PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) - A Justiça do Rio Grande do Sul condenou por racismo o ex-vereador Valter Nagelstein (PSD) pelo conteúdo de um áudio que viralizou em 2020. Na gravação, ele comentou a eleição da chamada Bancada Negra na Câmara de Porto Alegre.

Nagelstein afirmou que vai recorrer da decisão, que é de primeira instância.

Na mensagem enviada em um grupo, o político, que disputava a prefeitura da capital gaúcha naquele ano, fez uma análise do pleito e disse que a "ocupação que a esquerda promoveu nos últimos 40 anos da universidade, das escolas, do jornalismo e da cultura" produziu resultados.

"Basta a gente ver a composição da Câmara: cinco vereadores do PSOL, muitos deles jovens, negros, quer dizer, o eco àquele discurso que o PSOL foi incutindo na cabeça das pessoas. Pessoas... vereadores estes sem nenhuma tradição política, sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal", disse ele.

A decisão do juiz Sidinei Brzuska, da 3ª Vara Criminal de Porto Alegre, da última sexta-feira (4), determina condenação de dois anos de reclusão em regime aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade, prestação pecuniária de 20 salários mínimos, além de multa.

No documento de 30 páginas, o juiz diz que o crime de racismo "se demonstrou suficientemente comprovado, o que impõe a condenação".

"Partindo-se desse introito crítico e negativo, sua conduta se torna penalmente reprovável a partir do momento em que, ao externar sua opinião, disparou fala que agrediu a população negra, referindo-se àquela etnia de maneira depreciativa ao adjetivar os vereadores eleitos na Câmara como 'jovens, negros sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal'".

Bancada Negra da Câmara Municipal de Porto Alegre: Karen Santos (PSOL), Laura Sito (PT), Matheus Gomes (PSOL), Bruna Rodrigues (PCdoB) e Daiana Santos (PCdoB) Leonardo Contursi/CMPA Bancada Negra da Câmara Municipal de Porto Alegre: Por meio de nota, Nagelstein disse que irá recorrer da decisão e que tem orgulho de ser neto de uma mulher negra e de um judeu, que fugiu da guerra -ele afirma que um poema que escreveu sobre os avós, em 2009, foi citado no que chama de "absurdo processo".

"Recebo a sentença com profunda tristeza, porque mostra exatamente o que tenho denunciado, o Judiciário e a educação tomados por ideologia. Isto sim põe a democracia em risco, porque criminalizam a nossa forma de pensar e impõem aos nossos filhos o que é certo ou errado segundo a visão de militantes", afirmou no texto.

O ex-vereador é citado na decisão dizendo não achar que sua fala demonstra preconceito, que simplesmente deu sua opinião, ressaltando que os próprios vereadores eleitos se apresentavam como Bancada Negra.

Quatro vereadores foram considerados vítimas no caso: Laura Sito (PT), Bruna Rodrigues (PCdoB), Matheus Gomes (PSOL) e Karen Santos (PSOL).

"Essa é uma decisão extremamente importante para a luta racial no Brasil, um político é condenado por racismo, não por injúria racial. Trabalhamos a partir disso uma luta para que ele também fique inelegível", afirmou a vereadora Laura Sito.

Nas redes sociais, a vereadora Bruna Rodrigues escreveu que "essa é uma conquista do povo que luta, que acredita que o racismo precisa ser superado".

A vereadora Karen Santos disse que a novidade da decisão é reconhecer racismo dentro do espaço institucional. "Ter essa decisão nos ajuda a abrir a discussão de que é crime e que é passível de ser punido. Para nós, é um marco."

Para o vereador Matheus Gomes, que constituiu advogado assistente de acusação na ação, o caso comprova a importância da representatividade na política e o avanço da democratização.