Declaração de Florestas, assinada pelo Brasil, sinaliza apoio a comércio agrícola livre de desmatamento
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terça-feira, 02 de novembro de 2021
ANA CAROLINA AMARAL*
GLASGOW, ESCÓCIA (FOLHAPRESS) - A Declaração de Florestas, anunciada nesta terça-feira (2) pela presidência britânica da COP26, reúne pelo menos 124 países signatários. Entre eles, por um lado, estão os detentores da maior parte das florestas do mundo, incluindo o Brasil.
Do outro, as nações mais ricas, que prometem destinar conjuntamente US$ 12 bilhões de fundos públicos, até 2025, para financiar a proteção florestal. O setor privado também se juntou ao anúncio, prometendo mais US$ 7,2 bilhões.
Embora os dois fundos tenham sido anunciados juntamente à declaração, eles não constam no documento, mas formam o Compromisso Global de Financiamento de Florestas. Já a Declaração de Florestas reúne seis princípios; cinco deles citam a agricultura sustentável e o uso sustentável da terra.
Com apenas uma página, a declaração também se compromete com "o fortalecimento de esforços compartilhados" para a conservação das florestas e a resiliência das comunidades indígenas e rurais, além da facilitação de fluxos de financiamento.
No alto escalão do Ministério da Agricultura, o segundo princípio da declaração foi recebido com preocupação, por citar o comércio de commodities desvinculadas de desmatamento.
Sem dar detalhes, o item endossa a "facilitação do comércio e das políticas de desenvolvimento, internacional e domesticamente, que promovam o desenvolvimento sustentável e a produção e consumo de commodities sustentáveis, que trabalhem para o benefício mútuo dos países e que não conduzam ao desmatamento e à degradação da terra".
O receio por parte do governo é que a defesa de critérios sustentáveis --agora com o endosso dos detentores de florestas --seja levada à Organização Mundial do Comércio.
"É um texto de princípios, um documento político. É uma base para futuras negociações", afirma Suely Araújo, especialista em políticas públicas do Observatório do Clima.
"Nós teríamos que saber de que forma esse dinheiro vai entrar e sob quais condições", completa.
"[O texto da declaração] é amplo para que possa acolher os planos dos países e para que os arranjos nacionais dialoguem com essa ambição internacional. É um passo que sinaliza com dinheiro. Agora, precisa vincular recursos com resultados", afirmou a ex-ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.
O anúncio de US$ 12 bilhões de fundos públicos reúne doze doadores: Reino Unido, Noruega, Coreia do Sul, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Japão, França, Estados Unidos, União Europeia e Alemanha. Segundo a presidência da COP26, o valor deve ser destinado até 2025 para países elegíveis conforme definição do ODA (Official Development Assistance), da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) --o que inclui países em desenvolvimento como o Brasil.
Já os US$ 7,2 bilhões prometidos pelo setor privado incluem doadores de diversas iniciativas ligadas a corporações. Entre elas, a Coalizão Leaf, voltada à compensação de emissões através da conservação florestal, indicou o aporte de US$ 500 milhões.
Já a iniciativa IFACC (Innovative Finance for the Amazon, Cerrado and Chaco) sinalizou o aporte de US$ 3 bilhões, voltados a desvincular o desmatamento da produção de soja e gado na América Latina.
Para a WWF-Brasil, o acordo é um recado do mercado internacional. "Em apenas dois dias, a COP26 já deixou claro que os mercados internacionais não abrirão espaço para quem tem as mãos sujas de carbono", afirmou a ONG em nota.
O posicionamento do Observatório do Clima lembrou que o anúncio é o segundo do tipo nos últimos sete anos.
"Em 2014, em Nova York, dezenas de países assinaram uma declaração prometendo eliminar o desmatamento até 2020. O Brasil jamais subscreveu o texto. O documento de Glasgow, que deve ser um dos principais resultados da COP26, estica o prazo e conta com a adesão de todos os grandes países tropicais", afirma a organização.
*A jornalista Ana Carolina Amaral viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade.