SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O dólar subiu 1,88%, a R$ 5,6670, nesta quinta-feira (21), a maior cotação desde 14 de abril, após ter alcançado a máxima de R$ 5,6910 às 15h19, uma alta de 2,31% em relação ao fechamento da véspera. A Bolsa de Valores brasileira, que chegou a cair 4,57%, à mínima de 105.713 pontos, fechou em queda de 2,75%, a 107.735 pontos. É a menor pontuação desde 23 de novembro.

Os mercados refletiram os temores sobre o risco fiscal após o próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, nesta quarta-feira (20), falar em licença para gastar fora do teto, regra que limita o crescimento das despesas públicas.

A medida é vista pelo governo como uma forma de viabilizar o valor de R$ 400 do novo Bolsa Família, o Auxílio Brasil. O ministro afirmou ainda que o governo quer ser popular, não populista, e que a decisão de furar o teto é política.

Em meio à turbulência gerada pelas declarações do ministro, os juros futuros aumentaram os prêmios, com o DI para janeiro de 2025 em alta de quase 60 pontos-base, a 11,48% ao ano.

A percepção do mercado sobre o risco de inadimplência do país, medido pela valorização dos contratos de CDS (Credit Default Swap) com prazo de vencimento de cinco anos, avançou 6,05%, a 226,20 pontos, o patamar mais alto desde março.

Investidores já estavam preocupados com a saúde das contas públicas brasileiras desde que o governo sinalizou a intenção de romper o teto para garantir para ampliar o Bolsa Família. Alguns analistas já projetavam que o dólar passaria a testar a barreira dos R$ 6 diante desse cenário.

O valor de R$ 400, acima dos R$ 300 estimados anteriormente, é uma exigência do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), preocupado com a popularidade às vésperas da campanha eleitoral. A adesão do próprio Guedes à proposta de furar o teto de gastos, no entanto, piorou o cenário na avaliação dos investidores.

O ministro afirmou que a discussão sobre o Auxílio Brasil envolve duas possibilidades no momento: revisar os índices de correção que impactam o teto de gastos ou pedir uma licença para fazer um gasto temporário até o fim de 2022.

Na terça-feira (19), quando a determinação do presidente para o aumento de gastos veio à tona, o Ibovespa, índice de referência da Bolsa, caiu 3,28%, a 110.672 pontos, chegando a recuar 3,91% durante a tarde, quando atingiu a mínima de 109.947 pontos.

Para analistas, Guedes jogou a toalha ao abrir espaço para a ala política do governo decidir sobre o aumento de gastos, deixando de ser a última barreira para a implosão do alicerce fiscal do país.

A disparada do dólar e dos juros futuros, além do aumento do risco-país, são as consequências imediatas da percepção do mercado sobre o desequilíbrio das contas públicas, levando o país a um conhecido ciclo que combina inflação e baixo crescimento, segundo Rodrigo Marcatti, especialista da Veedha Investimento.

"Os juros futuros estão explodindo a patamares inimagináveis há dois meses", diz Marcatti. "A situação de perda do alicerce fiscal pode gerar mais inflação, que gera mais alta nos juros, e a gente entra naquele ciclo conhecido de Brasil", afirma.

O aumento dos gastos do governo obrigará o Banco Central a continuar acelerando a alta da taxa básica de juros (Selic) até as eleições em outubro de 2022, avalia Paulo Duarte, economista-chefe da Valor Investimentos. "Até pela queda da popularidade do presidente Jair Bolsonaro, a tendência é isso se intensificar com a aproximação das eleições", diz.

Em um dia de baixa generalizada das moedas de países em desenvolvimento devido ao temor de agravamento da crise imobiliária na China, os problemas domésticos contribuíram para que o real tivesse o terceiro pior desempenho em uma cesta de 24 divisas de economias emergentes. Apenas a lira turca e o rand sul-africano apresentaram taxas de retorno à vista frente ao dólar inferiores à do real.

Pela manhã, ativos brasileiros cotados no exterior também registraram queda devido à fala de Guedes na véspera.

Contratos de real transacionados na CME (Bolsa Mercantil de Chicago) caíam 1,4%, com US$ 1 valendo R$ 5,63. Em Paris, um ETF (Exchange Traded Fund, também conhecido como índice de fundo) que acompanha o Ibovespa, principal indicado da Bolsa brasileira, perdia 3,4%, maior queda desde o início de setembro e indo em direção ao menor patamar desde março passado.

Apesar do dia desfavorável no exterior para os mercados emergentes, nos Estados Unidos, porém, os índices se recuperarm no final pregão. O Dow Jones caiu 0,02%, enquanto S&P e Nasdaq subiram 0,30% e 0,62%, respectivamente.

O S&P 500 registrou máxima recorde para fechamento e sua sétima sessão consecutiva de ganhos, enquanto o Nasdaq foi impulsionado por ações de gigantes como Tesla e Microsoft, embora uma queda da IBM tenha prejudicado o Dow Jones.

O petróleo Brent, referência mundial, caiu 1,19%, a US$ 84,80 (R$ 478,41). A desvalorização da commodity contribuiu para que as ações preferenciais da Petrobras, que lideraram a lista dos papéis mais negociados, caíssem 3,38%.

Também entre as empresas mais negociadas do dia, Vale, Itaú e Bradesco recuaram 1,64%, 1,69% e 1,67%, respectivamente.

Em um cenário geral de quedas, Getnet (-19,76%) e Americanas (-10,76%) tiveram as maiores baixas do pregão. Suzano (1,65%) e BB Seguridade (0,80%) foram as únicas que subiram.