<p>SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Ex-república soviética, a Estônia quer atrair startups criadas por brasileiros.

</p><p>O país báltico passa a permitir neste mês que todo o processo de obtenção de cidadania digital, por meio do programa E-Residency, seja feito a partir do Brasil.

</p><p>Isso será possível com a inauguração, em São Paulo, de um espaço para coleta de informações biométricas e retirada do cartão com chip que, ligado ao computador, dá acesso a serviços do governo estoniano. O anúncio do lançamento aconteceu nesta quarta-feira (5).

</p><p>Ao mesmo tempo que a Estônia tem um cenário medieval preservado, com torres e castelos por sua capital, Tallinn, a pequena nação, com aproximadamente 1,3 milhão de habitantes, é uma das mais desenvolvidas em govtech, termo que define governos que digitalizaram o serviço público.

</p><p>O país é conhecido por receber voto de cidadãos a partir da internet e por ter serviços públicos acessíveis online e com pouca burocracia. Como exemplo, em um único portal do governo, é possível encontrar links com informações sobre tópicos da vida diária, como "Fiquei doente", "vou ter um filho", "Vou mudar de casa", ou "Quero abrir uma empresa".

</p><p>Até agora, 725 brasileiros já se inscreveram para ter a cidadania digital estoniana, que, entre seus atrativos, permite registrar uma empresa no país. Para retirar o documento, precisaram viajar até uma embaixada estoniana ou para outro país com ponto de retirada do documento.

</p><p>O Brasil fica na 30ª posição entre os com mais participantes do programa. No total, são 80 mil cidadãos digitais, com pessoas de países próximos, como Finlândia, com aproximadamente(5.900), Rússia (5.500) e Ucrânia (4.000) no topo da lista.

</p><p>Os brasileiros que têm a cidadania digital abriram até agora 122 empresas, segundo Lauri Haav, diretor do programa.

</p><p>Haav diz que, ao ano, os cidadãos digitais criam um quinto das novas empresas estonianas, o que torna a economia de seu país mais diversificada.

</p><p>Raphael Fassoni, sócio da Estonia Hub, empresa que realiza viagens de brasileiros à Estônia para conhecer o mercado, diz que, entre os atrativos para iniciar startups no país europeu, além da desburocratização, estão o modelo de tributação de empresas, a oportunidade de participar de programas de apoio à inovação e a possibilidade de chegar a clientes e investidores no continente.

</p><p>Em relação aos impostos, a atratividade para startups existe porque a tributação, de 20%, acontece na distribuição de lucros aos sócios, não sobre os ganhos da empresa.

</p><p>Para companhias iniciantes, o modelo é favorável porque, com frequência, elas têm prejuízo ou fazem reinvestimentos altos em seus primeiros anos, até conquistar fatia relevante do mercado. "O governo entende que não pode matar a empresa no ninho", diz Fassoni.

</p><p>Karen Roosileht, 33, iniciou sua relação com a Estônia em 2010, quando entrou para um mestrado na Universidade de Tartu. A brasileira diz que, antes de se mudar para o país, já se identificava com a cultura do norte da Europa, em que as pessoas são mais reservadas. O avanço tecnológico foi um dos fatores decisivos para ela se decidir pelo país.

</p><p>"Enquanto na Suécia a universidade tinha um telefone com resposta automática, na Estônia havia link no site para conversar com alguém por Skype." A empresa foi criada na Estônia.

</p><p>Cinco anos depois, ela decidiu ficar e abrir na Estônia sua empresa, a Tutor.id, plataforma para professores encontrarem alunos e gerenciarem suas aulas.

</p><p>A maior parte dos clientes e dos 11 funcionários da empresa está no Brasil. Mesmo assim, Roosileht diz que o apoio dado pelo governo estoniano, que pode vir por meio de troca de ideias, sugestões de contatos ou financiamento de viagens para representar o país e apresentar sua startup internacionalmente, faz viver lá valer a pena. "É um país pequeno, em que as coisas acontecem rápido e são mais informais."

</p><p>Por outro lado, ela diz haver um desafio maior para conseguir investidores na Europa, na comparação com Estados Unidos e Brasil. "Ainda é um ecossistema mais conservador, em que esperam você mostrar algum lucro antes de investir."

</p><p>Mesmo com o desafio, a Tutor.Id levantou R$ 4 milhões com investidores da Dinamarca, dos Estados Unidos, da Colômbia e da própria Estônia, afirma.

</p><p>A empresária ressalva que o clima do país, frio e com pouco sol durante metade do ano, pode ser um desafio para outros brasileiros.

</p><p>Edilson Osório, 42, sócio da OriginalMy, conta ter levado sua empresa, de infraestrutura para assinatura digital, para a Estônia em 2018.

</p><p>A decisão foi tomada após ele concluir que o ambiente regulatório para negócios baseados em blockchain (infraestrutura para registro de informações usada no bitcoin) era pouco amigável no Brasil.

</p><p>O empresário conta que, para tomar a decisão sobre o destino da sua empresa, analisou aspectos tributários, regulatórios e o custo de vida de dezenas de países e concluiu que Estônia seria o mais adequado.

</p><p>Além disso, o avanço do país em relação a governo digital poderia oferecer aprendizados úteis à empresa, afirma. "Dá uma credibilidade enorme dizer que você tem uma startup de cibersegurança e governo digital na Estônia."

</p><p>Após formalizar a empresa no país báltico, Osório ainda tentou seguir trabalhando do Brasil. Logo percebeu que se mudar para a Europa ficaria mais barato do que fazer visitas eventuais ao continente em busca de clientes. Permaneceu em Tallinn.

</p><p>Apesar de estar sozinho no início, diz que se relacionou com empresários de países como Marrocos, Alemanha, Índia e China.

</p><p>Em dezembro, a mulher de Osório, Miriam Oshiro, sócia na empresa, também se mudou para a Estônia. A empresa tem seis pessoas e só os dois trabalham de lá.</p>