Filipinas acusam Pequim de escalada militar no mar do Sul da China
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quarta-feira, 05 de maio de 2021
IGOR GIELOW
<p>SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O mar do Sul da China, um dos centros da alta tensão entre Pequim e Washington, agora é palco de uma escalada de acusações disparadas pelas Filipinas contra os chineses.
</p><p>O governo em Manila acusou Pequim de bloquear a operação de dois navios de patrulha de sua Guarda Costeira, em um renovado capítulo da tensão entre os dois países acerca do controle da região em torno do estratégico e disputado recife de Scarborough.
</p><p>"Nós condenamos nos mais duros termos as manobras conduzidas pela Guarda Costeira da China", disse na noite de terça (4) o conselheiro de segurança nacional filipino, Hermogenes Esperon.
</p><p>Ele se referia a ações ocorridas em 24 e 25 de abril perto do recife, chamado de Bajo de Mansiloc no país, e afirmou que haverá resposta ao que seu país vê como aumento da presença militar chinesa na região.
</p><p>Seus comentários vieram um dia depois de o chanceler do país, Teddy Locsin, postar no Twitter que a China deveria sair das águas filipinas -usando um palavrão ("Get the fuck out"). Ele se desculpou no dia seguinte pelos termos.
</p><p>É altamente inusual um diplomata usar baixo calão contra um poderoso vizinho, especialmente quando seu governo, liderado por Rodrigo Duterte, é considerado moderadamente pró-China.
</p><p>Pequim nega ter intenções militaristas na região, mas assevera sua posição de considerar 85% do mar do Sul da China águas territoriais a serem defendidas.
</p><p>Isso mostra o nível de tensão entre os países. Em abril, Manila havia acusado Pequim de enviar uma frota de 200 navios pesqueiros para águas próximas da região, o que seria um desafio à soberania filipina e um prenúncio de ocupação militar do conjunto de rochas e ilhotas.
</p><p>Scarborough é um foco de atrito entre os países há tempos. Em 2012, forças navais de ambas as nações quase se enfrentaram na região, e Manila foi ao tribunal marítimo das Nações Unidas para desafiar a afirmação chinesa de que o recife é seu -a ditadura comunista o chama de ilha de Huangyan.
</p><p>Em 2016, a ONU deu ganho de causa aos filipinos, dizendo que as rochas não constituem ilhas e, portanto, não há água territorial em torno dela. Pequim não aceita o veredicto, mas como os EUA disseram no mesmo ano que a militarização do local seria inaceitável, até aqui tem evitado dar tal passo.
</p><p>A região é considerada uma das mais ricas do mundo em peixes, foco da queixa das Filipinas: nesta semana, começou a temporada anual de veto à pesca imposta pelos chineses no norte do mar do sul da China.
</p><p>O governo do Vietnã também criticou a ação, que chamou de violação de sua soberania sobre o golfo de Tonkin.
</p><p>Pequim diz que a medida prevê resguardar a fauna marinha, mas como as águas são disputadas também por Vietnã, Malásia, Brunei e Taiwan, seus críticos enxergam uma projeção de soberania disputada.
</p><p>A razão é estratégica. O mar do Sul da China, além de ser rico em peixes e hidrocarbonetos, é uma das principais rotas de entrada e saída de comércio marítimo do país.
</p><p>Um bloqueio no canal de Bashi, rota no estreito de Luzon que divide China das Filipinas, ameaçaria o fluxo de petróleo para a segunda maior economia do mundo.
</p><p>Nos últimos anos, Pequim se aproximou bastante do regime autocrático de Duterte, mas a crescente tensão entre chineses e americanos no contexto da chamada Guerra Fria 2.0 parece estar empurrando os filipinos para o lado de Washington na disputa.
</p><p>Com o novo governo americano de Joe Biden buscando uma assertividade ainda maior ante o regime liderado por Xi Jinping, a pressão para os vizinhos do gigante asiático tomarem posição tende a crescer. A China acusa os EUA de desequilibrar o jogo usando valores como democracia como disfarce para interesses geopolíticos.
</p><p>Juntamente com o estreito de Taiwan, onde a atividade militar chinesa para intimidar o governo que considera rebelde em Taipé tem crescido muito, o mar do Sul da China é visto com um cipoal de fios desencapados.
</p><p>Os EUA e aliados têm conduzido mais operações navais na região do que em qualquer momento da história recente.
</p><p>Os americanos fizeram manobras de liberdade de navegação, passando por rotas internacionais que os chineses afirmam ser suas, com dois grupos de porta-aviões ao mesmo tempo neste ano.
</p><p>Os britânicos, na maior exibição de força naval desde a Guerra das Malvinas (1982), estão enviando para a região seu novo porta-aviões com uma pequena frota.
</p><p>E, nesta semana, Japão e Taiwan conduziram o primeiro exercício de vigilância conjunta de navios chineses no mar do Sul da China -onde Taipé tem algumas ilhotas, as quais vê como primeiro alvo no caso de um ataque de Pequim.
</p><p>A China, por sua vez, anunciou que vai despachar pela primeira vez seu novo porta-aviões, o Shandong, para exercícios no mar do Sul da China. Comissionado em 2019, o navio é o segundo do tipo do país e o primeiro a ser construído por lá, a partir de um projeto russo.
</p><p>A essa movimentação se soma a renovada hostilidade da Austrália ante a China. A imprensa da ilha divulgou nesta semana a fala atribuída a um importante general na qual ele diz a subordinados que uma guerra com os chineses é provável.
</p><p>O governo em Camberra também informou que irá revisar um acordo assinado em 2015 que cedeu por 99 anos a operação do porto de Darwin, no norte do país, a uma firma chinesa. O local é estratégico, voltado para toda a região de conflito potencial, e usado com frequência por unidades anfíbias dos Fuzileiros Navais americanos.
</p><p>O enfrentamento ocorre no âmbito do reforço dado a Biden ao Quad, o grupo de nações aliadas contrárias à China na região, que une americanos a australianos, japoneses e indianos -esses últimos foram às vias de fato numa escaramuça sangrenta com soldados de Pequim numa área disputada nos Himalaias em 2020.
</p><p>Analistas acreditam que um conflito dos EUA com a China nos próximos anos é improvável, mas o risco existe, em especial de alguma escalada ocorrer devido a algum entrevero em encruzilhadas como o mar do Sul da China.</p>

