro suítes amplas, sendo a máster com hidromassagem para o casal, closet e academia."

"Na área externa, piscina e spa com aquecimento solar, iluminação em led e deck, banheiros do espaço gourmet, depósito, quatro vagas de garagem cobertas e mais quatro descobertas."

Nas eleições de 2018, Flávio declarou ao TSE ser dono de patrimônio de R$ 1,7 milhão. Ele encerrou recentemente as atividades da loja de chocolates que mantinha num shopping no Rio.

Ele é acusado de liderar um esquema de "rachadinha" em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa por meio de 12 funcionários fantasmas entre 2007 e 2018, período em que era deputado estadual.

Foi denunciado em novembro de 2020 pela Promotoria fluminense sob a acusação dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, apropriação indébita e organização criminosa, em razão do suposto desvio de R$ 6,1 milhões.

Procurado por meio da assessoria de imprensa, o senador não respondeu até a conclusão deste texto.

Na apuração do MP-RJ no caso das "rachadinhas", os investigadores afirmam que Flávio e a mulher, a dentista Fernanda Bolsonaro, pagaram "por fora", com dinheiro vivo, R$ 638,4 mil na aquisição de duas quitinetes em Copacabana (zona sul) em novembro de 2012. O valor pago oficialmente, declarado em escritura, foi de R$ 310 mil.

O MP-RJ afirmou que, no mesmo dia da concretização do negócio, o vendedor dos dois imóveis esteve no banco HSBC, onde tinha conta, para depositar os valores em espécie. A agência usada fica a 450 metros do cartório onde foi assinada a escritura, que, por sua vez, fica a 50 metros da Assembleia Legislativa do Rio.

Menos de dois anos depois, os imóveis foram vendidos por R$ 1,1 milhão, em valores declarados. Para o MP-RJ, a lavagem de dinheiro se concretizou por meio do lucro declarado à Receita Federal de R$ 813 mil --tornando "legais" os R$ 638,4 mil supostamente de origem ilícita.

Flávio manteve uma intensa atividade no meio imobiliário ao longo dos anos. Adquiriu uma cobertura e depois fez uma permuta em troca de outros dois imóveis, mais uma quantia em dinheiro.

Em 2015, ele também investiu numa loja de chocolates no shopping Via Parque. O MP-RJ suspeita que a empresa tenha sido usada para lavar R$ 1,6 milhão da "rachadinha".

O negócio foi encerrado no dia 31 de janeiro deste ano, dois dias depois da aquisição da mansão em Brasília.

Já no Senado, o filho do presidente não se afastou dos negócios privados paralelos. Como a Folha de S.Paulo revelou, ele se tornou sócio de uma empresa que tinha como objetivo instalar uma indústria de sabão em pó no estado.

No contrato social da Kryafs Participações, o senador não se apresenta como um mero sócio-investidor. O filho do presidente Jair Bolsonaro declara ser um representante comercial da fábrica baiana Espumil, serviço pelo qual estimou que receberia R$ 500 mil. A empresa seria uma parceira no empreendimento.

O projeto, contudo, não foi a frente. O sócio-diretor da Espumil, João Paulo Dantas, afirma que foi pressionado a permitir a inclusão do senador no negócio e decidiu interromper as tratativas com a Kryafs logo após sua criação. Agora ele diz manter a intenção de montar uma fábrica no Rio de Janeiro com outros parceiros.

A Kryafs teve suas atividades encerradas após a publicação da reportagem.

Nesta segunda-feira (1), o STJ retirou de pauta dois recursos de Flávio previstos para serem julgados nesta terça-feira (2).

Nos pedidos, a defesa do parlamentar busca invalidar relatórios do Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) compartilhados com o Ministério Público do Rio de Janeiro e decisões judiciais de primeira instância no inquérito das "rachadinhas".

Ficou também adiada a análise de um habeas corpus em favor do ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz.

A análise dos três recursos é feita pela Quinta Turma, colegiado composto por cinco ministros. O tribunal não divulgou o motivo da retirada de pauta. Na semana passada, o adiamento ocorreu a pedido do relator, ministro Felix Fischer.