NOVA YORK, EUA (FOLHAPRESS) - A TI (Transparência Internacional Brasil) entregou nesta quarta-feira (9) ao grupo antissuborno da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) um relatório com denúncias de retrocessos na luta contra a corrupção no Brasil.

No documento, a TI aponta o que vê como compra de apoio político com orçamento secreto, omissão do Procurador-Geral da República, Augusto Aras, e aparelhamento dos órgãos de controle.

O combate à corrupção, ao lado da política ambiental, são os dois maiores obstáculos para o acesso do Brasil à OCDE, um dos objetivos do presidente Jair Bolsonaro (PL). O Brasil foi aceito oficialmente em janeiro deste ano para iniciar o processo de acessão à entidade.

A TI, que tem subsidiado as discussões do grupo antissuborno, pede no relatório, obtido pela reportagem, que o secretário-geral da OCDE leve em consideração a deterioração do arcabouço legal e institucional do Brasil ao avaliar a aptidão do país para aderir à entidade, "para que uma eventual acessão não signifique um endosso a práticas incompatíveis com as diretrizes" do órgão.

Ao longo do processo de acessão, que leva em média quatro anos, o Brasil precisa aderir a uma série de instrumentos, e os 38 países que integram a OCDE avaliarão o cumprimento deles.

No início de 2021, a OCDE, pela primeira vez, criou uma força tarefa especialmente dedicada ao monitoramento da corrupção no Brasil. A entidade citou preocupação com o fim "surpreendente" da Lava Jato, o uso da lei contra abuso de autoridade e as dificuldades no compartilhamento de informações de órgãos financeiros para investigações.

No relatório enviado ao grupo antissuborno, que está reunido em Paris nesta semana para avaliar países, a TI afirma que Bolsonaro "neutralizou os dois principais pilares políticos e legais do sistema de freios e contrapesos que limitam o poder e garantem responsabilização da Presidência da República. Essa arquitetura de impunidade se expande através da interferência sobre órgãos de controle".

Segundo Bruno Brandão, diretor-executivo da Transparência Internacional Brasil, é fundamental que o grupo antissuborno considere o descumprimento da convenção da OCDE contra corrupção pelo Brasil. "Queremos que o processo de acessão à OCDE seja uma oportunidade de reverter os retrocessos do Brasil no combate à corrupção", diz Brandão.

Em novembro do ano passado, Drago Kos, chefe do grupo antissuborno da OCDE, afirmou estar "preocupado" com o Brasil.

"Se você me perguntasse há três ou quatro anos sobre o combate à corrupção no Brasil, eu teria uma resposta muito simples: o Brasil é um dos melhores, provou que pode ir do zero na luta contra corrupção para 100% e isso podia ser dito sobre todas as instituições do país. Agora, há apenas alguns indivíduos e uma ou duas instituições engajadas no combate à corrupção", disse ele durante painel da Fundação FHC.

"O Brasil era um caso típico de um país altamente corrupto, que explodiu, no sentido positivo, provando, com a Lava Jato, que estaria disposto a lidar até com os casos mais difíceis de corrupção."

O relatório da TI cita também a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de que a Justiça Eleitoral deve julgar crimes comuns (como corrupção e lavagem de dinheiro) que tenham conexão com crimes eleitorais.

"[A decisão] traz um impacto sistêmico para a capacidade do Brasil de investigar e julgar grandes esquemas de corrupção, já que muitos deles são ligados a financiamento ilegal de campanhas e, agora, ficam sob a competência da Justiça Eleitoral, que é menos especializada e tem menos recursos", diz o relatório.

O texto enviado à OCDE afirma que Aras "provou sua docilidade" com a classe política, e o presidente da Câmara, Arthur Lira, acumulou um "poder extraordinário" ao centralizar o controle do orçamento secreto.

"…Há a preocupação de que o convite [para iniciar o processo de acesso à OCDE] se dá em um momento de contínuo desmantelamento das estruturas que, durante anos, eram usadas para combater a corrupção, promover direitos humanos, preservar o meio ambiente e, em última instância, proteger a democracia no país."