BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O anúncio da aplicação da segunda dose e a dose de reforço da vacina da Janssen para a Covid-19 feito pelo Ministério da Saúde nesta terça-feira (16) pegou gestores de saúde, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e até o laboratório produtor da vacina de surpresa.

Segundo anúncio da pasta, o imunizante, que vinha sendo usado em dose única, agora passará para o regime de duas aplicações, como já acontece com as injeções da Pfizer, AstraZeneca e Coronavac.

A segunda dose deve ser aplicada dois meses após a primeira na população adulta. Já a dose de reforço deve ser usada após cinco meses do esquema primário completo. A recomendação é que seja com imunizante diferente, preferencialmente da Pfizer.

Apesar de ainda não existir um pedido formal à Anvisa do laboratório sobre aplicar a segunda dose e a dose de reforço, o Ministério da Saúde pode fazer esse tipo de definição.

Isso porque a legislação deixa margem para o ministro "determinar a realização de ações previstas nas competências" da Anvisa, como decidir sobre a aplicação das vacinas.

Mas o ministro só pode tomar este tipo de iniciativa em casos "que impliquem risco à saúde da população" ou em cenários de inação da Anvisa, ainda de acordo com as regras vigentes.

Na leitura de técnicos da agência, o ministério deveria formalizar que agiu no lugar do órgão regulador, em publicação no Diário Oficial da União, por exemplo, além de explicar as razões para essa iniciativa.

Técnicos da Anvisa também foram pegos de surpresa pela decisão de estender a dose de reforço para todos os adultos. Antes a aplicação estava restrita a pessoas com mais de 60 anos ou de grupos de risco.

Os membros da agência haviam se manifestado nas primeiras discussões sobre a dose de reforço. Eles estranharam que não foram chamados agora.

Apesar do mal-estar, a Anvisa não quer entrar em conflito com o ministério. O temor é de que os questionamentos alimentem discursos antivacina.

Ainda não há estratégia fechada entre os membros da agência, mas a ideia preliminar é cobrar do ministério os dados que embasaram a decisão sobre a Janssen, além daqueles sobre a ampliar o grupo apto a receber dose de reforço.

Um ponto que preocupa a Anvisa é sobre como organizar o monitoramento das reações adversas das vacinas. Na leitura da agência, este é um dos temas que deveria ter sido previamente debatido com o ministério.

Os anúncios desta terça também pegaram de surpresa parte da equipe do ministro Marcelo Queiroga. As decisões sobre a Covid-19 têm sido tomadas em grupos restritos e o PNI (Programa Nacional de Imunizações) está sem comando desde o fim de junho.

O argumento de auxiliares de Queiroga é de que tanto a mudança sobre a aplicação da dose da Janssen e a ampliação do público da vacina de reforço seguem experiências internacionais.

Em nota, porém, a Anvisa disse que iniciativas deste tipo foram previamente discutidas com as agências reguladoras em diversos países.

"Antes de incorporar a dose de reforço das vacinas, países como Estados Unidos, Canadá, Indonésia, Grã-Bretanha, Israel, membros da Comunidade Europeia e outros submeteram a estratégia à avaliação prévia das suas autoridades reguladoras. Primariamente, a terceira ou dose de reforço foi indicada para pessoas com sistema imunológico enfraquecido, idosos e profissionais de saúde", disse a agência brasileira.

No mesmo texto, a Anvisa afirma que é importante diferenciar o esquema vacinal previsto em bula e estratégia de vacinação e reforço.

O esquema previsto em bula e aprovado pela Anvisa, quantidade de doses e intervalos, indica a forma de uso da vacina que, segundo os estudos, produzem os melhores resultados de imunização.

Já a estratégia de vacinação e reforço é uma decisão da autoridade de saúde sobre como determinado imunizante será aplicado na população de forma a se obter a melhor cobertura vacinal, e as estratégias de monitoramento das reações adversas.

A agência reguladora disse ainda que a decisão sobre dose de reforço deve considerar o cenário epidemiológico, os estudos de efetividades, a circulação das cepas variantes e a segurança das vacinas, bem como uma efetiva estratégia de monitoramento das reações adversas e captação de sinais de interesse para a farmacovigilância.

Segundo a Anvisa, a previsão é que até a próxima semana a Janssen entregue os estudos para Anvisa sobre a eficácia e segurança da dose reforço da sua vacina.

Segundo o Ministério da Saúde, a orientação segue tendência mundial. No entanto, a decisão da agência reguladora americana considerou a segunda dose como reforço. Todos os adultos que receberam a Janssen, de dose única, há mais de dois meses são elegíveis para o reforço.

"Quem tomou a Janssen completará o esquema vacinal. Embora seja de dose única, compete a nós [Ministério da Saúde] as definições. A pessoa tomará duas doses, em um intervalo de dois meses", disse a Secretária Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19, Rosana Leite de Melo.

O anúncio foi feito em entrevista coletiva do Ministério da Saúde nesta terça, quando a pasta informou que a dose de reforço contra Covid estava liberada para toda a população adulta do país.

Após o questionamento de quando as pessoas poderão procurar os postos de saúde, Melo disse que o Ministério da Saúde deve liberar as vacinas a partir de sexta (19) para estados e municípios.

"Nós distribuímos ordinariamente duas pautas [por semana]. Essa da Janssen é a partir de sexta-feira se forem todas liberadas. Elas chegaram ontem e vão ser distribuídas com todas as informações", disse.

A Janssen, braço farmacêutico da Johnson & Johnson, declarou que uma segunda dose de sua vacina contra Covid-19, aplicada cerca de dois meses depois da primeira, aumentou a eficácia para 94% nos Estados Unidos contra formas moderadas ou graves da doença.

A proteção com uma dose única da vacina, que é usada em diversos países, inclusive no Brasil, é de 70%.

A farmacêutica acrescentou que a segunda dose aumentou os níveis de anticorpos de quatro a seis vezes. Quando dada seis meses depois da primeira, os níveis de anticorpos aumentaram 12 vezes.