SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O conservador Yoon Suk-yeol será o próximo presidente da Coreia do Sul, mostra a apuração da acirrada eleição presidencial desta quarta-feira (9) no país. Ele assumirá por cinco anos o governo no lugar do presidente Moon Jae-in, que não pode concorrer à reeleição pelas leis do país.

As pesquisas de boca de urna após o encerramento da votação apontavam vantagem de apenas 0,6 ponto percentual de Yoon a frente do segundo colocado, Lee Jae-myung, do mesmo partido do atual presidente. Não há segundo turno. Antes do fim da apuração, Lee reconheceu a derrota e parabenizou o vencedor.

Yoon Suk-yeol, 61, procurador que ficou famoso por atuar nos casos que levaram à prisão da ex-presidente Park Geun-hye por abuso de poder, chegou a atuar como procurador-geral no governo Moon Jae-in, antes de romper com o presidente e se candidatar pelo Partido do Poder Popular.

Ele vence a eleição no pior momento da pandemia da Covid-19 no país, quando a Coreia registra média de quase 250 mil novas infecções e 170 mortes por dia, em uma onda devastadora da variante ômicron. Para se ter uma ideia, desde o começo da pandemia até o final do ano passado, o país não havia registrado nenhum dia com média diária de mais de 7 mil casos.

O novo presidente assumirá com uma série de desafios, com a pandemia como o mais imediato deles.

Moon Jae-in, o atual presidente, conseguiu conter de forma satisfatória a pandemia e esperava receber crédito por isso, mas sofreu um forte golpe com a explosão recente de casos, diz Yong-Chool Ha, professor de relações internacionais da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, o que ajuda a explicar a expressiva votação do candidato da oposição.

Além da crise sanitária, Yoon terá que lidar com o aumento do endividamento doméstico e com uma grave crise imobiliária, que atinge sobretudo os mais jovens, com cada vez mais dificuldades para comprar ou mesmo alugar imóveis. Metade dos 52 milhões de habitantes do país vive na capital, Seul, ou na região metropolitana, o que já torna caro viver na região, e os preços vêm subindo aceleradamente.

O governo afirma que o valor dos imóveis subiu 17% em média desde o começo da gestão Moon, mas pesquisas independentes apontam que esse aumento, na verdade, é de algo entre 75% e 93%. Yoon, candidato vencedor, prometeu construir 2,5 milhões de habitações nos próximos cinco anos no país.

Segundo Thiago Mattos, mestre em relações internacionais pela Uerj, especialista em Coreia do Sul que vive no país há quatro anos, o presidente eleito também precisará equilibrar as relações com os vizinhos.

Ao longo de seu governo, o presidente Moon Jae-in teve políticas consideradas mais hostis em relação ao Japão, afirma ele, que tiveram dois resultados: de um lado, reavivaram um sentimento nacionalista, que ainda carrega traumas do período em que a Coreia foi colônia do Japão; de outro, gerou danos econômicos e frustrou parcela da população, diz o pesquisador.

É sensível também a relação com a China. Moon, em seu governo, manteve boas relações com Pequim, o que também provoca certa resistência em parcela conservadora da população. Acima de tudo, o ponto mais sensível da política externa é a Coreia do Norte. Moon capitalizou o sentimento pró-unificação e ganhou popularidade ao mediar contatos entre Trump e Kim Jong-un, mas também viu sua aprovação cair à medida que os vizinhos do norte se afastavam cada vez mais e que o ditador retomava testes militares.

Yoon promete retomar o diálogo com a Coreia do Norte e se mostrou aberto a dar benefícios a Pyongyang se isso significar um caminho para a desnuclearização da parte norte da península, mas já defendeu que ataques preventivos podem ser uma maneira eficaz de conter o país se houver informações de que há um ataque iminente. Durante a campanha, afirmou que o melhor caminho para resolver o problema é estabelecer um diálogo triplo entre Coreia do Sul, Coreia do Norte e Estados Unidos.

Yoon já afirmou que quer comprar mais sistemas de mísseis antibalísticos dos Estados Unidos --mesmo com o risco de retaliação econômica da China, que afirma que o radar do sistema pode alcançar o território chinês. Também quer ampliar a aliança com o Japão e entrar no chamado Quad, que envolve Estados Unidos, Austrália, Japão e Índia, o que deve afastá-lo ainda mais da China.

Ainda na política externa, a guerra em curso na Ucrânia foi tema na campanha, ainda que tenha impacto menor nos resultados, diz Ha. "Os eleitores veem semelhanças estruturais por também se sentirem oprimidos por grandes potências, e desejam tirar lições sobre o que acontece na Ucrânia", afirma o pesquisador. "O público em geral expressa simpatia pelo povo ucraniano, talvez por se ver em situação semelhante [com o temor de ser invadida por vizinhos com arsenais nucleares]".

Por fim, os analistas citam ainda como desafio a crescente polarização na pauta comportamental no país. "Hoje em dia, existe uma parcela grande de homens adultos e jovens que têm crescentemente se oposto a pautas progressistas, especialmente a feminista", afirma Mattos.

Segundo Ha, nesta eleição se buscava "um líder que tenha integridade e senso de justiça e justiça", segundo ele, "porque muita gente na Coreia acredita que o atual regime progressista, ao contrário do que alega, não tem sido consistente no cumprimento do princípio de justiça e equidade." Esse sentimento é particularmente forte entre as pessoas da chamada geração MZ, de 20 a 30 anos. "Sentem-se traídos pelo atual governo, que chegou ao poder após o impeachment de um presidente conservador."

O presidente eleito prometeu na campanha abolir o Ministério da Igualdade de Gênero e da Família, e chegou a afirmar que o feminismo era o maior responsável pela baixa taxa de natalidade do país.

A eleição foi marcada por denúncias e episódios de violência. Na segunda-feira (7), o líder do Partido Democrático, o mesmo do presidente Moon Jae-in, foi atacado a machadadas e hospitalizado. Song Young-gil, que também foi coordenador da campanha do segundo candidato mais votado, foi atacado em Seul por um homem de 70 anos. O agressor foi preso, e Song passa bem.

O ataque ocorreu depois de denúncias envolvendo a votação antecipada, liberada na sexta e no sábado para o público geral, e no fim da tarde de sábado para eleitores com Covid, que poderiam sair de casa às 17h e deveriam chegar aos locais de votação às 18h. Como mais de 1 milhão de pessoas fazem tratamento para a doença, segundo autoridades do país, a concentração de eleitores no mesmo horário provocou enormes filas, de pessoas doentes no frio de temperaturas próximas a 0°C.

Além disso, os eleitores também denunciaram terem recebido cédulas já preenchidas. Mesmo com esses problemas, a antecipação atraiu 37% do eleitorado. Nesta quarta, os eleitores com Covid também puderam deixar suas casas para votar das 18h às 19h30. O restante dos eleitores pôde votar das 6h às 18h.