RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Responsável pela operação da subestação que liga o sistema energético brasileiro a Macapá, a LMTE (Linhas de Macapá Transmissora de Energia) apresentou recurso contra multa de R$ 3,6 milhões aplicada pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e questiona ter sido a única punida pelo episódio.

A empresa alega que as conclusões da Aneel sobre falhas de manutenção são precipitadas e tomadas antes do fim do resultado das perícias e que não foram investigadas as responsabilidades de outros agentes do setor elétrico responsáveis pelo planejamento da segurança energética do Amapá.

O apagão ocorreu após explosão na subestação Macapá, operada pela empresa, no início de outubro de 2020. Sem outra ligação com o resto do país e com pouca capacidade de geração local, o estado conviveu por 21 dias com racionamento de energia.

Em fevereiro, a Aneel anunciou a aplicação da multa, em termos percentuais, alegando que a crise foi provocada por falhas de manutenção nas instalações da LMTE. Foi a maior multa da história da agência, em termos de percentual sobre o faturamento de um agente do setor.

A fiscalização da Aneel diz ter encontrado 21 não conformidades na instalação, entre elas a indisponibilidade de um dos três transformadores da subestação, que estava parado desde dezembro de 2019, e poderia ter sido usado após a explosão, que danificou os outros dois equipamentos.

As falhas, diz a agência, "contribuíram para a indisponibilidade total da transformação da SE [subestação] Macapá no dia 3 de novembro de 2020, trazendo como consequência a origem do colapso no fornecimento de energia ao estado do Amapá".

O recurso da LMTE foi protocolado em 22 de fevereiro. Em entrevista à Folha nesta segunda (8), advogados da companhia disseram que a punição foi desproporcional e fere o contrato de concessão das instalações de transmissão de energia no país.

"O papel de uma transmissora é ligar um ponto A com um ponto B, não é entregar e garantir o suprimento ao consumidor final. Isso é papel de outros agentes setoriais, do próprio planejador, do ministério, da própria Aneel ao leiloar os projetos...", disse o advogado Tiago Lobão Consenza, que representa a empresa.

O argumento repete avaliações feitas ao jornal Folha de S.Paulo na época do apagão por especialistas do setor elétrico, para quem faltou ação dos órgãos planejadores e fiscalizadores diante da demora na recuperação do terceiro gerador.

A LMTE alega ainda que o Amapá não tinha outras fontes para garantir o suprimento em caso de acidentes, o que é conhecido no setor como redundância, desde que a térmica que operava no estado foi desligada em 2020.

O próprio projeto de construção do sistema de transmissão para o estado previa a redundância, continua a empresa. "Em outras regiões há sistemas de redundância e backup que garantem a energia", diz a advogada Valéria de Souza Rosa.

A empresa defende ainda que não é possível ainda comprovar falhas de manutenção nos equipamentos porque as perícias não foram concluídas. E, se as falhas forem comprovadas, o contrato prevê multas específicas, mas não punições pelo longo período em que o estado teve problemas.

"A concessionária refuta veementemente que sua manutenção seja falha, e afirma que as causas da interrupção de energia que afetou o estado do Amapá, em novembro de 2019, não possuem relação com os apontamentos de fiscalização da Aneel", diz a LMTE.

Após o apagão, as autoridades do setor elétrico confirmaram problemas de comunicação de falta de equipamentos e sugeriram a construção de uma nova subestação no estado, para evitar a repetição do problema.

Relatório do ONS divulgado no fim de 2020 aponta também falhas de outros agentes envolvidos no fornecimento de energia ao Amapá, como a distribuidora estadual CEA e usinas hidrelétricas instaladas no estado. Para reduzir o risco de novas ocorrências, o operador pede estudos para a construção de uma nova subestação no estado.

Além dos transtornos causados à população, que teve dificuldades até para comprar água, o apagão provocou o adiamento do primeiro turno das eleições em Macapá.

A LMTE foi concedida à espanhola Isolux, que pediu recuperação judicial em 2016. No início de 2020, o ativo foi transferido para a Gemini Energy. Em nota, a empresa defende que "fez tudo o que estava ao seu alcance para mitigar e acelerar a recuperação das instalações sob sua responsabilidade". ​

O recurso será agora apreciado pela área técnica da Aneel, antes de ser julgado pela diretoria da agência reguladora. Enquanto isso, a multa fica suspensa.